‘Eu não menti’, diz Joana D’Arc Félix após revelação sobre diploma
'A gente se empolga e acaba falando demais', afirma a química, que agora conta uma história bastante diferente da que relatou até então
Joana D’Arc Félix de Sousa, química brasileira, ganhou visibilidade na imprensa e em palestras como o TEDX por contar uma história de superação: a menina pobre, filha de empregada doméstica com operário de curtume, que entrou na faculdade aos 14 anos e concluiu um pós-doutorado em Harvard. Recentemente, a professora foi questionada sobre o seu currículo.
Uma reportagem do jornal O Estado de S. Paulo revelou que a universidade negou ter emitido certificados que comprovem a formação e alertou para um erro de grafia no papel: estava escrito “oof” em vez de “of”. No suposto diploma, há duas assinaturas. Uma delas é do professor emérito de química em Harvard Richard Hadley Holm, que, procurado por e-mail, teria dito: “O certificado é falso. Essa não é a minha assinatura, eu não era o chefe de departamento naquela época. Eu nunca ouvi falar da professora Sousa”.
No currículo Lattes, escrito pela própria pesquisadora, está publicado que ela recebeu bolsa da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (Capes), órgão do Ministério da Educação (MEC). A Capes também negou a existência do nome de Joana em seu sistema, segundo a publicação.
Há outra revelação na reportagem sobre o histórico da pesquisadora: ela fez a graduação, o mestrado e o doutorado na área de química na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). No entanto, a data da matrícula na universidade é de 1983, quando tinha 19 anos, e não aos 14 como informou.
A atriz Taís Araújo, que coproduz um filme sobre a vida da cientista, afirmou estar surpresa com a notícia. Joana falou com VEJA sobre a polêmica:
Qual é a história por trás da imagem do diploma? Não tenho um diploma de pós-doutorado [em Harvard] porque eu voltei antes. Fui lá algumas vezes, mas tive muitas orientações a distância. Quando o jornalista do Estadão veio, no segundo semestre de 2017, ele pegou várias fotos e eu tinha feito uma encenação, em que a gente apresentava vários diplomas. Depois eu vi que ele estava com uma cópia daquilo e eu falei para ele ‘aquilo lá não é válido’, e ficou por isso mesmo, lá em 2017. Também falei recentemente que aquele diploma não era verdadeiro. Ele foi feito para uma encenação. (Um episódio do podcast Estadão Notícias sobre o caso apresenta no minuto 10’52” uma entrevista gravada com Joana, na qual ela só cita o falso diploma ao ser questionada pela reportagem; não há registros anteriores de declarações em que a cientista se refira ao fato de o diploma não ser válido).
Com que idade a senhora começou a faculdade? Passei no vestibular aos 14 anos. O que aconteceu foi que eu não consegui ir, não teria condições, então cursei mais tarde. Eu fui no primeiro momento, mas depois voltei. O TED, por exemplo, é uma coisa reduzida. Tem que falar em dezessete, vinte minutos. Não dá para falar em detalhes.
A senhora teria como provar que passou por Harvard? Sim, eu fiz orientações a distância, tenho a patente dessa pesquisa feita com essas orientações [a professora se comprometeu a enviar os registros].
A senhora mentiu sobre a sua história? Eu não menti. Pode ser que eu não tenha explicado de uma forma correta. Mas eu não menti em nenhum momento.
Na nossa primeira entrevista, a senhora afirmou que concluiu o doutorado [na Unicamp] aos 23 anos. Isso é verdade? Não, isso não procede, não é verdade.
A senhora tem medo de que essa história prejudique a sua carreira? Faço um trabalho muito importante. Tirar um jovem da vulnerabilidade não tem preço. Eu trabalho com vários jovens. Não pode sujar o trabalho que eu realizei. Tenho esse legado, de trabalhar exclusivamente com jovens na vulnerabilidade social. Com a pesquisa e a ciência, eu transformo vidas de pessoas que não tinham perspectiva de futuro. Esse legado não vai ser apagado.
As palestras da senhora são sobre uma trajetória de superação e vitória, em Harvard. Isso não fica em xeque? Eu tive orientações a distância. A gente se empolga e acaba falando demais. Mas fica a lição para nos policiarmos. O legado que eu construí, de reduzir a evasão escolar, de transformação social, de tirar crianças do tráfico de drogas e da prostituição, eu acho que não vai ser apagado.