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Investigação da agressão a Moraes provoca embate interno na PF

Polícia Federal abre processo administrativo contra perito que apontou desrespeito aos protocolos na apuração do caso

Por Laryssa Borges Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 10h14 - Publicado em 27 out 2023, 06h00
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  • Em julho passado, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF), se envolveu em um incidente com um grupo de brasileiros no aeroporto internacional de Roma. Há duas versões para o episódio. Segundo o relato do magistrado, ele foi xingado e seu filho, Alexandre Barci, agredido. Já os acusados — o empresário Roberto Mantovani, sua mulher, Andrea Munarão, e o genro, Alex Zanatta — confirmam que houve a discussão, mas negam que a agressão tenha ocorrido. A Polícia Federal abriu um inquérito para apurar o caso e, para confrontar as versões, requisitou as imagens das câmeras de segurança do aeroporto italiano. O material chegou ao Brasil há dois meses, mas, em vez de ajudar a esclarecer, por enquanto só ampliou a confusão. Para olhos leigos, as imagens não permitem um veredito. Para os agentes encarregados da investigação foi possível concluir apenas que o filho foi alvo de uma “aparente agressão” consumada por um “aparente tapa”.

    A vagueza das conclusões gerou um embate interno na Polícia Federal. Por determinação do diretor-geral do órgão, a corregedoria abriu um processo disciplinar para apurar a conduta do perito Willy Hauffe Neto, presidente da Associação dos Peritos Criminais Federais (APCF). Motivo: a entidade divulgou uma nota questionando o fato de a análise das imagens do aeroporto ter sido realizada por um agente, o que, além de incomum, comprometeria a qualidade e a isenção do trabalho. “É preocupante que procedimentos não periciais possam ser recepcionados como se fossem ‘prova pericial’, uma vez que não atendem às premissas legais, como a imparcialidade, suspeição e não ter, obrigatoriamente, qualquer viés de confirmação, que são exigidas dos peritos oficiais de natureza criminal.”

    Relatório da Polícia Federal foi apresentado na tarde desta quinta-feira, 14
    OUTRA VERSÃO – Vídeo: de acordo com a defesa, a confusão no aeroporto se limitou a uma troca de insultos entre o ministro e a família do empresário (//Reprodução)

    Antes de determinar a instauração da sindicância, o delegado Andrei Rodrigues, diretor-geral da PF, fez chegar aos peritos que eles estariam ajudando a “defesa dos agressores” ao pôr em xeque os métodos utilizados na investigação. Em manifestação apresentada à corregedoria na quinta-feira 19, Hauffe alegou que as ponderações sobre a falta de perícia no caso envolvendo o ministro Alexandre de Moraes é uma posição de toda a categoria e que a abertura do procedimento disciplinar representa uma “interferência” no funcionamento da associação, ao constranger suas lideranças, que apenas cumpriram o dever funcional. A PF diz que decidiu não solicitar a perícia técnica nas gravações por considerar que não há dúvida sobre a autenticidade das imagens.

    “A polícia fez apenas um storyboard do que se queria ver, como um viés de confirmação. A questão é que, se houvesse uma perícia, talvez sequer fosse possível atestar a existência de um tapa, uma agressão física de verdade”, disse a VEJA, sob reserva, um dos peritos da PF. Não é um debate saudável. A Polícia Federal é um órgão de Estado e não pode permitir que prospere qualquer desconfiança, por menor que seja, de que ela age ou deixa de agir guiada por interesses políticos. Um inquérito tem o obje­ti­vo de apurar a prática de um crime, deve seguir todos os procedimentos legais, independentemente se eles vão beneficiar ou prejudicar quem quer que seja. No caso da agressão, o relato do ministro, por óbvio, merece toda a credibilidade, mas a prova técnica não pode ser desprezada, sob pena de, aí sim, favorecer quem o abordou. Alexandre de Moraes contou que estava na sala vip do aeroporto de Roma, retornando de uma palestra, quando foi xingado de “bandido, comunista e comprado”. Durante a confusão que se formou, seu filho, segundo o ministro, foi atingido por um tapa no rosto. Os agressores afirmam que eles foram insultados, o que gerou uma discussão acalorada.

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    3 Andrei Rodrigues – Willy Hauffe by APCF.jpg
    DISCÓRDIA - Andrei e Hauffe: perito questionou laudo feito por agente (APCF//)

    As imagens do aeroporto serviriam, portanto, para confrontar as versões conflitantes, poderiam ajudar a esclarecer o que houve ou no mínimo subsidiar uma conclusão mais assertiva. Não foi o que aconteceu. O relatório do agente que analisou o vídeo, que não tem som, descreve que Andrea “aparentemente” discute com o filho do ministro e que Roberto “parece” dar um tapa no rapaz. Com base no laudo, o delegado concluiu que, além da agressão, “Roberto Mantovani Filho e Andrea Munarão provocaram, deram causa e, possivelmente, por suas expressões corporais mostradas nas imagens, podem ter ofendido, injuriado ou mesmo caluniado o ministro Alexandre de Moraes e seu filho Alexandre Barci de Moraes”.

    O embate entre policiais e peritos, como era de esperar, será explorado pela defesa dos acusados. “O que garante que esse agente, por um engano técnico, não apagou alguma imagem? O que garante que eventualmente não houve até uma ação intencional de apagar algumas imagens?”, diz o advogado Ralph Tórtima, que defende a família Mantovani, ressaltando que, ao analisar o vídeo, a polícia italiana constatou que o único contato físico entre o empresário e o filho do ministro foi quando, durante a discussão, o braço de Mantovani impactou “levemente os óculos de Alexandre Barci”. Na terça-feira 24, o inquérito ganhou uma novidade que está provocando outra polêmica. O ministro do STF Dias Toffoli, relator do caso, autorizou que o próprio Alexandre de Moraes atue como assistente de acusação. O magistrado deve designar um representante de sua confiança que poderá inquirir testemunhas e propor novas diligências. O Ministério Público se manifestou contra a medida, argumentando que não há previsão legal para a existência de assistente de acusação nessa fase do processo. O que era para ser simples está ficando cada vez mais complicado.

    Publicado em VEJA de 27 de outubro de 2023, edição nº 2865

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