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Sempre a mesma coisa: Por que o Nobel continua a ignorar mulheres cientistas?

Apenas 42 dos 121 prêmios foram concedidos a pelo menos uma mulher

Por Lorena Fernández Álvarez, Anabel Forte Deltell, Conchi Lillo, Raquel Villacampa Gutiérrez  e Teresa Valdés-Solís Iglesias para The Conversation
15 out 2024, 13h58
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  • Em 1901, os prêmios estabelecidos por Alfred Nobel em seu testamento foram concedidos pela primeira vez nas categorias de Física, Química, Fisiologia ou Medicina, Literatura e Paz. Embora a primeira vencedora, Marie Skłodowska-Curie, tenha recebido o prêmio em 1903, a história do Nobel tem uma grande dívida com as mulheres.

    Uma rápida análise quantitativa revela que apenas 42 dos 121 prêmios (entre 1940 e 1942 eles não foram concedidos devido à ocupação da Noruega pelos nazistas) foram concedidos a pelo menos uma mulher.

    Se nos concentrarmos nos prêmios científicos, apenas treze mulheres (5,7% do total) receberam o prêmio de Fisiologia ou Medicina, oito (4,1%) o prêmio de Química e cinco (2,2%) o prêmio de Física.

    E isso não ocorre apenas nos primórdios do prêmio. Em 2016 e 2017, por exemplo, não tivemos nenhuma mulher vencedora (nem em ciências nem nas outras categorias). Este ano, o balanço (em ciências) é de sete homens contra nenhuma mulher.

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    Porcentagem de mulheres e homens que receberam um Prêmio Nobel nas diferentes categorias.
    Os autores com dados do Prêmio Nobel, CC BY-SA (The Conversation/Reprodução)

    Mulheres cientistas esquecidas pelo Nobel

    Se a análise for qualitativa, há várias histórias de grandes cientistas mulheres que foram esquecidas ou ignoradas. Por exemplo, a física Lise Meitner (1878-1968), que, junto com Otto Hahn, descobriu a fissão nuclear. Ela mesma explicou suas descobertas sobre radioatividade na revista Nature, mas só Hahn ganhou o Prêmio Nobel de Química. Além disso, ele sequer a mencionou ao recebê-lo, embora ela tenha recebido 49 indicações para o Nobel, em comparação com 39 para Hahn.

    Até mesmo Marie Skłodowska-Curie (1867-1934), pioneira no campo da radioatividade, que foi a primeira mulher a ganhar um Prêmio Nobel e a primeira pessoa a receber dois prêmios em áreas diferentes (Física e Química), quase perdeu o primeiro prêmio, pois inicialmente ele havia sido concedido apenas ao seu marido. Se Pierre Curie não tivesse enfrentado a Academia e dito que ou eles dariam o prêmio para os dois ou para ninguém, estaríamos falando de um final diferente (na verdade, para o Prêmio de 1903, ela teve apenas três indicações, em comparação com oito para Pierre).

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    Prêmios Nobel recebidos por homens (círculos cinza) e por mulheres (círculos laranja).
    Nature — (The Conversation/Reprodução)

    A controvérsia deste ano

    Este ano nos encontramos em uma situação semelhante. Em um tuíte parabenizando Victor Ambros, ganhador do prêmio de Medicina ou Fisiologia, a própria Academia Sueca reconheceu o papel de Rosalind Lee, sua esposa e colaboradora, no trabalho seminal do premiado.

    Seria Rosalind Lee uma nova vítima do machismo dos prêmios? Ou ser a primeira autora do trabalho era apenas uma posição em uma lista de autores sem grande importância? As reações não demoraram a chegar. O que é certo é que a posição de Rosalind Lee como primeira autora no artigo mencionado acima é anedótica, uma vez que seu trabalho e colaboração vão muito além desse lugar na autoria.

    O que é importante nesse caso é que Lee é coautora de uma proporção muito significativa dos artigos do novíssimo ganhador do Nobel, e é esse trabalho, essa autoria intelectual e experimental, que é desdenhada por ela não estar incluída entre os ganhadores do prêmio. Especialmente se considerarmos que a forma como a ciência é feita e que os avanços científicos há muito tempo não dependem apenas de uma única pessoa ou mente brilhante, mas são o produto de um trabalho coletivo, muitas vezes graças a grupos multidisciplinares. Isso não parece ser levado em conta na concessão de um Prêmio Nobel.

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    A ordem e a importância dadas à autoria de um artigo científico dependem da área de pesquisa à qual ele pertence. Assim, há áreas, como a matemática, em que é comum que os autores assinem em ordem alfabética.

    Na maioria das vezes, porém, a ordem indica outra coisa, incluindo no início aqueles que mais se dedicam ao desenvolvimento experimental do trabalho – seus verdadeiros arquitetos -, seguidos por aqueles que estão menos envolvidos no desenvolvimento do trabalho, supervisores do trabalho, especialistas em algumas das técnicas usadas ou pessoas que lidam com aspectos muito específicos. No fim está o pesquisador principal, que é o responsável final por todo o artigo, por garantir o financiamento do projeto e a inspiração para o trabalho.

    Como funciona o processo de seleção?

