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A Amazônia em alerta vermelho

Uma nova pesquisa aponta quais seriam os efeitos — drásticos — do aquecimento global no bioma mais diverso do planeta

Por Jennifer Ann Thomas Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 1 mar 2019, 07h00 - Publicado em 1 mar 2019, 07h00

Um estudo realizado pelo Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam), em parceria com o Woods Hole Research Center, organização americana de pesquisas científicas, é a mais nova evidência de que o aquecimento global resultará em efeitos catastróficos para a região que abriga o bioma de maior diversidade em todo o mundo. Estima-se que, nas últimas décadas, a Floresta Amazônica tenha registrado aumento de 0,5 grau em sua temperatura — o que não levou ainda a estragos mais sérios. No entanto, a pesquisa divulgada pelo Ipam na quarta-feira 27 indica que, caso nada ou pouco seja feito para reverter ou mitigar as mudanças climáticas, a escalada do termômetro deverá ser mais intensa daqui para a frente. No cenário de maior gravidade, a elevação ultrapassará 3 graus na região que representa nada menos que 60% do território brasileiro — com consequências ainda pouco previsíveis, do ponto de vista científico, na flora e na fauna amazônicas.

Considerando as alterações no clima daquele hábitat até o ano de 2100, o estudo desenhou dois cenários (veja o quadro na pág. ao lado). O primeiro, menos devastador, levou em conta que seria posta em prática ao menos uma parcela das políticas ambientais propostas no Acordo de Paris — assinado em 2015 por 195 países, inclusive o Brasil, com o intuito de frear o aquecimento. Mesmo nesse cenário, choveria menos do que o necessário para manter as atuais flora e fauna de 36% das reservas da região. Na segunda conjectura, avaliou-se quais seriam as consequências caso nenhuma das medidas de política de conservação ambiental seja adotada. Nessa hipótese, a floresta ficaria mais próxima de virar sertão: não choveria o suficiente em mais da metade das áreas sob proteção ambiental — que se transformariam gradualmente em algum outro tipo de bioma.

Nos dois cenários — num, em maior grau; noutro, em menor —, os animais perderiam fontes de alimento e teriam de se adaptar a um hábitat remodelado. Na verdade, já é possível sentir alguns efeitos do que poderá ocorrer. A formiga tanajura, por exemplo, um dos símbolos amazônicos, costuma sair do formigueiro perto dos períodos de chuva. Como a precipitação na Bacia Amazônica já é 18% menor do que era há cinquenta anos, a espécie tem estendido a sua reclusão — o que provoca um efeito cascata no conjunto da floresta. “Além de prejuízo para a dieta de predadores, há impacto no modo de vida de culturas indígenas”, diz a geógrafa Ane Alencar, diretora de ciência do Ipam. “A tanajura, por exemplo, é uma das principais fontes de proteína de alguns povos. Logo, mudanças climáticas drásticas afetariam a dieta dos índios e a maneira como eles se alimentam”, diz.

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Se não forem extintas, espécies de árvores também precisarão se adequar. Explica o ecólogo e engenheiro florestal Paulo Brando, do Ipam e do Woods Hole Research Center: “As reações da flora são múltiplas. Diante das secas iniciais, as árvores precisarão estocar mais água no tronco e produzir raízes novas. No caso mais extremo, elas reduzem a transpiração das folhas e derrubam galhos. Só que, ao fazerem isso, perdem proteção contra a radiação solar, entre outras consequências negativas”. Na prática, Brando destaca que ainda não é possível sequer ter certeza de quais plantas poderão sobreviver.

O que seria necessário mudar para evitar tantos danos? No fundo, o que ocorre, e pode ocorrer, na Amazônia não está ligado somente a problemas da floresta em si, mas também a interferências que acontecem ao redor dela. A agropecuária, ao menos aquele naco ­irresponsável, é o principal agente no Brasil do despejo de gases de efeito ­estufa na atmosfera e, em razão disso, das mudanças climáticas amazônicas — 71% do total, quando se somam as emissões indiretas, por desmatamento, e as diretas, pelo metano proveniente do rebanho bovino. Se fosse um país, o ruralismo nacional ocuparia a oitava posição no ranking de maiores emissores de gases de efeito estufa do planeta.

Caso se queira conter o aquecimento na Amazônia, será necessário, portanto, enfrentar a devastação. Foi o que fizeram várias nações, como demonstrou um estudo divulgado pela Universidade de East Anglia, na Inglaterra. Segundo o levantamento, dezoito países ricos — só um deles, os Estados Unidos, não era europeu — foram efetivos na aplicação de políticas sustentáveis entre 2005 e 2015, período no qual apresentaram redução na emissão de CO2. O Brasil bem que poderia seguir esse bom exemplo, tanto para manter-se como uma potência agropecuária quanto para continuar sendo também a casa da maior biodiversidade do planeta.

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Publicado em VEJA de 6 de março de 2019, edição nº 2624

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