Os transtornos causados pela falta de energia elétrica, frequentemente por longos períodos, é mais um dos problemas que afligem há muito os paulistanos, sem que até agora os que têm responsabilidade na sua solução – por motivos diferentes, a empresa concessionária desse serviço e o poder público – tenham feito o que deles se espera, e que é sua obrigação, para resolvê-lo. As desculpas esfarrapadas de uma e de outro, que fazem pouco da inteligência da população, se sucedem ano após ano sem que nada de efetivo seja feito enquanto a população atingida por esses apagões acumula prejuízos e aborrecimentos.
O grande número de reclamações e o tempo que a concessionária leva para restabelecer o fornecimento de energia, que dura muitas vezes mais de três dias, levaram o Ministério Público do Estado (MPE), por meio da Promotoria de Justiça do Consumidor, a abrir um inquérito para apurar a qualidade do serviço prestado pela Enel, empresa que adquiriu o controle (70%) da Eletropaulo no ano passado. Pelas mesmas razões, a empresa já havia sido notificada pelo Procon de São Paulo e pelo Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor. Os três fatos mostram a gravidade que o problema vem assumindo.
A Promotoria deu 15 dias para a Enel prestar esclarecimentos sobre as causas das interrupções e sua longa duração, assim como sobre o atendimento prestado aos consumidores. As explicações públicas, claramente insuficientes, dadas até agora pela empresa, assim como a dimensão do problema, indicam que não será fácil para ela atender a contento o MPE.
Os depoimentos publicados por reportagem do Estado dão uma ideia das agruras dos paulistanos atingidos pela falta de luz, que vão dos transtornos na sua rotina a importantes prejuízos materiais. Uma moradora da Penha diz ter ficado sem luz das 17 horas de 24 de fevereiro até a madrugada de 27, e que isso se repetiu duas vezes poucos dias depois, uma por quatro e outra por nove horas. Outra moradora do mesmo bairro ficou dois dias sem energia, também em fevereiro. Além do desconforto, “estragou tudo na geladeira, mas ninguém quer saber do que perdemos”.
Os relatos de moradores de outros bairros são parecidos, variando apenas a duração – nunca pequena – da falta de energia. Já os prejuízos e os transtornos são praticamente os mesmos. Igualmente grave é o que acontece com o comércio e outros serviços afetados. O desabafo de um morador resume tudo: “Acho lamentável a gente ficar à mercê desse tipo de atendimento. A energia não é gratuita. Pelo contrário, é bem cara”. Como se isso não bastasse, acrescenta, ainda não recebem o mínimo de atenção que merecem em tal situação.
As explicações dadas pela Enel em nota não convencem, porque os esforços que sem dúvida tem feito para enfrentar a situação ficam muito aquém do necessário, como provam o aumento das reclamações dos consumidores e o tempo que demora para providenciar os consertos. “Após 16 horas de tempestade (de um dia do fim de fevereiro), 56% dos clientes impactados tiveram o fornecimento normalizado”, vangloria-se a empresa. É a velha história do copo cheio ou vazio pela metade, conforme o desejo do observador. E os outros 44% “impactados”?
A Enel fala também dos ventos de até 88 km/h daquele dia, que derrubaram mais de 600 árvores em cima da fiação, provocando a interrupção de energia. Nesse ponto ela tem uma parte de razão, porque neste caso a Prefeitura não tem feito tudo o que deve e pode. Como é notório, não cuida das árvores como deveria, tanto no tratamento como na poda regular e na derrubada, quando elas estão condenadas. Não é à toa que se estima que neste ano já caíram mais de 2 mil árvores na cidade. Essa situação não pode continuar. A concessionária não tem inteira razão, porque, ao assumir o serviço, sabia que essa era a realidade. Como sabia também que herdou a responsabilidade de buscar, junto com o poder público, uma solução para o problema do aterramento da fiação. A fiação aérea numa cidade do porte de São Paulo é uma aberração que não pode continuar.