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MP 579, nunca mais

O mundo político nunca se conformou com a ideia de autonomia

Por Elena Landau
Atualizado em 30 jul 2020, 19h36 - Publicado em 5 jul 2019, 15h46
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  • Elena Landau (publicado no Estadão)

    Depois de 16 anos tramitando, foi promulgada a nova Lei das Agências Reguladoras. Oportunidade para um recomeço. Surgiram em meados dos anos 90 para acompanhar o programa de desestatização. Com a privatização da energia elétrica e das telecomunicações foram criadas a Aneel e Anatel.

    Esses serviços eram prestados por estatais, muitas vezes na forma de monopólio, sem preocupação com fiscalização, regulação ou competição. As agências são autarquias com autonomia técnica, operacional e decisória. Suas decisões devem preservar os compromissos definidos nos contratos de concessão, assinados por ocasião da privatização. Não devem atuar nem como órgão de defesa do consumidor, nem como implementador de interesses do governo, devendo evitar a sua captura pelas empresas reguladas.

    Depois de um início promissor, sua independência passou a ser questionada. Lula logo que assumiu reclamou de não ter sido consultado a respeito de reajustes tarifários para energia homologados pela Aneel. Bolsonaro reagiu ao método de escolha de diretores. O mundo político nunca se conformou com a ideia de autonomia. Hoje, as agências sofrem críticas até de libertários, que enxergam a regulação como uma forma de intervenção do Estado. Esquecem que até mesmo o austríaco Hayek defende a necessidade de arcabouços legais em casos de falhas de mercado.

    O grande desafio para o regulador é desenhar as regras sem afetar a competição onde ela é possível e necessária. Nesse sentido, uma das mais importantes exigências trazidas pela nova lei é a Análise de Impacto Regulatório (AIR), com consultas e audiências públicas.

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    A implementação do novo modelo para o gás será um teste importantíssimo. Enfim a busca de competição, com o fim do monopólio da Petrobras, chega a esse setor. As linhas gerais desse modelo foram definidas pelo CNPE. O anúncio oficial trouxe questões importantes a serem discutidas. Na ocasião, Guedes projetou uma meta de queda no preço do gás de 40% em dois anos, revelando um flerte do liberalismo com o populismo.

    O desastre decorrente da MP 579 no setor elétrico mostra que se deve evitar a todo custo promessas como essas. Em tempo, o ministro Bento de Albuquerque lembrou que os preços serão definidos pelo mercado. O papel dos vários participantes dessa atividade vai mudar, gerando conflitos naturais que deverão ser arbitrados em favor de um maior benefício para a sociedade. Os preços devem se tornar mais competitivos não só para a indústria, que é o foco da nova regulamentação, mas para todos os consumidores, incluindo os cativos.

    Há muita expectativa com a privatização das distribuidoras, sendo monopólio natural, exigem uma regulação confiável, respeitando-se os contratos existentes no caso de empresas já privatizadas. Caberá à ANP, Agência Nacional do Petróleo, o papel fundamental na definição das novas regras, como já teve a Anatel na privatização das teles. A nova lei exige a AIR para formalização e publicidade das decisões e a agência deverá justificar o caminho regulatório escolhido. Há outros avanços importantes. A temida captura ocorreu, não pela indústria, mas de forma intensa e explícita pela política, com diretores indicados para defender interesses de grupos políticos e do próprio governo.

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    A lei busca recuperar a credibilidade perdida, ao despolitizar as indicações com as restrições que já existem na Lei das Estatais. Exige competência técnica comprovada. Ao introduzir mandatos não coincidentes e restringir os casos de demissões de diretores à renúncia e condenação judicial ou administrativa, dificulta ainda mais a captura política. É um importante mea culpa do Congresso, que não cumpriu com rigor suas atribuições no processo de aprovação de diretores. Outra novidade relevante foi a limitação da ingerência do TCU, mantendo suas atribuições de controle externo, sem interferir na atividade fim das agências, o que ajudará a superar a paralisia decisória.

    A expectativa é que a lei aumente a transparência das decisões e aprimore o planejamento das atividades. Tudo isso deverá reduzir a insegurança jurídica no setor de infraestrutura.

    As mudanças são importantes. Cabe à sociedade exigir o cumprimento do que a lei determina. Quando Dilma tentou impor artificialmente energia barata no Brasil, a Aneel foi conivente. Deu no que deu. Fica a lição: MP 579, nunca mais.

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