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Agro Global

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Clima: o desafio de uma agenda pop para o agro brasileiro no mundo

Depois de Europa e China, os EUA assumem compromissos importantes na questão climática. O Brasil pode ganhar se abraçar essa agenda.

Por Camila Dias de Sá e Niels Søndergaard (*)
Atualizado em 25 Maio 2021, 18h57 - Publicado em 2 fev 2021, 19h55
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  • Uma das metas centrais do governo Biden é mitigar as mudanças climáticas. O novo presidente convocou uma Cúpula Climática para abril, com o propósito de ampliar a ambição por metas globais de descarbonização no mundo. Os compromissos das grandes potências demonstram como a questão ambiental entrou de vez na agenda econômica global, e certamente irão pautar a Conferência do Clima em Glasgow, em novembro. 

    Em meio século, o Brasil, que antes dependia da importação de alimentos, tornou-se um dos principais exportadores mundiais. Nesse período a agricultura brasileira se expandiu horizontal e verticalmente. O foco em produtividade e competitividade comprova que o nosso agro já é tech. Nossa presença global – em 2020 exportamos 100 bilhões de dólares para mais de 200 países – contribuiu para a segurança alimentar global em um ano de pandemia e amenizou os impactos adversos da mesma na nossa economia, uma vez que o agro é o principal gerador de divisas para o país. A “indústria-riqueza” do Brasil, se não é tudo, é parte fundamental do todo!

    Mas será que o agro brasileiro é pop? Para ser pop no mundo de hoje o nosso agro precisa ir além da exaustiva repetição de que temos o Código Florestal mais restritivo do mundo e que mantemos 66% de nossa vegetação nativa preservada. Na Cúpula de Ambição Climática, organizada no final de 2020 pela ONU para marcar os cinco anos do Acordo de Paris, o Brasil ficou de fora pois não foi capaz de apresentar um plano ambicioso de metas de redução de emissões de gases de efeito estufa e tampouco compromissos críveis para conter o desmatamento.

    Com a participação online de 77 chefes de estado, foram anunciados novos compromissos climáticos; a China se comprometeu a chegar à neutralização das suas emissões de carbono em 2060. O presidente eleito dos EUA, Joe Biden, anunciou a intenção de fazer o mesmo por volta de 2050. Com o congresso controlado pelos democratas é certo que recursos significativos serão destinados ao combate às mudanças climáticas nos EUA.

    A União Europeia, por sua vez, já embarcou em forte transição para uma economia de baixo carbono, incluindo o setor agrícola. Neste caso, estão previstas mudanças internas substanciais, mas também a imposição de fortes restrições às importações de produtos associados ao desmatamento.

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    Neste cenário em que a pauta climática passa a ser expressão de interesses geopolíticos e dita cada vez mais o comportamento dos consumidores ao redor do mundo, novos formatos de interação entre países e novas formas de fazer negócios começam a brotar. Nesse contexto, cabe ao setor privado dialogar com a sociedade civil, se posicionando de forma assertiva contra desmatamentos ilegais e crimes ambientais. Cabe sobretudo ao setor privado executar e comprovar avanços na agenda ESG. Especialmente no caso brasileiro o “E” (meio ambiente) passou a ser mandatório, uma vez que detemos o ecossistema mais biodiverso do planeta, com altas taxas de desmatamento ilegal, dois temas sobre os quais os olhos do mundo estão permanentemente ligados no Brasil, para o bem e para o mal.

    Iniciativas como as moratórias da soja e da carne, iniciadas nos anos 2000, se desdobraram em processos de monitoramento, rastreabilidade e certificação de cadeias produtivas, com resultados comprovados. Estudo publicado na revista Nature Food em dezembro passado mostrou que a moratória evitou o desmatamento de cerca de 18 mil quilômetros quadrados de floresta; uma área quase do tamanho do Sergipe. Alguns traders de grãos e frigoríficos assumiram o compromisso de construir cadeias de suprimento 100% livres de desmatamento e conversão ao longo da segunda metade desta década.

