Os ecossistemas não receberam esse nome à toa. Cada local na Terra estabeleceu uma rede de interação entre seres vivos que, após milênios de tentativas, encontrou um equilíbrio quase perfeito. Agora, a atividade antrópica coloca esse balanço em perigo e gera prejuízos naturais e financeiros que ultrapassam os 400 milhões de dólares anualmente.
Os mediadores desse estrago são as chamadas espécies alienígenas. Não as que vieram de outro planeta, mas as que se estabelecem em biomas ou regiões diferentes daquela de origem. De acordo com um levantamento da Plataforma Intergovernamental sobre Biodiversidade e Serviços Ecossistêmicos (Ipbes), mais de 37 mil desses seres já foram introduzidos pelos seres humanos e, a cada ano, pelo menos 200 outros são espalhados por aí.
Nem todas as espécies alienígenas são um problema. Sempre que um novo microrganismo, planta ou animal é introduzido em um ecossistema, essa rede precisa buscar um equilíbrio novamente. Às vezes, isso não é difícil e, em algum tempo, aquele ser passa a conviver com os outros em absoluta harmonia. Em grande parte das vezes, no entanto, a presença desse novo indivíduo coloca alguns dos outros em risco, podendo causar mudanças profundas na paisagem e na biodiversidade – essas são as chamadas espécies invasoras.
“As espécies invasoras são um fator importante em 60% das extinções em massa e a única causa de 16% delas”, afirmou em nota o co-presidente do comitê responsável pelo relatório do Ipbes, Anibal Pauchard. O tamanho do impacto assusta: até agora, 218 espécies foram responsáveis por mais de 1.200 extinções locais.
Engana-se quem pensa que as consequências são distantes. Quase 80% dos impactos causados por espécies invasoras podem causar mudanças que atingem os seres humanos, principalmente por meio da modificação da cadeia alimentar. Além disso, 85% dos impactos podem afetar a qualidade de vida, mediante, por exemplo, o espalhamento de novas doenças.
Alguns invasores são mais disseminados. O jacinto-de-água, por exemplo, é o mais comum e pode diminuir a presença de tilápia em lagos ao redor do mundo. Um arbusto de flores chamado lantana camara e o rato preto também figuram no pódio das pragas mais disseminadas.
Ainda há esperança. No ritmo atual, que pode ser progressivamente potencializado pelo aquecimento global e pelas mudanças climáticas, a disseminação dessas espécies e o prejuízo anual podem crescer de maneira acelerada, mas se medidas efetivas forem tomadas isso ainda pode ser contido.
“A prevenção é, em absoluto, a melhor e mais econômica opção, mas a erradicação, a contenção e o controle também são eficazes em contextos específicos’, afirma Pauchard. “A restauração dos ecossistemas também pode melhorar os resultados das ações de gestão e aumentar a resistência dos ecossistemas a futuras espécies invasoras.”
Por enquanto esse problema tem sido subestimado e, embora 80% dos países tenha programas para lidar com essas pragas, apenas 17% têm leis ou regulações específicas para lidar com essa questão. Contudo, no ano passado, durante a 15% conferência da Convenção Sobre Diversidade Biológica das Nações Unidas os países concordaram em trabalhar para redução a introdução dessas espécies em 50% até 2030. “Esse é um compromisso vital, mas muito ambicioso”, afirma em nota a secretária-executiva do Ipbes, Anne Larigauderie.