Nas reuniões políticas que vem fazendo em busca de reforço para a disputa de 2022, o ex-presidente Luiz Inácio da Silva tem destacado duas prioridades em seu projeto de voltar ao Palácio do Planalto: conquistar uma bancada ampla de senadores e dar atenção especial aos eleitorados de Minas Gerais e do Rio de Janeiro, não necessariamente elegendo governadores do PT.
O entendimento exposto por Lula aos interlocutores é o de que presidentes não precisam de governadores, ao contrário, pois a dependência de verbas federais assegura harmonia política. Em relação aos senadores é diferente: os presidentes precisam, e muito, de uma base sólida no Senado. Para quase tudo de importante na República.
Passam pelo crivo desses parlamentares as indicações ao Supremo Tribunal Federal, a agências reguladoras, ao Ministério Público, a embaixadas, entre outras funções da alta administração federal. É atribuição dos senadores autorizar operações financeiras externas de interesse de todos os entes federativos. Também é deles a prerrogativa de julgar processos de crimes de responsabilidade envolvendo o presidente, o vice, ministros do Supremo, comandantes das Forças Armadas, o procurador-geral e integrantes dos conselhos nacionais de Justiça e do MP.
Em tese, e na hipótese de raciocinar com juízo, Jair Bolsonaro seria o primeiro a concordar, dadas as dificuldades que enfrenta num Senado que, além de uma CPI de efeitos explosivos para o Planalto ainda não totalmente medidos, tem barrado iniciativas de interesse do governo oriundas da Câmara. Sem contar o fato de a Casa ser presidida por um potencial adversário na disputa de 2022, cujo ativo é o exercício do cargo.
Na próxima eleição, estará em jogo um terço das vagas do Senado. Uma disputa peculiar, pois majoritária e sem chance de segundo turno, como ocorre com o presidente e os governadores. É um “mata-mata” que, na avaliação do líder da oposição na Câmara, deputado Alessandro Molon (PSB-RJ), terá caráter plebiscitário de rejeição ou aprovação do governo Bolsonaro.
“Para Lula, é mais útil eleger senadores que se empenhar na conquista de muitos governadores”
Nos dois estados em que o PT pretende fazer o investimento mais pesado, a palavra de ordem é deixar de lado as pretensões hegemônicas e investir na política de alianças. Minas e Rio são os dois maiores colégios eleitorais do país depois de São Paulo, o que já justificaria a preocupação, mas há mais.
O eleitorado mineiro é tido como definidor de vitórias e derrotas — basta lembrar que Aécio Neves não ganhou de Dilma Rousseff em 2014 porque perdeu a eleição “em casa”. Já o Rio na próxima eleição vai requerer especial dedicação de todos os concorrentes, dado o interesse de impor uma derrota a Jair Bolsonaro no reduto dele e de dois de seus filhos políticos. Ali ganhou de lavada em 2018, com quase 70% (67,95%) dos votos.
Lula, por ora o favorito para enfrentar o atual presidente, enfrenta uma situação peculiar no estado. Enquanto as pesquisas dão a ele uma dianteira folgada em relação a Bolsonaro no âmbito nacional, entre os fluminenses a condição é de empate dos dois num patamar em torno de 30%, segundo dados do instituto Big Data.
Em nome da necessidade, em Minas e no Rio as tratativas para a formação de chapas locais requerem mais esforço do PT no quesito desapego. Em São Paulo nada indica que o partido desistirá da candidatura de Fernando Haddad para o governo, mas em terras mineiras e fluminenses a receita prescrita é composição.
O carioca Marcelo Freixo, por duas vezes candidato a prefeito da capital e hoje o mais bem posicionado nas pesquisas para o governo, caminha para receber o apoio dos petistas, em cujos planos pode ser incluída a candidatura de Alessandro Molon ao Senado para se confrontar com um bolsonarista como, por exemplo, o ex-prefeito Marcelo Crivella ou mesmo Romário, se o ex-jogador buscar novo mandato.
O bem avaliado prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil (PSD), é objeto de desejo do PT para uma coligação que poderia incluir o empresário Josué Gomes para vice na chapa presidencial.
Uma jogada de aceno forte ao centro. Kalil é do partido de Gilberto Kassab e Josué, filho de José Alencar e futuro presidente da Federação das Indústrias de São Paulo (Fiesp), repetiria o simbolismo da chapa de 2002 e 2006, quando Lula chamou Alencar para vice a fim de sinalizar ao empresariado que não haveria nada a temer com o PT no poder.
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Publicado em VEJA de 20 de outubro de 2021, edição nº 2760