Unir conhecimentos para entender e atravessar os desafios do Antropoceno
Professor apresenta um painel de como as ciências lidam com esse conceito - o de uma época em que o homem é a maior força a moldar o ambiente e a Terra
 
                Uma das palavras que mais ganharam as páginas dos periódicos acadêmicos e do noticiário global nos últimos anos foi Antropoceno. O termo nomeia uma Época geológica em que a humanidade se tornou o principal fator de mudanças e influências no planeta. Muito além do campo das Geociências, a expressão é corriqueira quando se fala em mudanças climáticas, sustentabilidade e risco de novas epidemias.
De forma um tanto simplista, podemos dizer que o Antropoceno batiza estes tempos em que o homem se tornou a maior força a moldar o ambiente e a colher as consequências disso. Mas estamos diante de um conceito e de um fenômeno bem mais complexos – que ainda têm de confrontar bandeiras negacionistas e fake news.
Complexidade, aliás, é como foi denominado um recente ramo da ciência que, na confluência de disciplinas, busca dar respostas a questões intrincadas por natureza… e que demandam uma intersecção de pontos de vista para serem mais bem compreendidas, encaminhadas e resolvidas.
Ela é uma das novas áreas do conhecimento, ao lado de matérias mais clássicas e independentes, em que se debruça o professor José Eli da Veiga em O Antropoceno e as Humanidades (Editora 34).
A obra examina como uma série de campos científicos, alguns deles bebendo de modelos multi e transdisciplinares, enxerga e dialoga com o conceito de uma época que, para o bem e para o mal, está nas mãos da humanidade, além de resgatar pensadores capazes de iluminar as pesquisas e os debates em curso, a começar por Charles Darwin.
Trata-se de uma discussão quente com desmembramentos epistemológicos e repercussões na vida real – haja vista as recentes ondas de calor a sufocar o planeta. E que demanda uma conversa maior entre as áreas do conhecimento (ou, para usar a velha divisão, entre as ciências exatas, as humanas e as da vida) a fim de encontrar soluções factíveis aos desafios à vista – algo que, na visão do professor do Instituto de Estudos Avançados da USP, ainda está longe da realidade.
Com a palavra, o autor.
O senhor acredita que, após eventos como a pandemia de Covid-19 e as recentes ondas de calor pelo mundo, o conceito de Antropoceno está se solidificando e se consagrando em meio à sociedade? Quais as principais resistências a essa concepção?
É muito importante distinguir “conceito” e “noção”. O conceito científico de Antropoceno só é dominado por um ínfimo número de pesquisadores, principalmente das Geociências. E isso não mudará tão cedo. Mesmo entre estes, que dominam o conceito, ainda há, sim, resistências. Mas elas se referem aos critérios técnicos exigidos para a delimitação e datação de uma “Época” [geológica]. Não existem resistências à proposição de que o conjunto das atividades humanas possa se tornar o principal vetor das alterações do que chamam de “Sistema Terra”.
Porém, coisa bem diferente é a percepção da opinião pública com a divulgação da ideia de que estaríamos numa nova Época, batizada de Antropoceno. Neste âmbito, duas observações são fundamentais. A primeira é que a esmagadora maioria dos que concluíram o ensino médio não lembra, ou nem aprendeu, os rudimentos da escala do tempo geológico. Diante do termo “Antropoceno”, não chegam a entender sua importância. A segunda é que, certamente, ainda estamos muito longe de qualquer “solidificação” ou “consagração” do próprio termo. Nem noções correlatas muito mais próximas – como, por exemplo, os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da Agenda 2030 – chegaram à metade da população brasileira.
 
    Darwin é personagem central no seu livro. Apesar das deturpações e omissões na obra do pensador inglês ao longo das décadas, algo para o qual o senhor chama a atenção, em que medida suas noções e visões permanecem atuais para entender e lidar com os desafios ambientais e sociais dos nossos tempos?
Darwin permanece absolutamente atual. A rigor, seu pensamento ainda precisará ser descoberto, pois os darwinistas criaram imensa confusão, com ruminações restritas à sua obra mais famosa, A Origem das Espécies, de 1859. Livro que, propositalmente, excluiu a espécie humana.
Porém, tão importante quanto ele é, no mínimo, uma outra obra, só publicada doze anos depois, que continua tão discriminada que nem sequer seu título – The Descent of Man – foi corretamente traduzido nas línguas latinas. Recentemente, isso foi corrigido no idioma francês, passando a ser o equivalente a A Filiação do Homem (em vez de “A Origem do Homem”). Só a conexão entre essas duas obras-primas permitirá uma razoável compreensão do pensamento de Darwin.
O que meu livro sugere é que tal descoberta do rigoroso pensamento darwiniano talvez possa vir a ter crucial impacto sobre o que tem sido chamado de “Ciências da Complexidade”, que constituem a principal fronteira científica deste século, especialmente em termos epistemológicos.
Das teorias à prática, o que passa pela elaboração e aplicação de políticas públicas mais efetivas, acredita que uma das chaves para enfrentar as mudanças climáticas e suas repercussões resida numa aproximação ainda maior entre as ciências humanas e as da vida, isto é, em encurtar ou eliminar o fosso entre as áreas do conhecimento?
Será ótimo se tal fosso puder ser encurtado. Mas não parece haver evidências de que tal aproximação esteja realmente ocorrendo. Uma coisa é poder apontar e elogiar alguns brilhantes polímatas, que mostram ter muito domínio sobre os dois grandes campos do conhecimento. Outra, bem diferente, é achar que tais campos estejam realmente se aproximando. Uma grande esperança está sendo trazida pelos mais recentes estudos sobre a “Complexidade”, mas a conclusão de minha pesquisa é que estes ainda formam uma imensa Torre de Babel.
 
	 
                 
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