O movimento “Não é não”, criado 2017 por um grupo de mulheres para se preservarem de qualquer importunação indesejada nos blocos de Carnaval do Rio de Janeiro – quando foram distribuídos mais de 4.000 adesivos com esses dizeres entre as foliãs –, ganhou mais um significativo reforço. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva sancionou nesta semana a lei que cria um protocolo para proteger mulheres de assédio em shows, casas noturnas, boates, bares, restaurantes e demais locais fechados com venda de bebidas alcóolicas. O objetivo é garantir que o público feminino não passe por qualquer constrangimento ou violência nesses ambientes.
A Lei 14.786 que cria o protocolo “Não é não”, publicada no Diário Oficial da União nesta sexta-feira, 29, detalha os direitos das mulheres e os deveres dos estabelecimentos comerciais. A norma é similar à que vigora na cidade de Barcelona, na Espanha, e foi aplicada no caso que envolveu o jogador da Seleção Brasileira Daniel Alves, acusado de estuprar uma mulher em uma boate, em dezembro de 2022. Pela nova legislação, os estabelecimentos comerciais deverão manter funcionários treinados para agir diante de qualquer importunação visível ou caso de denúncia de violência ou assédio contra uma mulher. Para isso, os trabalhadores devem estar preparados para preservar provas e oferecer recursos para que a vítima possa acionar a polícia ou regressar para casa de forma segura.
De acordo com o protocolo, que tem o prazo de 180 dias para entrar em vigor, os pontos comerciais também terão que manter em locais bem visíveis informações sobre a forma de acionar a nova lei, assim como os telefones da Polícia Militar e da Central de Atendimento à Mulher (o Ligue 180). Pela lei, o estabelecimento tem que ter mecanismos para afastar a vítima do agressor, inclusive do seu alcance visual, dando a ela o direito de ter o acompanhamento da pessoa de sua escolha. Terá ainda que colaborar para a identificação das possíveis testemunhas do ocorrido e garantir acesso às imagens de câmeras do local à polícia, à perícia e aos envolvidos no caso e preservá-las, por no mínimo 30 dias.
O protocolo “Não é não” leva em conta dois tipos de agressões. O constrangimento, que abarca qualquer insistência, física ou verbal, sofrida por uma mulher depois de manifestada a sua discordância; e a violência propriamente dita, com o uso da força que tenha como resultado dano, lesão ou morte, de acordo com a legislação penal em vigor. Além das boates, bares, restaurantes e locais de shows, ambientes com competições esportivas também se enquadram na legislação sancionada por Lula. Apenas não se aplica a cultos nem a outros eventos realizados em locais de natureza religiosa.
A nova medida vem complementar a Lei 13.718, em vigor desde 2018, que criminaliza aquilo que não é consentido pela mulher. Nesse pacote estão atos de importunação sexual e a divulgação de cenas de estupro, nudez, sexo e pornografia. A pena para as duas condutas é prisão de um a cinco anos. A importunação sexual foi definida em termos legais como a prática de ato libidinoso contra alguém sem a sua anuência “com o objetivo de satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro”.