O ‘Tubarão’ moderno: a doença que age como um predador e ameaça vidas
Colunista traça paralelo entre clássico do cinema e a pandemia de obesidade, que impacta a saúde de milhões de pessoas no mundo

Há 50 anos, o gênio Steven Spielberg dirigiu um filme que assustou muitas gerações. Era sobre um ser vivo que só está por aqui para fazer o bem, o tubarão, mas não o do filme. O foco central de Tubarão era esse “terrível” animal, um devorador de pessoas, porém, havia algo muito mais grave acontecendo na pequena cidade litorânea e turística do filme: o dinheiro valendo mais que as vidas.
Nos últimos 100 anos, não morreram nem 150 pessoas vítimas desse “feroz” peixe, enquanto só o diabetes mata quase 7 milhões por ano. Logo após essa película, a rejeição mundial aos tubarões nos fez imaginar que matá-los não seria problema, pois apresentavam risco. Os oportunistas e mal-intencionados comandantes de grandes navios pesqueiros viram nisso uma ótima chance de matar e lucrar, sem julgamentos ou até elogios. Por ano, são mortos cerca de 100 milhões de tubarões. Imaginem se fossem as graciosas baleias? O dinheiro, não só na ficção, leva pessoas a desprezarem a vida: a animal e a humana.
No inocente enredo de 1975, uma cidade que dependia financeiramente da chegada de turistas de verão para obter lucro tenta, a qualquer custo, esconder a presença de um predador nas praias, independentemente do risco de morte.
Há décadas, um tubarão chamado de obesidade ronda por nossas cidades, matando e mutilando famílias financeiramente, sem que haja qualquer preocupação com esse fato. A discriminação e o preconceito também afastam a ideia do cuidado com essa população.
Em 2008, apresentei no Senado Federal um estudo sobre todos os projetos ou leis feitos por eles desde 1972. Sobre futebol, existiam 161 legislações, praias: 49, obesidade: 42 e diabetes: apenas dez. Os governantes, por muitos anos, apesar das sociedades médicas terem colocado avisos em todas as praias, pouco se importaram.
Pacientes que vivem com essa doença dão um enorme lucro tanto para a indústria farmacêutica quanto para a alimentícia: próteses ortopédicas, cardíacas, renais, o mundo dos ultraprocessados, gerando bilhões em impostos para os países. Não há um lugar no mundo que esteja seguro, nem mesmo as ilhas isoladas. A doença e todas as suas consequências estão dizimando milhões de pessoas, mas gerando receitas bilionárias e é isso que parece interessar.
Esse extermínio, visto por qualquer um, começou a incomodar as autoridades, ainda que não seja em todos os lugares. A balança está começando a inverter: estamos gastando mais com tratamentos, cuidados, cirurgias, aposentadorias e auxílios por invalidez do que lucrando com os impostos.
Pela primeira vez, a chegada de novos medicamentos e opções cirúrgicas chama a atenção do alto poder. E, finalmente, percebe-se o apoio contra a obesidade com a economia produzida aos cofres públicos e privados apoiando a causa. Calcula-se que só as companhias aéreas americanas economizaram 100 milhões de dólares em combustível no ano passado devido à diminuição do peso das aeronaves. Os gastos nos âmbitos ambulatorial e hospitalar ainda estão sendo feitos, mas as projeções são de bilhões de dólares de economia para os próximos anos. Muitos países já subsidiam a compra dessas medicações, pois pensam na redução de custos presente e futura.
Mas o mar ainda não está seguro. Médicos, nutricionistas e outros profissionais da área de saúde ou não, estão se fazendo de pescadores e se disseminando pelas praias das mídias sociais, jogando suas iscas e redes de forma totalmente ilegal.
A geração de novas drogas está sob patente. Portanto, não deveriam ser comercializadas medicações genéricas e manipuladas, apenas as oficiais. Armadilhas das mais diversas são colocadas em todo lugar, todas prometendo serem seguras e confiáveis. Mas você cairia em um mar infestado de tubarões com roupas e jaulas de proteção não testadas?
Na trama, como na sociedade, o descaso político levou vidas por lucro. Mas, hoje, um dos objetos que funciona como um repelente para os obesos, a balança, pode ser quem irá salvá-los — só que, nesse caso, a econômica –.