Alguns dos generais da reserva que comandam ministérios no governo de Jair Bolsonaro fizeram parte da estrutura das Forças Armadas durante os governos do regime militar que começou com um Golpe de Estado há exatos 55 anos, no dia 31 de março de 1964.
Na data, o general Augusto Heleno Ribeiro, de 71 anos, ainda era um adolescente de 17. O ministro-chefe do Gabinete Institucional (GSI), um dos principais conselheiros do presidente, estava prestes a completar o ensino médio quando os militares tomaram o poder. “Eu era aluno do segundo ano Científico do Colégio Militar do Rio. Vibrei com a queda de João Goulart, um cancro na política brasileira”, relatou o general Heleno.
A exemplo de Bolsonaro, o ministro do GSI não chama a intervenção militar de golpe. Ao seu ver, houve um movimento para conter o avanço do comunismo no país.
No começo da década de 1970, já na casa dos 20 anos, o atual ministro se tornou instrutor na Academia Militar das Agulhas Negras, no Rio de Janeiro, onde se formaram vários dos membros do atual governo, como o ministro-chefe da Secretaria de Governo, Carlos Alberto dos Santos Cruz, em 1972, o vice-presidente Hamilton Mourão, em 1975, e o próprio Jair Bolsonaro, em 1977.
No ano da formatura de Bolsonaro, Heleno, capitão recém-promovido, assumiu o cargo de ajudante de ordens do então ministro do Exército, Sylvio Frota, que à época tentou se impor como sucessor do presidente Ernesto Geisel e foi demitido. Apoiadores de Frota ensaiaram um levante, mas Heleno afirma que sua participação no projeto de rebelião foi “irrelevante”. “Tinha apenas 30 anos”, argumentou o general da reserva.
Já Santos Cruz, que tem gabinete no quarto andar do Palácio do Planalto, tinha 12 anos em 1964. O Exército havia acabado de exterminar as guerrilhas na Amazônia quando, entre 1975 e 1977, ele concluiu os cursos de comando e guerra na selva. Questionado sobre sua experiência na ditadura, o ministro da Secretaria do Governo se afastou de posições políticas e disse que não foi “frotista” nem “castelista”, em referência aos segmentos militares de “linha-dura” em oposição aos mais moderados.
“Não faço parte de grupos estereotipados. Fui ser militar porque tinha atração pela carreira e era uma opção profissional que eu tinha possibilidade de acessar”, contou.
Pouco participativos
Entre os ministros militares de Bolsonaro que já eram nascidos em 1964, o comandante da pasta de Defesa, Fernando Azevedo e Silva, de 65 anos, foi um dos que menos se envolveu com o regime militar. Ele tinha 10 anos quando o Exército derrubou Jango. É outro que nega ter participado de atividades políticas do governo dos generais. Segundo Azevedo e Silva, durante o regime ele se dedicou “exclusivamente” à profissão militar, na Brigada Paraquedista do Rio.
O titular da Ciência e Tecnologia, Marcos Pontes, de 56 anos, também conviveu pouco com os 21 anos de ditadura. Ele tinha um ano quando ocorreu o golpe e apenas no último ano do período militar, em 1984, formou-se em Tecnologia Aeronáutica na Academia da Força Aérea. Militares mais novos, como o ministro Tarcísio Gomes, da Infraestrutura, não eram nascidos em 1964.
Assunto recorrente
A cada quatro pronunciamentos feitos por Jair Bolsonaro durante sua passagem pela Câmara dos Deputados, pelo menos um mencionou o regime militar. Das 901 falas catalogadas entre 2001 e 2018, período em que o presidente ocupou uma cadeira de deputado federal, 252 mencionam esse período histórico, cerca de 28%.
Geralmente em tom nostálgico, os discursos dão crédito aos militares por reprimir a oposição de esquerda e negam que tenham sido cometidas violações de direitos humanos, o que está em desacordo com o consenso historiográfico atual. Em algumas de suas falas, Bolsonaro chegou a exaltar torturadores conhecidos do regime, como o coronel Carlos Alberto Brilhante Ustra.
(com Estadão Contéudo)