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Em depoimento, menor diz que agrediu professora após ser xingado

Adolescente afirma ter se arrependido, mas nega soco e admite apenas ter empurrado o rosto dela; garoto relata ter crescido em ambiente doméstico violento

Por Eduardo Gonçalves, de Indaial (SC)
Atualizado em 24 ago 2017, 16h46 - Publicado em 24 ago 2017, 16h33

O garoto de 15 anos que agrediu a professora Márcia de Lourdes Friggi com socos e tapas numa escola em Indaial, no interior de Santa Catarina, prestou nesta quarta-feira depoimento à Polícia Civil – o conteúdo foi obtido por VEJA.  De cabeça baixa, o garoto disse que se arrependia do que havia feito, mas tentou minimizar a brutalidade do seu ato. Explicou que partiu para a agressão depois de ter sido xingado por ela e que não lhe deu um soco, mas sim um empurrão no rosto – a sua unha teria arranhado o supercílio, o que provocou o sangramento.

A polícia não comprou a versão. Primeiro, porque o olho direito de Márcia ficou inchado depois da agressão. Segundo, por não acreditar que uma professora experiente como ela, com 12 anos de magistério, diria palavrões a seus alunos. Os delegados, no entanto, alertaram o depoente de que não era aconselhável mentir no depoimento – ele estava acompanhado da mãe e do advogado e a sua identidade não será revelada por se tratar de um menor de idade.

A agressão ocorreu na manhã da última segunda-feira no Centro de Educação de Jovens e Adultos (CEJA), um supletivo local que fica num galpão junto com outras três unidades de ensino. O adolescente havia faltado nas duas semanas anteriores. E a professora iniciaria o curso de português naquele dia. Era, portanto, o primeiro dia dos dois.

O estranhamento entre eles se deu logo no início da aula, quando Márcia avisou que estava proibido o uso de celulares na sala. Ela olhou, então, para o menino e o viu com um livro no colo. Pensou que ele poderia estar mexendo no aparelho telefônico debaixo da carteira e pediu para que ele colocasse o livro em cima da mesa. O garoto foi ríspido: “Eu boto onde eu quiser. Vá se f.”. A professora, então, mandou-o para a sala da diretoria, ao lado. A partir dali, segundo a professora, ele se levantou e jogou o livro em direção à sua cabeça – ela desviou. Já o garoto contou que atirou o livro no chão e disse que não tem um celular.

Diante da diretora e da secretaria, o adolescente negou tudo. A professora se irritou e começou a dizer que ele estava mentindo, que a sala inteira era testemunha, até que o garoto se lançou sobre ela. Márcia caiu no chão, enquanto o menino foi contido pela diretora e pelos alunos, que a essa altura já estavam fora da sala. Por fim, ele ficou trancado numa sala até que a sua mãe chegasse para buscá-lo. Uma funcionária chegou a lhe questionar por que havia feito isso – mas ele se manteve calado, com a cabeça baixa.  A diretora e a secretária que presenciaram o ocorrido irão prestar depoimento nesta quinta-feira à polícia, o que deve ser imprescindível para fechar o caso.

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Violência em casa

O garoto ainda contou à polícia que sempre viveu num ambiente de muita violência. Disse que assistia ao seu pai, alcoólatra, bater em sua mãe e que ele próprio às vezes era vítima. Numa oportunidade, teria ficado até em coma, relatou, acrescentando que estava frequentando a igreja evangélica e que não fazia uso de drogas.

O menor foi levado para depor numa viatura descaracterizada, que entrou pelos fundos da delegacia. A polícia temia que ele pudesse ser linchado pela comunidade, dada a repercussão do caso, mas ninguém apareceu. Um dia antes, professores vestidos de preto foram até a frente da prefeitura manifestar solidariedade à Márcia. “Estamos todos dilacerados”, dizia um dos cartazes. Era a mesma frase usada pela professora para descrever no Facebook a agressão. Na postagem, incluiu foto dela na sala da diretoria, com o sangue escorrendo pelo rosto. “Estou dilacerada por saber que não sou a única, talvez não seja a última”, escreveu.

“Essa postagem colocou a gente no noticiário nacional. Agressão verbal deve acontecer todos os dias, em todas as escolas do país. Mas agressão física contra um professor é algo que realmente choca a humanidade. Foi a notícia de maior repercussão da nossa comunidade”, disse o prefeito de Indaial, André Moser (PSDB), pego de surpresa com a projeção do caso. Ele considerou o episódio “lamentável” e “isolado” e disse que a declaração da professora foi relevante para suscitar o debate sobre a violência nas escolas, mas ponderou que era importante não enviesar pelo lado político. Num momento informal antes da entrevista, o prefeito chegou a brincar que a professora queria ser deputada federal.

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Cidade pacata

Formada por imigrantes alemães e italianos e à sombra da vizinha Blumenau, a cidade de Indaial tem cerca de 65.000 habitantes, segundo o último censo do IBGE, de 2016. Até então, o episódio de maior repercussão lembrado pelos moradores se deu na eleição de 2004, quando um candidato a prefeito comemorava a vitória já em cima do palanque, até que foi avisado de que o tribunal eleitoral se esquecera de contabilizar os votos de uma urna. No fim, saiu vencedor o candidato adversário com a diferença de apenas um voto.

A pacata cidade catarinense não é exatamente o retrato da educação precária do país. Está longe dos problemas dos grandes centros urbanos, como falta de vaga em escolas e creches e os altos índices de criminalidade. No ano todo, teve apenas um homicídio – no caso, o de um bandido que foi morto pelos donos da casa que ele assaltava – e 40 registros de assalto, roubo e furto, segundo o delegado José Klock, que também é suplente de vereador.

Por outro lado, assim como outras cidades brasileiras, Indaial tem uma grande incidência de crimes contra a mulher. “Envio por mês para a Justiça pelo menos 30 inquéritos da Lei Maria da Penha”, disse ele.

O delegado pretende concluir o inquérito sobre a agressão na escola até esta sexta-feira. A promotora de justiça Patricia Dagostin Tramontin tem telefonado todos os dias para a delegacia para saber sobre o andamento do caso. Ela já anunciou que irá pedir a internação do garoto, dada a sua reincidência – no ano passado, ele cumpriu trabalhos comunitários por ter agredido um colega de sala.  “Eu me sinto na obrigação de pedir a medida mais grave, que é a internação. Para que ele entenda a consequência dos seus atos”, afirmou ela.

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