Publicado na edição impressa de VEJA
“Vamos para o palácio, pois o senhor vai ter de assumir a Presidência.” Não é qualquer político que ouve uma frase dessas, mas Paschoal Ranieri Mazzilli, filho de imigrantes italianos que havia ascendido a presidente da Câmara, não era calouro no assunto: já preenchera lacunas interinas quatro vezes, a mais importante delas depois da renúncia de Jânio Quadros. Nem por um minuto teve a ilusão de que naquela madrugada de 2 de abril de 1964 seria diferente. Sabia que era uma espécie de presidente de plantão para emergências, à altura da brincadeira picante que o comparava a um absorvente feminino: o homem que sempre estava no melhor lugar, nos piores dias, para evitar derramamento de sangue.
Seguindo o presidente do Senado, Auro de Moura Andrade, que havia ajudado o impulso golpista ao declarar a vacância da Presidência, e um grupo de deputados paulistas, todos armados, Mazzilli chegou a um Palácio do Planalto às escuras onde se desenrolou uma cena de cinema. No 4º andar, Darcy Ribeiro e Waldir Pires imaginavam resistir em nome do governo deposto. No 3º, iluminado por palitos de fósforo até que se encontrasse um contínuo para acender a luz, Mazzilli tomava posse às 3h45 da madrugada. Entre os presentes, deputados que se tornariam vultos da futura oposição, como Ulysses Guimarães e Nelson Carneiro.
Mazzilli era presidente da República pela quinta vez, seu juramento de lealdade à Constituição não valia nada e mandava menos do que nunca. Ocupou o cargo por treze dias, enquanto o poder armado articulava a eleição do general Castello Branco no Congresso. Ribeiro e Pires deixaram o palácio. Mazzilli pediu garantias ao general Costa e Silva. Não houve derramamento de sangue.
Colaboradores: André Petry, Augusto Nunes, Carlos Graieb, Diogo Schelp, Duda Teixeira, Eurípedes Alcântara, Fábio Altman, Giuliano Guandalini, Jerônimo Teixeira, Juliana Linhares, Leslie Lestão, Otávio Cabral, Pedro Dias, Rinaldo Gama, Thaís Oyama e Vilma Gryzinski.