Natureza cinco-estrelas
Nascido nas reservas de safáris da África, o glamping — mistura de “camping” com “glamour” — espalha suas tendas de alto luxo por todos os continentes
Para muita gente, acampar é sofrer montando e desmontando barraca, tentando se livrar da areia onipresente, passando calor e dividindo banheiro (quando há) com desconhecidos. Incômodos como esses, porém, estão longe do conceito do glamping — palavra que une “camping” a “glamour” —, que oferece a quem se dispuser a pagar muito bem um contato com a mãe natureza cercado de luxos. Dono de sete passaportes carimbados em mais de setenta países, o carioca Jayme Drummond, de 46 anos, apresentador de um canal de turismo no YouTube, acaba de viver a experiência: cinco dias em um, digamos, acampamento composto de seis cabanas de madeira decoradas com elementos locais — as cortinas, por exemplo, são do mesmo tecido usado nos barcos a vela da região — e com hóspedes mimados com o que há do bom e do melhor. A estrutura ocupa praticamente toda a extensão de Fanjove, minúscula ilha paradisíaca na costa da Tanzânia, no litoral leste da África. “O esquema é tipo Robinson Crusoé: ilha deserta, quarto coberto de palha integrado à paisagem, mas tudo cinco-estrelas”, diz Drummond.
Foi o continente africano que desbravou a oferta de acomodações de luxo no mundo selvagem — no caso, as reservas que oferecem safáris. Trata-se de uma herança dos colonizadores que, no passado, se embrenhavam na floresta para caçar levando consigo criados, cozinheiro e acomodações decentes. A concorrência foi catapultando às alturas o conceito de luxo, e é na estratosfera que se encontra o “camping” Mahali Mzuri, a 240 quilômetros de Nairóbi, a capital do Quênia. Localizado no deslumbrante ecossistema da reserva do povo massai mara, o hotel tem apenas doze tendas erguidas no meio do mato — cada uma, para duas pessoas, com 106 metros quadrados, cama king-size e lençóis de algodão egípcio. Os hóspedes ainda contam com piscina de borda infinita, refeições assinadas por chefs e massagens com óleos aromáticos. Diária: 6 000 reais. O dono, o inglês Richard Branson, do grupo Virgin, é hóspede frequente.
Nos últimos anos, diante do crescimento do mercado de turismo de luxo, o glamping vem ganhando o mundo, de Queensland, na Austrália, a Siena, na Itália, passando por Suíça e Estados Unidos. O último relatório de tendências produzido pelo grupo Virtuoso, rede mundial de consultores de turismo cinco-estrelas, coloca o acampamento ultrassofisticado entre os cinco tipos de acomodação mais promissores do setor. “A grande atração é a autenticidade. O turista de alto poder aquisitivo não se importa de pagar caro por uma experiência que ele vê como transformadora”, explica Simone Scorsato, diretora da Associação Brasileira de Viagens de Luxo. O site glamping.com lista mais de 800 hotéis do gênero, quatro deles no Brasil, aonde a moda começa a chegar. No Korubo, fincado no Vale do Jalapão, no Tocantins, quinze tendas para duas pessoas, confortáveis e bem equipadas, servem de base para a exploração de dunas, mirantes e cachoeiras. O pacote para cada cinco dias, que inclui alimentação e passeios, sai por 2 580 reais por pessoa.
Na Europa, destaca-se o Whitepod Eco Luxury, situado no sopé da Cordilheira Dents du Midi, o início dos Alpes suíços. No meio da neve, a 45 quilômetros de carro de Montreux, quinze “iglus” muito bem aquecidos, montados sobre plataformas de madeira, recebem hóspedes dispostos a pagar diárias a partir de 2 000 reais por isolamento, conforto e vista deslumbrante. As acomodações no sistema glamping variam dentro do matiz exótico — vão de tendas, cabanas e iglus a yurts (a estrutura circular típica dos nômades da Mongólia) e tipis, como são chamadas as barracas dos índios americanos. É nestas (e também em tendas em galhos de árvore e em “bolhas” com teto transparente, para ver o céu estrelado) que se acomodam os frequentadores do Bison Peak Lodge, que fica nas montanhas do Estado do Colorado, nos EUA. Os tipis são decorados com desenhos feitos a mão, o chão é coberto de tapetes artesanais e no espaço caberia quase uma tribo inteira. A diária, de 800 reais por pessoa, inclui pescarias, passeio de caiaque e fogueira para assar marshmallow no fim do dia. Esse programa de índio compensa.
Publicado em VEJA de 7 de novembro de 2018, edição nº 2607