19 de novembro, 8h20: Os efeitos colaterais do dia anterior não pioraram. A dor no corpo não existe, a cabeça está normal. Ensaio no quarto uma espécie de dança da vitória para comemorar. Parece que ontem nunca existiu. Mas continuo monitorando eventuais sintomas, dores em locais estranhos (ainda me recordo da dor do lado direto do quadril e das articulações dos dedos incomodarem). Oscilo entre o otimismo de que o pior já passou e a dureza de pensar que a jornada está apenas começando.
10h56: Zero dor. Não sinto nada no braço em que tomei a potencial vacina da Janssen-Cilag e ando pela casa para me certificar de não haver mais dano adverso nenhum. Na consulta a que me submeti antes de receber a dose na terça-feira, 17, a equipe médica explicou que todos os tipos de injeções podem causar ardência, coceira, desconforto, dor, febre e calafrios, dor muscular e nas articulações, vômito, dor de cabeça, cansaço extremo, tontura, desmaio… É quase uma daquelas bulas que, lidas com lupa, desencorajam o paciente a seguir o tratamento. Pelas cláusulas do Termo de Consentimento e as explicações da clínica, o “atropelamento por um caminhão” da quarta-feira está dentro do script. Há luz no fim do túnel.
13h53: Dois dias depois de receber a dose no Instituto Brasil de Pesquisa Clínica (IBPClin), no Rio, percebo que no kit que recebi dos médicos há um cartão com o código do estudo clínico, um número de telefone disponível 24 horas para emergências e informações de que estou participando de um teste de vacina. Guardo na carteira. Em qualquer emergência, por favor, leiam este papel antes de saírem me injetando qualquer coisa, penso.
14h: A cabeça começa a doer. Uma espécie de enxaqueca de leve a moderada. E, sim, o lado direito da cintura também. De novo.
18h03: Diariamente chega no meu e-mail um lembrete para preencher o Diário de Vacina no aplicativo do estudo científico. São esses dados, somados aos de outros 7.000 voluntários da pesquisa da Janssen no Brasil, que servirão de base para eles medirem efeitos colaterais, riscos, reações alérgicas e, em casos raros, situações que levaram o paciente a procurar um médico. Hoje também é a primeira vez que vou medir a oxigenação do sangue. Uma mini farmácia, com termômetro digital, oxímetro e um kit PCR (aquele da haste nas narinas para avaliar se estou infectada com a Covid-19) me acompanham o tempo todo. A propósito, houve um expressivo aumento na procura por oxímetros em sites de busca. O aparelho, de uso ambulatorial, é como um prendedor colocado no dedo para mensurar o nível de oxigênio no sangue e não serve como diagnóstico. A baixa oxigenação do sangue, porém, é um alerta para a procura de um hospital. Uma taxa de saturação acima de 95% é considerada normal.
18h15: E se a oxigenação do meu sangue estiver abaixo de 93%, nível considerado decisivo para a procura de um médico? Tento me acalmar. A cabeça dói um pouco mais. Resultado: 99% de saturação, 80 batimentos cardíacos por minuto. Tudo normal. Começo a pensar que, se o dia de ontem foi causado por efeitos psicológicos de um placebo, este deve ser o placebo mais potente do universo.
21h59: A filha de uma voluntária me manda uma mensagem privada em uma rede social. Leu meus relatos sobre os efeitos colaterais que vivenciei e quer saber se estou melhor. Fico grata pela gentileza. Ela relata que a mãe teve reações muito parecidas e uma febre leve. Efeitos colaterais semelhantes me induzem a acreditar mais uma vez que não tomamos placebo.
A madrugada chega pronta para se impor como uma usina de paranoia.