No Rio Grande do Sul, nenhum outro tipo de vínculo supera a paixão do torcedor, e a condição de gremista ou colorado precede todas as outras. Laços familiares, por exemplo, podem juntar parentes que torcem por times diferentes no Natal, nas festas de aniversário, em casamentos e outros encontros de sobrenomes. Nunca na mesma arquibancada. Também é assim com vínculos políticos. Se houver um Gre-Nal no dia seguinte ao da eleição, os torcedores que estiveram juntos durante a campanha e votaram no mesmo candidato estarão prontos para a troca de provocações, gritos de guerra e, se necessário, bandeiradas. Tentar juntar num mesmo balaio as duas nações do mundo do futebol, sabe quem conhece os gaúchos, é mais que perda de tempo. É ofensa gravíssima.
Há mais de 30 anos morando em Porto Alegre, Dilma Rousseff ainda não sabe. Nem os redatores do site oficial da candidata. Pouco depois da passagem da trupe de Lula pelo Rio Grande, a turma de Marcelo Branco resolveu anunciar a revogação da rivalidade irrevogável. A milagreira aprendiz deu azar outra vez: o jornalista Celso Arnaldo testemunhou o tiro no pé, e decidiu tornar mais divertido o domingo dos amigos da coluna com o seguinte relato:
Delírios no site oficial de Dilma Rousseff, a começar pela manchete:
O GRE-NAL DE DILMA E LULA
Trecho do texto:
“O Gigantinho, ginásio de esportes do Inter, com capacidade para 15 mil pessoas, fica pequeno para as duas torcidas eternamente rivais, mas que desta vez estão unidas num só grito de guerra: “1, 2, 3/ 4, 5, mil! É Tarso no Rio Grande e a Dilma no Brasil. A responsável pela missão quase impossível de unir as duas torcidas tem os olhos fixos nas arquibancadas. Dilma veste um blazer vermelho, mas fala ao coração de todas as torcidas, de todas as cores. Primeiro, ela agradece ao Rio Grande e aos riograndenses, que acolheram aquela jovem mineira como se acolhe uma filha, logo que ela saiu da prisão da ditadura. Depois, Dilma olha nos olhos de cada homem e de cada mulher e avisa, reforçando a última sílaba:
“Vou ser a primeira presiden-TA deste país!”.
Sim, com a mesma ênfase que daria a “já sou a primeira an-TA. E disse isso – destaca o texto — depois de mirar firme em nada menos do que 30 mil olhos, um por um. Foi, com certeza, o mais longo comício da história da República.
E então o redator hooligan de Dilma isola a bola na arquibancada, com um chutão de canela, a esmo:
“As duas torcidas que agora formam uma só vibram como se fosse possível comemorar, ao mesmo tempo, um gol do Grêmio e outro do Inter, num Gre-Nal decisivo. Se nesta noite estivesse a serviço, o árbitro gaúcho Carlos Eugenio Simon, do alto do palanque, registraria na súmula imaginária o tento concreto: Gol do Brasil, gol dos brasileiros e das brasileiras.”
Não, o gol é contra o Brasil e contra os brasileiros que jogam limpo e bonito. E marcado em impedimento escandaloso -– Carlos Eugenio Simon já fez muita lambança no futebol, mas esse gol nem ele validaria. O staff da campanha de Dilma conseguiu enxergar esporte, paixão clubística e confratenização entre inimigos figadais numa plateia de 15 mil petistas amestrados, a maioria funcionários públicos e sindicalistas em offside do trabalho, que detestam futebol-arte e vibram com as cavadinhas de uma perna de pau treinada por Nove Dedos, o 171, um treinador que faria João Avelino, o 71, parecer um lorde inglês ao lado de José Mourinho.
O primeiro gesto da presiden-TA Dilma, a pacificadora, a Petista de Hamelin dos ratos do Gigantinho, será juntar num ginásio da Faixa de Gaza 15 mil judeus e palestinos, meio a meio, cada qual com a camisa de seus clubes – para produzir a paz que nem Lula, o diplomata sem diplomacia, o embaixador oferecido, conseguiu.
Dilma e Lula juntos em campo fazem o verdadeiro clássico da vergonha: o FOI-MAL.