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‘Palavras são instrumentos preciosos para escavar o passado’, diz autora

Em "Ressuscitar Mamutes", escritora brasileira faz trabalho arqueológico sobre as próprias memórias para reconstruir e eternizar vivências junto à mãe

Por Diogo Sponchiato Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 23 jul 2024, 18h03 - Publicado em 23 jul 2024, 17h21
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  • A ciência está tentando fazer hoje o que a literatura consegue realizar há séculos: ressuscitar ou eternizar pessoas (e outros seres). E é com as ferramentas da palavra que a escritora Silvana Tavano escava memórias para reviver uma personagem que lhe marcou a vida desde o parto: a própria mãe.

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    Ressuscitar Mamutes, romance publicado pela Autêntica Contemporânea, parte de uma notícia real sobre o animal extinto que aparece no instigante título – sim, pesquisadores querem trazer à existência esses primos dos elefantes que desapareceram há milhares de anos – para realizar outro tipo de trabalho arqueológico, cujos fósseis são recordações, enfeites ou peças de roupa em um apartamento fechado.

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    Silvana garimpa as lembranças, daquelas à superfície às mais enterradas, e reconstrói vivências da (e junto à) genitora. A memória é seu campo de trabalho, numa geografia circunscrita pelas dores e alegrias em família. É difícil não se projetar no lugar de mãe e filha, filha e mãe, nessa história que, como diz a autora, é centrada no tempo (ou nos tempos).

    Ressuscitar mamutes

    Silvana-Tavano

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    E é assim que a acompanhamos desde a sua infância no (tão próximo e tão distante) século XX até suas rotas imaginárias por um futuro possível, aquele que, acossado pelas mudanças climáticas e povoado de inovações científicas, talvez veja mamutes caminhando de novo pela face da Terra. Um futuro em que mãe e filha estarão sempre vivas, ao menos dentro dos livros.

    Com a palavra, Silvana Tavano.

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    silvana-tavano
    (Foto: Luiza Sigulem/Reprodução)

    Seu livro mostra que já temos uma tecnologia para eternizar e ressuscitar pessoas, a literatura. Quão duro (e belo) é esse trabalho de escavar o passado e reconstruir alguém tão íntimo com palavras?

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    A literatura faz isso desde sempre: ressuscita passados, inventa presentes, imagina futuros. Nesse sentido, o escritor pensa como o cientista que lança hipóteses sobre como teria sido se, como será se… A ficção, assim como a ciência, avança a partir desses ses para criar e recriar personagens, mundos, situações. E as palavras são instrumentos preciosos para escavar o passado – só com elas podemos nomear o invisível que emerge dessa escavação, dar forma ao que permanece, apesar do que se desgastou com o tempo. Reconstruir uma pessoa amada a partir das palavras é construir um personagem, e isso sempre é difícil e belo.

    Hoje está em alta o que se convencionou chamar de autoficção. Você impõe algum limite à liberdade narrativa ao manipular dados e histórias da vida real?

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    Nada limita (ou deveria limitar) a liberdade narrativa, e esse é um dos encantos da literatura. Não vejo este livro como autoficção, pois a proximidade entre a identidade da narradora e a da autora não é um tema trabalhado no texto. Quero dizer, o leitor que não conhece a autora não tem elementos na narrativa para fazer essa aproximação, como acontece claramente nos livros de Emmanuel Carrère, de Ricardo Lísias e outros escritores.

    Aqui, o contrato com o leitor propõe a suspensão da descrença, como em qualquer ficção. E como ficção, a narrativa parte de uma experiência pessoal transformando essa experiência. A memória da narradora é uma recriação – a própria memória é também invenção. Acho que, no livro, não cabe o paralelismo entre vida real e literatura, até porque o tema do livro é o tempo – os tempos. E a mãe encarna esses tempos a partir das memórias recriadas pela narradora.

    Prova disso é o que tantas leitoras e leitores me dizem: “Me vi ali, vi minha filha, minha avó, minha mãe…” Na orelha do livro, a escritora Natália Timerman coloca melhor do que eu: é sobre “o amor de todas as filhas por todas as mães, incluindo as não humanas: as mamutes que, diz a ciência, talvez nos salvem (das consequências da crise climática)”.

    Sobre as memórias de futuros possíveis, que encerram seu romance… Reside aí o grande poder da literatura: driblar a realidade e a mortalidade?

    Eu não diria que a literatura “dribla a realidade”, pois o real muitas vezes é totalmente inverossímil, exigindo da literatura um trabalho de criação para que o leitor não abandone o livro achando tudo aquilo absurdo. No papel, as histórias precisam ter coerência, lógica, e a realidade pode ser inacreditável. Por outro lado, pelo menos até agora, só a literatura tem o poder de superar a mortalidade, de contornar o incontornável – o tempo, a saudade, a nossa própria existência.

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