Sucessivos governos executaram projetos que fizeram a educação brasileira avançar: Merenda Escolar (1955), Emenda Calmon (1983), Livro Didático (1985), Fundef (1996), PNE-I (2001), Fundeb (2007), Piso Salarial Nacional do Professor (2008), vaga a partir dos 6 anos (2010), PNE-II (2011), vaga a partir dos 4 anos (2013), vaga até os 17 anos (2016), reforma do ensino médio (2017), Base Nacional Comum Curricular (2020). Apesar disso, o Brasil continua entre os países com a pior e mais desigual educação. A ponto de ser necessário um Pacto Nacional pela Alfabetização na Idade Certa (2023), o que prova o fracasso de décadas.
Enquanto o mundo e as classes abastadas brasileiras já alfabetizam seus filhos aos 5 anos, ao mesmo tempo que iniciam estudos de idioma estrangeiro, estamos nos vangloriando da simples promessa de alfabetizar aos 8, em português. Não nos propomos a que todos terminem o ensino médio alfabetizados plenamente para a contemporaneidade: falar e escrever bem o idioma português; ser fluente em pelo menos mais um idioma; conhecer os fundamentos da matemática, ciências, geografia, história, artes; debater com competência os temas de economia, política, antropologia, sociologia, filosofia; saber usar as ferramentas digitais; dispor de pelo menos um ofício que permita emprego e renda; adquirir solidariedade com os brasileiros e com a humanidade; respeitar a natureza; querer participar da construção de um mundo melhor e mais belo, com desenvolvimento sustentável; ser capaz de continuar sua educação ao longo da vida; estar apto a disputar vaga em curso superior de qualidade, se desejar.
“Estamos nos vangloriando agora da simples promessa de alfabetizar alunos aos 8 anos de idade”
À falta de ambiciosa meta de educação com a máxima qualidade para todos, soma-se a ausência de uma estrutura com os instrumentos políticos e administrativos necessários para executar os projetos. Não há como promover a educação com qualidade e equidade sem um Sistema Federal Único Público de Educação de Base, mas as escolas dependem da vontade e dos recursos dos municípios, pobres e desiguais entre eles. A adoção dos sistemas municipais pelo governo federal requer estratégia de algumas décadas a um custo dentro das disponibilidades fiscais, no prazo de 20 a 30 anos.
Três características da sociedade dificultam essa estratégia: primeiro, educação de máxima qualidade não é um objeto de desejo político nem uma prioridade maior do eleitor brasileiro; segundo, a igualdade como ela deve ser oferecida não faz parte do caráter nacional; terceiro, o imediatismo impede que os governos a programem para futuro posterior aos seus mandatos.
Nessas condições, o ministro da Educação não tem como se comprometer com estratégia para realizar o propósito ambicioso de colocar a educação de base entre as melhores do mundo, assegurando acesso a todos, independente da renda ou do endereço. Falta-lhe também ousadia para propor a construção de um sistema público nacional único, que permita plena alfabetização para a contemporaneidade a todos os brasileiros. Por tudo isso, sua missão se esgota com a proposta de buscar diálogo com os prefeitos, para um pacto que assegure alfabetização em português até os 8 anos de idade.
Publicado em VEJA de 10 de novembro de 2023, edição nº 2867