Cravo-da-índia, champanhe, presunto de parma… Quantos alimentos que você conhece que trazem no nome suas origens? Além de dizer de onde eles vêm, essas designações fazem da comida uma espécie de emissário internacional, carregando traços positivos de sua procedência. A ideia tem se expandido com o nome de “gastrodiplomacia”. O conceito novo sistematiza algo que os povos já fazem intuitivamente há muitas eras: louvar o que têm de melhor.
A Itália dá aula nesse quesito. Com as grandes ondas de imigração na virada do século 19 para o 20 e no pós-guerra, espalhou o macarrão (que importou da China), colonizando o gosto das novas terras. O orgulho deles é tal que, há pouco tempo, Alberto Grandi, um acadêmico polemista, enfureceu os romanos ao difundir que o carbonara nasceu nos Estados Unidos.
A reivindicação da identidade culinária vai além do brio, entrando no campo do “soft power”, o emprego da cultura local como instrumento das relações internacionais. O pulo do gato é usar as especialidades culinárias para fins estratégicos.
Veja-se a Tailândia. O país, que ganhou triste fama pelo turismo sexual, reinventou sua imagem após incentivar a abertura de restaurantes de sua saborosa culinária no exterior. O turismo convencional e as exportações de comida se multiplicaram, ainda que não seja possível provar por A mais B que tenha sido graças aos méritos de embaixador do aromático “pad thai”.
O exemplo é considerado pioneiro da gastrodiplomacia, mas há outros. A Coreia do Sul, que consolidou uma cara própria no exterior com o k-pop, apostou no “kimchi”, conserva de acelga fermentada, como carro-chefe. A Espanha investe pesado na divulgação de sua boa mesa, com um escritório de turismo robusto que desenvolve ações de marketing em dezenas de países. Um exemplo recente foi a promoção do Dia Mundial da Tapa. A data ganhou páginas de jornal, explicando o aperitivo típico dos espanhóis.
Há margem para ampliar o empenho brasileiro nesse campo e atrair o olhar internacional. Cabe perguntar quais seriam, no nosso caso, os elementos gastronômicos capazes de servir como cartão de visitas.
Com a preocupação de recolocar o Brasil como exemplo de proteção ao meio ambiente, tem se apostado no já popular açaí para puxar outros itens amazônicos menos conhecidos. Esforço louvável, embora valesse reforçar também a mira para pratos que já circulam há tempos.
Por exemplo, o pão de queijo. À base de tapioca, fez sucesso pela febre do “gluten free” e ganhou destaque nas páginas do jornal The Washington Post, como contei em outra coluna. Se quisermos ficar no feijão-com-arroz, a feijoada, servida com farofa da indígena farinha de mandioca sempre se mostrou forte candidata, desde que Tarsila do Amaral e Oswald de Andrade a serviam em Paris nos anos 1920.
Agora, boas embaixadas mesmo foram, nas últimas décadas, as “steak houses”, versão para exportação dos nossos rodízios de carnes. Elas já estão em várias cidades dos cinco continentes. George W. Bush ia semana sim, semana não, comer na filial de uma conhecida rede brasileira em Washington. Diplomata algum teria tido tantos encontros com um presidente americano.