A poucos dias do Natal, o governador do Rio de Janeiro, Cláudio Castro, católico praticante e cantor gospel nas horas vagas, anda às voltas com a Operação Sétimo Mandamento — o “Não roubarás” da Bíblia. Empreendida pela Polícia Federal, a ação quebrou os sigilos fiscal, bancário e de mensagens eletrônicas de Castro, além de impetrar um mandado de busca e apreensão contra três pessoas da administração estadual, uma delas seu irmão de criação, Vinícius Sarciá Rocha — por ele nomeado presidente do Conselho de Administração da Agência de Fomento do Estado do Rio de Janeiro (AgeRio), em cuja casa foram achados 128 000 reais e pouco mais de 7 500 dólares em dinheiro vivo (quantia que, de acordo com a defesa, está declarada no imposto de renda). A Sétimo Mandamento é um desdobramento da Operação Catarata, deflagrada pela Polícia Civil e pelo Ministério Público estadual em 2019 para investigar a existência de crimes de organização criminosa, peculato, corrupção e lavagem de dinheiro em instituições filantrópicas fluminenses entre 2017, quando Castro era vereador, e 2020, época em que servia como governador interino, após o afastamento de Wilson Witzel.
O grupo, segundo a PF, recebeu propinas que variavam de 5% a 25% dos valores dos contratos na área de assistência social, que totalizam mais de 70 milhões de reais. A investigação inicial levou à prisão de Marcus Vinícius de Azevedo, ex-assessor de Castro, que viria a firmar um acordo de delação premiada. Nesse ponto, as investigações passaram para a alçada da PF e da Procuradoria-Geral da República, em razão do alto cargo do alvo principal. Funcionário no gabinete do então vereador e sócio de uma empresa suspeita de desviar recursos de uma instituição monitorada pelo já vice-governador Castro, Azevedo citou o que seriam atividades ilícitas do ex-patrão. Em seguida, o MP divulgou um vídeo mostrando Castro chegando a um shopping da Zona Oeste carioca, com uma mochila, para se encontrar com o dono de outra empresa do suposto esquema, o que levantou suspeitas de pagamento ilícito.
As evidências levaram a PGR a pedir ao Superior Tribunal de Justiça a abertura de inquérito contra o governador — pedido aceito em abril e ampliado agora com a Operação Sétimo Mandamento. Em nota, o governo do Rio disse que a operação “causa estranheza e profunda indignação, já que não traz nenhum novo fato à investigação”. Governador por acaso, Castro tem como marca de seu mandato o hábito de pisar em ovos para manter seu principal alicerce, o clã Bolsonaro, sem fechar as portas ao governo federal, de quem depende financeiramente. Com o inquérito criminal se aprofundando, vai ter de caminhar ainda com mais cuidado no terreno minado das suas relações.
Publicado em VEJA de 22 de dezembro de 2023, edição nº 2873