    Exceto no caso do Prêmio Nobel da Paz, que tem um procedimento especial, cada categoria (Física, Química, Fisiologia ou Medicina, Literatura e Economia) é designada a um comitê que, em setembro, envia convites confidenciais a cerca de 3 mil pessoas qualificadas em cada área para que proponham nomes (elas não podem se nomear). Isso inclui professores universitários, pessoas que fazem pesquisas na área e ex-prêmios Nobel, que têm até 31 de janeiro do ano seguinte para receber as indicações.

    Este ano, a composição dos comitês foi a seguinte: Física (seis homens e duas mulheres), Química (seis homens e duas mulheres) e Fisiologia ou Medicina (cinco homens e uma mulher).

    Em fevereiro, cada comitê avalia as indicações recebidas (as recebidas após 31 de janeiro são mantidas para a edição do ano seguinte). Normalmente, são recebidos cerca de 250 a 350 nomes, pois eles tendem a ser repetidos pelas pessoas que os indicaram. Uma lista mais curta é compilada entre fevereiro e maio e encaminhada às pessoas que prestam consultoria de forma permanente e que foram especialmente recrutadas por seu conhecimento de indicações específicas.

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    Depois, entre junho e agosto, o comitê prepara o relatório com suas propostas, que são enviadas à Academia em setembro. Em outubro, a Academia escolhe os prêmios por maioria simples de votos e os torna públicos. Os Prêmios Nobel são entregues em 10 de dezembro, dia da morte de Alfred Nobel.

    Em que ponto as mulheres são ignoradas?

    Depois de ter apenas uma mulher laureada em 2021, Göran Hansson, secretário-geral da Real Academia Sueca de Ciências, foi questionado se eles haviam pensado em incluir cotas de gênero ou étnicas, ao que ele respondeu que não, aludindo à meritocracia tradicional e que as contribuições mais importantes serão recompensadas independentemente de gênero ou etnia.

    Mas o que acontece quando você se move em um sistema endogâmico? Analisando a composição dos comitês e o arquivo de indicações passadas (as indicações são mantidas confidenciais por 50 anos), somos confrontados com o que é conhecido como o old boys club (algo como o “Clube do Bolinha”.

    Um sistema endogâmico informal que, não necessariamente de forma intencional, nomeia pessoas de seu círculo social, às vezes deixando de fora mulheres e grupos minoritários. Em resumo, as mulheres não estão presentes porque não são tão visíveis. E para que alguém indique você, é preciso que você seja visto. E por que não somos vistas? Por um lado, porque o talento feminino está se perdendo através do leaky pipeline.

    Mas não é só isso: o fato de que os cuidados domésticos ainda recaem principalmente sobre as mulheres significa que elas estão desaparecendo dos círculos sociais do trabalho. Uma cerveja depois do horário de trabalho, um seminário ou uma reunião em um horário tardio ou longe do local de residência – em resumo, falta de tempo – impede que elas sejam visíveis nesse “clube de meninos”.

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    E quanto aos demais prêmios?

    Um estudo examinou em 2021 as disparidades de gênero nos 141 prêmios internacionais de pesquisa mais prestigiados do mundo (incluindo os Prêmios Nobel, a Medalha Fields de matemática e o Prêmio Robert Koch de ciências biomédicas). Os resultados mostraram que:

    • De 2001 a 2020, esses prêmios foram concedidos a 2.011 homens e 262 mulheres;
    • A proporção de mulheres aumentou de uma média anual de 6% entre 2001 e 2005 para 19% entre 2016 e 2020;
    • Quando o número de professoras titulares é levado em consideração, a diferença de gênero permanece altamente desproporcional em ciências da vida, ciência da computação e matemática.

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    Porcentagem de prêmios científicos concedidos a mulheres (laranja claro) e proporção de mulheres professoras universitárias (laranja escuro). Nature — (The Conversation/Reprodução)

    Embora o estudo não tenha examinado as causas do preconceito de gênero, ele argumenta que as mulheres não estão recebendo menos prêmios por causa da qualidade ou quantidade de suas pesquisas: em vez disso, isso se deve ao preconceito implícito, junto à falta de esforços proativos para abordar as desigualdades na ciência.

    As mulheres têm taxas de publicação e de citação comparáveis às dos homens, mas tendem a ter carreiras mais curtas e a publicar menos artigos como primeira ou última autora, de acordo com outros estudos.

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    Portanto, a hipótese de que, daqui a 30 anos, quando as mulheres estiverem em posições de responsabilidade como líderes de grupos de pesquisa por mais tempo e suas ideias e projetos tiverem demonstrado uma contribuição significativa para o desenvolvimento da sociedade, elas receberão os prêmios cai por terra. Cai porque as mulheres estão ouvindo essa mesma explicação há mais 30 anos sem que nada mude.

    O fato de que os homens brancos estão super-representados entre os laureados em ciências nos diz que, como sociedade, estamos perdendo uma ampla gama de novas ideias e descobertas que dependem de uma diversidade de ideias e origens. Além disso, talvez devêssemos reconsiderar a prática de conceder prêmios individuais, quando a ciência é um empreendimento coletivo.

    Dizem que os prêmios Nobel são para aqueles que veem o que as outras pessoas não veem… Mas é difícil vencer quando quem está olhando não te vê.

    Esta é uma republicação de The Conversation sob Creative Commons license. Leia o artigo original .

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