A maioria dos brasileiros talvez nem saiba que a seleção feminina de handebol ganhou neste domingo o campeonato mundial disputado em Belgrado. E a final contra a Sérvia, que jogava em casa, só foi vista em telas menos mirradas por quem sintonizou o Esporte Interativo, único canal de televisão a transmitir ao vivo a partida histórica. Até este fim de dezembro, como lembrou o comentarista Otávio Campos, apenas a equipe da Coreia do Sul, em 1995, conseguira impedir que a competição fosse vencida por alguma seleção europeia.
O épico triunfo das meninas do handebol merecia ser visto por todo brasileiro capaz de distinguir uma bola de uma lâmpada. Mas a miopia da TV aberta e a arrogância da TV paga se conjugaram para negar a milhões de telespectadores as emoções proporcionadas por um timaço burilado pelo técnico dinamarquês Morten Soubak. Leiam um trecho do texto publicado em seu blog pelo meu velho amigo Juca Kfouri. Volto em seguida:
Por 22 a 20, num final de jogo de matar, as brasileiras venceram as sérvias em sua casa e com 20 mil pessoas no ginásio de Belgrado para ganharem o Mundial de handebol feminino.
Duda, a melhor jogadora do Mundial, Alê, a melhor jogadora do mundo, a goleira Babi, a Fê, a Dani, a Dara ( que trio: Dani, Dara e Duda!), a Mayara, a Samira, a Ana Paula, todas, o que dizer delas?
Fizeram 13 a 11 no primeiro tempo, abriram uma boa diferença no começo do segundo, acho que chegaram a botar quatro gols, mas as sérvias, em casa, estavam dispostas a morrer e empataram uma, duas, três vezes.
Morreram só no fim.
Agora quem manda no handebol feminino, como no vôlei, são as mulheres brasileiras.
Pego uma carona do post de Juca Kfouri para lembrar que a vitória é só delas. Além de vencer equipes fortíssimas, as bravas campeãs tiveram de derrotar governantes incapazes de criar uma política esportiva que mereça tal nome (mas sempre prontos para assumir expropriar conquistas alheias), as oscilações oportunistas de patrocinadores federais ou financiadores privados (que minutos depois da proeza já estavam reencenando o espetáculo do cinismo patriótico), o descaso da cartolagem olímpica (que nem esperou o dia seguinte para reivindicar a paternidade do feito) e a a cegueira dos donos da telinha (que só descobrem futuros medalhistas depois de vê-los empoleirados num pódio).
As heroínas de Belgrado representaram uma nação que não acompanhou a saga na Sérvia nem torceu por elas sequer à distância. Os jornais nativos confinaram o campeonato mundial de handebol em espaços semelhantes aos reservados a torneios de rúgbi na Índia. No domingo, enquanto a seleção de Morten Soubak lutava contra uma equipe apoiada por milhares de sérvios no ginásio e milhões espalhados pelo país, os assinantes da NET e da SKY foram submetidos pela dupla de polvos à contemplação de mediocridades de chuteiras dando pontapés em múltiplos sotaques.
O novo campeão mundial de handebol não é o Brasil. O título pertence a um grande time formado por um grande técnico — e a mais ninguém.