Marcos Troyjo
Em março deste ano, tive o privilégio de mediar um debate com Thomas Friedman, colunista do jornal The New York Times, na Câmara Americana de Comércio, em São Paulo.
Pouco antes de começar sua apresentação, falamos sobre seu último livro (“Obrigado pelo Atraso”), cujo título se refere às vantagens de alguns países e empresas que não tiveram de passar por sucessivas fases de desenvolvimento tecnológico. Podem, portanto, adotar o estado-da-arte de uma ou outra inovação sem necessariamente despender elevados recursos na fase mais básica (e cara) de incorporação daquela tecnologia.
Bom exemplo disso é a rede de telefonia de alguns países de elevado crescimento recente — eles não tiveram de investir pesado e depois substituir os cada vez mais obsoletos fios de cobre. Foi possível ir direto para um modelo de fibras óticas e satélites de mais baixo custo.
Friedman, no entanto, me revelou que “Obrigado pelo Atraso” não era sua ideia original para o título do livro. Ele queria fazer um jogo de palavras e conceitos com seu livro mais conhecido — “O Mundo é Plano” (“The World is Flat”, em inglês) — e assim chamar a nova obra de “O Mundo é Rápido” (“The World is Fast”).
Lamento que ele não tenha seguido o primeiro instinto, pois o mundo hoje encontra-se muito menos plano do que no auge da “globalização profunda” que antecedeu a Grande Recessão de 2008. Não há dúvida, porém, que o mundo está mais rápido.
Rapidez aqui significa algo muito além de agilidade na comunicação ou logística. Tem mais que ver com a rápida sucessão de tecnologias dominantes. Estamos já deixando arquiteturas digitais, que há pouco prevaleceram sobre as analógicas. Agora, rumamos para sistemas cognitivos, onde o núcleo central é ocupado pela chamada “inteligência aumentada” (sim, o termo é melhor que “inteligência artificial”).
E, no nível da competição internacional, rapidez projeta a agilidade com que certos países conseguem identificar as megatendências que moldam a globalização e daí formulam e implementam estratégias de adaptação aos novos tempos.
A partir de tais parâmetros é possível afirmar: o Brasil, dentre tantas outras características, é um país lento.
Quando a tendência, em termos da disposição espacial da produção manufatureira, era a formação de redes globais de suprimentos, o Brasil praticou substituição de importações para abastecer o mercado interno.
Enquanto países cortaram impostos de modo a deixar mais capitais à disposição dos empreendedores para investir em pesquisa e desenvolvimento, o Brasil manteve inalterado seu lote de recursos como percentual do PIB destinado à inovação.
Ao passo que países deixaram de lado preferências ideológicas para estabelecer conexões de comércio e investimentos — de que é exemplo o exponencial aumento do fluxo econômico entre EUA e China nos últimos 40 anos — o Brasil optou por priorizar a abordagem “Sul-Sul”.
Com um mínimo de capacidade prospectiva, é possível enxergar desde agora, neste 2018, quatro grandes vetores da cena internacional nos próximos 25 anos. O êxito brasileiro será determinado em grande medida pelo grau de estratégia e velocidade em se adaptar a cada um deles.
O primeiro é que, apesar de todos os danos que a presente administração Trump semeia e causa para a presença americana no mundo, os EUA têm tudo para ser um grande país “reemergente” do próximo quarto de século. Na terça (4) a Amazon se juntou a Apple no exclusivo clube das empresas de valor de mercado superior a US$ 1 trilhão (R$4,15 trilhões) — e outras em breve também atingirão essa marca.
Em meio a esse ou aquele arroubo protecionista ou isolacionista, os EUA continuam com ampla liderança nas universidades e centros de pesquisa de primeira linha. E, graças a seu ecossistema benigno à aliança entre conhecimento e capital disponível para empreendimentos tecnológicos, continuam como país que mais gera inovação transformada em produtos comercializáveis.
O segundo vetor é representado pela ascensão da China à categoria de superpotência para além do comércio. Ela passa assim a jogar papel de protagonista nas finanças internacionais, no fomento à infraestrutura em seu entorno geográfico e além dele, nos empréstimos governo-a-governo, e na extroversão de suas corporações para áreas como a África e a América Latina.
O terceiro reside na dura escolha para países de desenvolvimento intermediário — como o Brasil, Rússia ou Argentina — e que apresentam ainda características de grande acesso a recursos naturais. O que fazer? Em termos de custos de produção, são caros demais para competir com países como Vietnã, Indonésia ou Índia.
Já na esfera da agregação de valor, são “sofisticados de menos” quando a corrida se trava com EUA, Europa, Japão e, crescentemente, a China.
E o quarto diz respeito a toda recapacitação de recursos humanos para desempenhar funções produtivas no âmbito da Economia 4.0. Nesta, não importa se a atividade se dá na agricultura, indústria, serviços ou qualquer outro setor. No limite, todos serão empresas de tecnologia ou perecerão.
Infelizmente, essas questões cruciais passam longe do que hoje é o conteúdo do debate presidencial no país. O mundo é rápido, e não esperará por um Brasil desatento, atabalhoado e lento.