Condenado a 27 anos de prisão pela Justiça ao ser apontado como um dos maiores traficantes de armas do país e do mundo, João Filipe Barbieri, 31 anos, saiu tranquilamente pela porta da frente da Penitenciária Lemos Brito, dentro do Complexo Penitenciário de Gericinó, mais conhecido como Bangu 7 (Zona Norte do Rio), no dia 18 de novembro de 2020. Seria uma situação comum caso ele tivesse cumprido a íntegra da sentença que lhe foi imposta, mas o Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2) descobriu, nesta terça-feira, 9, que ele fraudou o documento de soltura, que teria sido emitido pela 8ª Vara Criminal Federal do Rio.
Barbieri estava preso desde 2017 e é enteado de Frederick Barbieri, o “Senhor das Armas”, que foi preso nos Estados Unidos por tráfico internacional de fuzis e munições. Segundo as investigações do Ministério Público Federal (MPF) do Rio, entre 2014 e 2017, Frederick e João Filipe fizeram 75 importações de armamentos sem obedecer às exigências legais. As declarações de importação informavam que os produtos enviados eram aquecedores e bombas d’água para piscinas. No entanto, eles usavam apenas a carcaça dos produtos para esconder armas de fogo, acessórios e munições de uso restrito.
De acordo com as estimativas do MPF, nesses quatro anos, os condenados introduziram no Brasil cerca de 297 mil munições e cerca de 1.043 fuzis com carregadores. As armas eram compradas por valores entre 2 500 dólares e 3 500 dólares nos EUA e revendidas entre 37 500 reais e 53 000 reais no Brasil. Frederick, que tem dupla nacionalidade, enviava as cargas para o Rio de Miami. João Filipe, por sua vez, era o chefe da quadrilha no Brasil e o responsável direto pela distribuição do arsenal entre as facções criminosas que atuam no estado.
Além deles, a mulher de Frederick e outros 13 réus foram denunciados pelos crimes de organização criminosa, tráfico internacional e comércio ilegal de armas de fogo, munições e acessórios de uso restrito.
Um dos condenados pela Justiça Federal no âmbito desta mesma denúncia valeu-se do mesmo recurso para deixar o Instituto Penal Vicente Piragibe, também no Complexo de Gericinó, um mês antes, no dia 9 de outubro de 2020: João Victor Silva Roza usou o alvará de soltura fraudado, que também teria sido supostamente expedido pela 8ª Vara Criminal Federal do Rio.
Em nota, a Secretaria do Estado de Administração Penitenciária (Seap), que administra as prisões fluminenses, admitiu a soltura dos dois e disse que abriu uma investigação para apurar a situação da libertação dos dois mediante documentos fraudados. “ A secretaria estabeleceu um novo protocolo de dupla checagem de documentos eletrônicos, com objetivo de evitar fraudes, relacionadas ao envio de comunicações judiciais falsa”, diz o comunicado.
A trama surrealista foi descoberta por meio da defesa de um dos acusados, ainda preso, que se manifestou nos autos do processo na 2ª instância – o TRF-2 – informando que Barbieri e Roza estariam soltos por meio dos documentos.
Em ofício expedido nesta terça-feira, 9, A 8ª Vara Criminal Federal negou que tivesse emitido os alvarás e indicou o documento do qual as fraudes teriam sido feitas.
O desembargador Marcello Granado, que é relator do processo no TRF-2, expediu mandados de prisão contra os dois condenados. Eles estão foragidos da Justiça. O magistrado determinou também que o MPF e a Polícia Federal investiguem a fraude dos documentos, assim como a soltura dos condenados. Procuradas, as defesas de ambos não foram localizadas para comentar a fraude dos documentos.