Nos últimos anos, o presidente Jair Bolsonaro sentou-se à mesa em inúmeras ocasiões para discutir um Bolsa Família para chamar de seu. Um presidente que se elegeu com o discurso do liberalismo econômico e com a bandeira do fim da reeleição começou três anos antes da conclusão do seu mandato a desenhar o que promete ser uma das maiores bandeiras de sua campanha para 2022.
Bolsonaro costuma explicar o novo Bolsa Família pela necessidade de garantir renda aos mais vulneráveis diante da crise provocada pela pandemia. Ninguém questiona a importância de dar continuidade à ajuda trazida pelo auxílio emergencial, que contribuiu de maneira significativa para segurar o consumo no momento mais drástico da disseminação do coronavírus no País. Mas o objetivo de Bolsonaro é, antes de tudo, eleitoral. E sempre foi.
O novo Bolsa Família turbinado nasceu quando o coronavírus ainda nem sequer tinha chegado ao Brasil. Essa informação foi revelada por esta colunista na TV Bandeirantes, em maio de 2020. Na época, um ministro contou que o desenho preliminar do programa começou a ser feito em janeiro daquele ano. Naquela época, Bolsonaro dizia que o novo programa tinha que ser maior e melhor que aquele que se transformou na marca dos governos do PT. E tinha que ter uma diferença crucial: uma porta de saída. Os beneficiários teriam um prazo para sair do programa. Contariam com programas de capacitação profissional, para que pudessem fazer uma transição para o mercado de trabalho.
Na época, o presidente ainda temia possíveis efeitos colaterais do programa. Não queria nem ouvir ideias como a de financiar o novo Bolsa Família com a consolidação de outros programas, como o abono salarial e o Farmácia Popular, por exemplo. Dizia que não poderia “tirar do pobre para dar ao paupérrimo”. Também temia comparações com o ex-presidente Lula, pelo fato de as verbas de programas como o Bolsa Escola terem sido incorporadas ao Bolsa Família na sua origem.
Quando o ministro da Economia, Paulo Guedes, tentou usar o novo programa como justificativa para criar um novo imposto sobre transações financeiras, a nova CPMF, Bolsonaro foi ainda mais taxativo. Chegou a dar por encerrada a discussão sobre o Renda Brasil, nome escolhido na época para batizar o novo projeto. Mas rapidamente voltou atrás. Só mudou o nome para Renda Cidadã e seguiu o jogo. A saída mais recente encontrada pela equipe econômica, o parcelamento dos precatórios com a ajuda do Supremo Tribunal Federal, também subiu no telhado. Mas pelo destempero verbal do próprio presidente nos atos de 7 de setembro.
Sem uma solução rápida para o problema, Bolsonaro voltou-se novamente para a mesma estratégia que rejeitou lá atrás. E tirou da cartola seu novo Bolsa Família com o aumento do IOF, a tempo de valer para sua campanha de reeleição. Só que o momento não poderia ser menos oportuno. A alta do IOF, Imposto sobre Operações Financeiras, vai encarecer o crédito, justamente no momento em que a economia custa para dar sinais de retomada.
A notícia vem à tona em meio às fortes pressões sobre a inflação. E a poucos dias de um novo aumento da Selic, a taxa básica de juros, pronto para ser sacramentado na próxima reunião do Comitê de Política Monetária. Todos elementos que aumentam o custo de quem precisa tomar um empréstimo para sobreviver diante da crise.
A decisão de Bolsonaro para dar vida ao novo Bolsa Família, feita por decreto, pode até garantir a receita adicional de mais de R$ 2 bilhões para viabilizar o marketing eleitoral do presidente. Mas é um remendo temporário. Que tem vários efeitos colaterais.