Um dos trechos dos longos chats que a babá Thayna de Oliveira Ferreira, mantinha com seu noivo enquanto o menino Henry Borel, de 4 anos, sofria agressões por parte do padrasto, o vereador Jairo Souza Santos Júnior, o Dr. Jairinho, indica que o parlamentar também teria feito o mesmo com o sobrinho, T.S., de apenas 3 anos. O garoto – que é filho da irmã de Jairinho, Thalita Fernandes dos Santos – é cuidado pela mãe de Thayna, Maria Lucia de Helena Oliveira, há pelo menos dois anos. O político e a mãe de Henry, Monique Medeiros, estão presos e são réus por homicídio triplamente qualificado e tortura da criança, morta na madrugada de 8 de março no apartamento em que os três moravam, na Barra da Tijuca, Zona Oeste do Rio de Janeiro.
Mais de um mês antes da morte de Henry, em 2 de fevereiro, Thayna relatou, em conversa por aplicativo de mensagens recuperadas pela polícia, que Henry estava pedindo pela mãe aos prantos quando Jairinho entrou no quarto da criança. No chat, que consta no laudo completo do celular da babá obtido por VEJA, ela narra ao companheiro, Erick Machado Pigliasco, o clima de terror e de agressões físicas e psicológicas a que Henry estava sendo submetido.
Segundo a cuidadora, o padrasto entrou no quarto e mandou a criança parar de chorar. “Aí nisso o doido [Jairinho] entrou [e disse] ‘Henry, não pode chorar, você é muito mimado’. O menino se agarrou ao meu pescoço [e] começou a chorar muito, muito mesmo, [algo] que você vê que não é normal, sabe”, descreveu a babá de Henry ao noivo. “Aí ele entrou com o menino para o quarto dele, fiquei sem saída, né, vou fazer o quê?”, indagou ela. “Aí ele [Henry, de dentro do quarto em que estava com Jairinho, dizia]: ‘me leva para a tia [Thayna], eu quero minha tia’”, prosseguiu, ao que Pigliasco responde: “doideira”. A babá, então, continua: “agora o menino tá chorando no quarto e eu na sala tipo? Coisa estranha, sabe. Parece que tá tampando a boca do menino. Uma doideira de verdade”. Em seguida, acrescentou que Henry seguia no quarto com Jairinho. “[Henry está] chorando e gritando ‘prometo’. O psicológico dessa criança vai ficar fudido. Sério! E não sei o que faz para melhorar”, disse ela ao noivo.
Foi em meio a esse cenário de violência que a babá confidenciou ao companheiro que o sobrinho de Jairinho passava pela mesma situação. “Minha mãe fala que ele faz isso com T. também, e que T. só obedece a ele. Mas sou super contra essa teoria de que tem que aprender as coisas na marra, sabe?”, revelou ela, enquanto Henry seguia no quarto com Jairinho. Maria Lucia, mãe de Thayna, é a babá que cuida de T., filho de Thalita, irmã de Jairinho. Procuradas pela reportagem, nenhuma das três foi localizada para comentar a conversa capturada pela polícia.
O inquérito da morte de Henry já foi finalizado, mas a babá segue sendo investigada pela 16ª DP (Barra da Tijuca) pelo crime de falso testemunho. Até então, nenhum procedimento investigativo foi aberto para verificar as afirmações da babá sobre o sobrinho de Jairinho. Este é um possível quarto caso de agressões perpetradas por Jairinho contra crianças pequenas – além de Henry, dois outros filhos de ex-namoradas foram torturados pelo vereador, conforme VEJA revelou na edição de 2 de abril. Ele foi indiciado por tortura majorada pela Delegacia da Criança e do Adolescente Vítima (DCAV) do Rio em ambos os casos – o último indiciamento ocorreu na semana passada.
Dez dias após o episódio em que apontou as possíveis agressões a T., Thayna narrou, em tempo real, uma sessão de tortura feita pelo parlamentar contra Henry à mãe da criança, Monique, que retornaria para o apartamento apenas três horas depois do relato. Nenhuma das duas comunicou a polícia ou afastou Henry do convívio com o padrasto. A babá chegou a mentir em seu depoimento, mas voltou atrás em um segundo interrogatório feito pela 16ª DP, que investigou o caso, e contou que presenciou Jairinho agredindo o menino em pelo menos três ocasiões. Ela disse que não contou a verdade na primeira vez em que esteve na delegacia porque sentiu medo de Jairinho.
Foi a irmã do vereador quem chamou a babá para conversar em sua casa no bairro de Bangu (Zona Oeste do Rio) a fim de orientá-la sobre o primeiro depoimento que prestaria à polícia. No segundo depoimento no qual modificou a versão dada inicialmente aos investigadores, a cuidadora de Henry disse que Thalita teria dito “para a declarante não ser juíza do caso do irmão dela, que ‘menos é mais’, dando a entender que não era para a declarante falar tudo que sabia, que todos já estavam sofrendo muito”. Em seguida, a irmã de Jairinho teria perguntado se a babá mantinha arquivos de conversas em seu celular e orientado a apagá-los em caso positivo. Thalita teria interferido em outros dois depoimentos de testemunhas que, posteriormente, mudaram suas versões à polícia.
Tida como um braço-direito de Jairinho, Thalita é uma das sócias da empresa que mantém um patrimônio considerável em imóveis, na qual o vereador tem uma procuração de plenos poderes para compra e venda dos bens, conforme VEJA revelou em 7 de maio. É no nome de outra empresa dela, também, que está uma luxuosa mansão em Mangaratiba, na Costa Verde fluminense, que foi posta à venda por 2,4 milhões de reais após o assassinato de Henry. Os registros de imóveis relacionados a Jairinho, que conservadoramente somam 8 milhões de reais, apontam para um esquema de transações que sugere manobras de ocultação de patrimônio e lavagem de dinheiro, inclusive com o uso de laranjas.