Assine VEJA por R$2,00/semana
Alexandre Schwartsman Economista, ex-diretor do Banco Central
Continua após publicidade

Nosso espelho sombrio

A Argentina é um modelo do que não se deve fazer em economia

Por Alexandre Schwartsman
Atualizado em 10 Maio 2024, 08h19 - Publicado em 27 out 2023, 06h00
  • Seguir materia Seguindo materia
  • Não falta quem defenda no Brasil novas rodadas de aumento do gasto público, de preferência acompanhadas por reduções generosas das taxas de juros, que supostamente permitiriam a redução das despesas financeiras e o aumento das despesas primárias.

    Publicidade

    À primeira vista, a coisa pode parecer fazer certo sentido, até que examinemos como tal combinação de política econômica funcionou no nosso principal vizinho e parceiro regional, a Argentina.

    Publicidade

    De fato, os preços ao consumidor na Argentina aumentaram nada menos do que 138% nos últimos doze meses. Mesmo essa medida, porém, subestima a velocidade de deterioração da inflação platina: em agosto e setembro ela atingiu cerca de 12% ao mês, pouco menos que o dobro do registrado nos meses anteriores.

    Vale dizer: na ponta, a inflação argentina roda próximo a 300% ao ano, mesmo com controles de preços, subsídios a serviços públicos e vasta interferência governamental na formação de preços, incluindo um número considerável, ainda que indefinido, de taxas de câmbio.

    Publicidade

    Não se chega a tamanho grau de desarranjo sem um trabalho sério e persistente de sabotagem das condições macroeconômicas. O governo não registra superávit primário, pelo menos, desde 2011. O Banco Central, por outro lado, mantém as taxas reais de juros em terreno negativo desde o início de 2020.

    Continua após a publicidade

    Somando o risco de calote, por força do desequilíbrio das contas públicas, às taxas negativas de juros, temos fuga de capital, que se materializa num dólar a cada dia mais caro e reservas mais escassas (provavelmente negativas), realimentando a alta de preços e, com ela, recessão e miséria. Dito de outra forma, não há âncora fiscal (controle do gasto) nem monetária (taxas de juros reais positivas) que segurem a inflação.

    Publicidade

    “Na ponta, a inflação argentina roda próximo a 300% ao ano, mesmo com controle de preços”

    Dado que o vencedor do primeiro turno das eleições presidenciais, Sergio Massa, é nada menos do que o ministro da Economia que preside atualmente sobre a enorme desordem econômica, é para lá de duvidoso que tenha condições de corrigir o problema. Não que o segundo colocado, o libertário Javier Milei, as detenha. Além da proposta esdrúxula (e inexequível) de dolarizar a economia argentina, não trouxe qualquer conteúdo minimamente ajuizado sobre como tratar os males do país.

    Publicidade

    O mau desempenho argentino tem efeitos negativos para o Brasil. Trata-se do quarto maior comprador de nossos produtos (cerca de 5% das nossas exportações; 11% na virada do século) e terceiro maior no que respeita às exportações da indústria de transformação (8% hoje, contra 12% há dez anos).

    Continua após a publicidade

    Sua instabilidade ainda contamina o Mercosul, arranjo que há muito se tornou disfuncional e que impede, às vezes como mera desculpa, a busca de integração mais profunda com fluxos internacionais de comércio, em particular com a União Europeia.

    Publicidade

    Infelizmente, a esta altura do campeonato, a principal, senão única, utilidade para a Argentina é servir de espelho sombrio acerca do que pode ocorrer por aqui caso os autodenominados “desenvolvimentistas” sigam dando as cartas na política econômica no Brasil, primeiro minando a responsabilidade fiscal, para depois fazerem o mesmo com a responsabilidade monetária.

    Muito pouco, convenhamos, para um país que um dia correu o risco de ficar rico.

    Publicado em VEJA de 27 de outubro de 2023, edição nº 2865

    Publicidade
    Publicidade

    Matéria exclusiva para assinantes. Faça seu login

    Este usuário não possui direito de acesso neste conteúdo. Para mudar de conta, faça seu login

    Domine o fato. Confie na fonte.

    10 grandes marcas em uma única assinatura digital

    MELHOR
    OFERTA

    Digital Completo
    Digital Completo

    Acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

    a partir de R$ 2,00/semana*

    ou
    Impressa + Digital
    Impressa + Digital

    Receba Veja impressa e tenha acesso ilimitado ao site, edições digitais e acervo de todos os títulos Abril nos apps*

    a partir de R$ 39,90/mês

    *Acesso ilimitado ao site e edições digitais de todos os títulos Abril, ao acervo completo de Veja e Quatro Rodas e todas as edições dos últimos 7 anos de Claudia, Superinteressante, VC S/A, Você RH e Veja Saúde, incluindo edições especiais e históricas no app.
    *Pagamento único anual de R$96, equivalente a R$2 por semana.

    PARABÉNS! Você já pode ler essa matéria grátis.
    Fechar

    Não vá embora sem ler essa matéria!
    Assista um anúncio e leia grátis
    CLIQUE AQUI.