    Para tanto, além do emprego de tecnologia de georreferenciamento, monitoramento via satélite, chipagem e brincagem do gado, sistemas de blockchain, desenho de mapas de risco e seu compartilhamento, outras ações podem incluir os produtores em um trilho de produção sustentável. Tais ações pressupõem um trabalho em rede entre distintos elos da cadeia produtiva e o engajamento dos pecuaristas de maneira a obter um pacote tecnológico (insumos e genética) e assessoria técnica, ambiental e jurídica que suportem uma transição de pastos de baixa produtividade para alta produtividade, intensificação produtiva, restauração florestal e regularização. Os planos tornados públicos pelos frigoríficos preveem ainda ações que melhorem o acesso ao financiamento para pequenos proprietários.

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    Em muitas áreas do bioma amazônico o avanço da pecuária foi caracterizado por manejo inadequado levando a baixos retornos econômicos e altas perdas ambientais. Pressupondo um preço de 100 dólares por tonelada de carbono (CO2 equivalente), o que já é a realidade em alguns países, o prejuízo ambiental de desmatar um hectare de floresta tropical emitindo 500 toneladas de CO2 é da ordem de 50 mil dólares, ou seja, mais de R$ 250 mil/ha no câmbio atual. Se o mercado de carbono funcionar direito, podem surgir grandes oportunidades para o produtor que estiver disposto a abrir mão de conversão legal ou restaurar áreas degradadas. 

    O pagamento por serviços ambientais depende em larga medida do desenvolvimento de um sistema internacional de comercialização de emissões, que permita que países que já cumpriram as suas metas voluntárias de redução de emissões possam vender as suas reduções adicionais para países com dificuldade de reduzir as suas emissões. O mercado global de carbono é tratado no Artigo 6 do Acordo de Paris de 2015, porém, a sua estrutura ainda não foi definida.  

    O Brasil tem imenso potencial para se beneficiar destes mecanismos. Recentemente o Congresso aprovou a Política Nacional de Pagamento por Serviços Ambientais, em raro momento de consenso nessa área. A possibilidade de entes privados transacionarem serviços ambientais entre si é um importante avanço na agenda agroambiental, e a lei promete trazer segurança e clareza, importantes no longo prazo para investimentos em projetos de sequestro de carbono. Porém, para o Brasil entrar efetivamente neste mercado, é imprescindível que o setor público cumpra com a sua responsabilidade de eliminar o desmatamento ilegal. 

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    Na agenda ESG a proteção do meio-ambiente e a produção agropecuária devem ser pensadas como parte da mesma estratégia de desenvolvimento. Enquanto o agronegócio está acostumado ao preço da arroba de boi ou da saca de soja, poucos têm noção das possibilidades de ganhos econômicos como a redução de emissões.

    Os avanços produtivos desde a revolução industrial demonstram como os modelos de produção de sucesso nunca estagnaram num dado patamar tecnológico, mas sempre abraçaram a inovação e as transformações em curso. O combate às mudanças climáticas inevitavelmente definirá o desenvolvimento de todos os setores da economia global ao longo deste século. 

    O Brasil, por meio das suas tecnologias e conhecimento na área agroambiental possui todas as condições para se beneficiar da transição para uma agricultura de baixo carbono. Práticas como Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF), recuperação de pastagens e plantio direto já são parte da vida do produtor rural, e os seus benefícios amplamente reconhecidos. A “carne carbono neutro”, que incentiva a adoção de práticas sustentáveis,  já é uma opção disponível para o consumidor brasileiro. Todos esses são exemplos dos primeiros passos de um movimento que poderá trazer grandes benefícios para a agricultura brasileira, elevando a eficiência da produção e garantindo o seu acesso aos mercados globais. Com essas transformações, certamente o nosso agro seria pop no mundo!

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    (*) Camila Dias de Sá e Niels Søndergaard são pesquisadores senior do Insper Agro Global.

     

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