Peço licença para sair um pouco do tom usual deste blog para compartilhar um relato pessoal. Uma história de bem (bem!) antes da popularização do app Pokemón Go.
Tinha 11 anos de idade, em 1996, quando ouvi falar de Pokémon pela primeira vez. Sempre fui fã de videogame e, à época, li em uma revista sobre o lançamento de um jogo japonês no qual se capturavam esses bichos imaginários para usá-los em batalhas. O que saltou aos meus olhos: tratava-se de um RPG. Eu era fã de role-playing game, em especial dos da linha D&D. Fiquei curioso e quis experimentar o tal Pokémon. Porém, não tinha um Game Boy, o console portátil para o qual a primeira versão do título, lançada naquele ano (antes de existir o famoso desenho animado de Ash, Pikachu e cia.), foi desenvolvido. E, para dificultar, só existia a edição japonesa do game. Como uma típica criança curiosa de 11 anos de idade, esses obstáculos não foram suficientes para que eu desistisse. Foi aí que Pokémon ajudou a despertar o meu interesse pelo mundo da tecnologia.
Próximo ao condomínio de prédios onde eu morava havia uma loja de informática, cujo dono, um rapaz que se aventurava como hacker, adorava responder às minhas perguntas sobre computadores. Alguns meses depois de ter lido sobre Pokémon, questionei-o sobre como poderia arranjar o tal jogo. Afinal, uma vez ele já tinha me auxiliado a conseguir uma cópia do clássico Doom. Foi aí que ele me contou de um emulador de Game Boy, que funcionava no sistema operacional Dos, em linguagem de programação C (chamava VGR). A sorte: ele tinha uma versão do arquivo, que salvou em um disquete e me deu de presente. O segundo passo era arranjar o arquivo do game (sim, pirateado; mas, vale lembrar, eu era uma criança atrás de diversão, somente).
A internet tinha chego há pouco tempo em minha casa. Era discada, claro, e rodava, bem devagar, em um Pentium (o “586”) que meu pai havia comprado há pouco. A sorte: por falta de espaço em outros cômodos do apartamento, o PC ficava no meu quarto. Meus pais – como eram os pais dos anos 90 – não gostavam que eu “perdesse tempo” jogando videogame. Contudo, eles não precisavam saber que eu planejava baixar um arquivo pirata do primeiro Pokémon no computador “usado para trabalho”.
Esperava a madrugada chegar para me conectar (ao custo de somente um pulso de ligação) e entrar em fóruns de hackers (na maioria, povoados por crianças curiosas, como eu) na internet. Em um desses espaços, consegui o arquivo do jogo, que levou duas madrugadas para ser baixado – se não me falha a memória. Instalei o emulador no Pentium, deixei-o acessível por comandos de programação no sistema operacional Dos (meus pais jamais iam descobrir como chegar até ele) e escolhi o “dragãozinho” Charmander para começar minha aventura.
(Todo o processo até conseguir o game levou mais de um ano. Porém, ainda só existia a versão japonesa. Aí, apelava a “detonados”, como chamavam os guias para os jogos eletrônicos, em inglês, que descolava online, para prosseguir no Pokémon asiático. Isso até me deparar, alguns meses depois, com o Red, a esperada edição americana.)
A partir dessa experiência, passei a mergulhar em fóruns de hackers. Foi, então, que descobri, por exemplo, como usar um código para abrir o driver de CD do PC de amigos, à distância, sem eles saberem – na verdade, só salvava um arquivo “automatizado” no computador alheio e fingia que realizava os comandos de meu apartamento. E outros truques populares dos interessados em informática (termo que nem se usa mais) dos anos 90. Ou seja, devo muito a Pokémon por ter despertado em mim o gosto pela tecnologia.
Por isso, até, acho graça quando ouço que tem uma garotada usando técnicas para trapacear no novo (e ultra popular) Pokémon Go. Não duvido que a brincadeira possa despertar em jovens, como foi comigo, o fascínio pelo universo tecnológico.
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