Nas últimas quatro décadas, o hotel Maksoud Plaza ficou marcado como um dos principais templos do glamour no Brasil. Localizado a uma quadra da Avenida Paulista, no coração de São Paulo, ele construiu sua reputação com o inconfundível mobiliário dos anos 1950, os lençóis de algodão egípcio impecavelmente colocados nas camas dos hóspedes, os elevadores panorâmicos com vista privilegiada do lobby e, claro, os elegantes, belos e famosos frequentadores. Junte-se a isso um clube noturno capaz de atrair as principais atrações musicais do planeta e o resultado é uma casa que nasceu para fazer história. Seus quartos receberam chefes de Estado como a primeira-ministra britânica Margaret Thatcher, artistas como o líder do Nirvana Kurt Cobain e o cineasta Pedro Almodóvar, e intelectuais como o Nobel de Medicina Albert Sabin. Tudo isso, porém, ficou no passado. Na terça-feira 7, um dos mais extraordinários capítulos da aventura da hospitalidade brasileira chegou ao fim.
O Maksoud fechou depois de desgastantes disputas entre herdeiros e o surgimento de outros empreendimentos hoteleiros de alto padrão, mais modernos e sintonizados com os novos tempos. De fato, o charme de outrora havia desaparecido. Os salões para shows, que receberam nos anos 1980 e 1990 apresentações de gênios como Tom Jobim, Frank Sinatra, Etta James e Julio Iglesias, estavam há muito tempo vazios. Atraídas pelo encanto dos concorrentes, as celebridades sumiram, e eram elas que, afinal, construíram a fama do lugar.
Após a morte do fundador, Henry Maksoud, em 2014, a administração foi assumida por Henry Maksoud Neto, que tentou trazer novos ares para a operação. Em 2015, o PanAm Club foi inaugurado na cobertura e o Frank Bar, batizado em homenagem a Sinatra, no lobby. A ideia era modernizar o hotel e levar um novo público para o espaço. Nem todas, contudo, deram certo. A honrosa exceção foi o Frank Bar, que acabou escolhido, entre 2017 e 2019, como um dos 100 melhores do mundo pelo World’s 50 Best Bars.
A história ensina que hotéis precisam ser administrados com rigor, já que suas margens financeiras são estreitas e a concorrência acirrada exige constantes atualizações. Quando há briga de herdeiros, a situação tende a se tornar insustentável. A morte de Henry Maksoud lançou seus filhos, Roberto e Claudio, e a mãe deles, Ilde, numa disputa contra Henry Neto e Georgina Bizerra, a segunda mulher do patriarca. Os filhos, herdeiros diretos, queriam tirar Neto e Georgina da administração do hotel alegando que Henry foi induzido a transferir poder aos dois quando já estava debilitado pelo câncer. Para complicar, Vera Lúcia Barbosa, filha de Henry Maksoud com a cozinheira da família, Jaci, passou a ser considerada herdeira após provar a paternidade por “presunção”, já que o empresário se recusou a fazer o teste de DNA em vida.
A briga ganhou novo capítulo no ano passado, quando a HM Hotéis, administradora do Maksoud, e a Hidroservice Engenharia, controladora do hotel, entraram com um pedido de recuperação judicial avaliado em 81 milhões de reais, após sucessivos anos de lida na Justiça em decorrência de dívidas trabalhistas. Não se sabe, agora, depois de fechar de portas, o futuro da marca Maksoud Plaza. A HM Hotéis afirmou que pretende continuar no segmento de hotelaria e levar o Maksoud para outro endereço, mas com a mesma identidade.
O fechamento do Maksoud, é natural, foi recebido com tristeza pelo setor. Segundo especialistas, o hotel deixou também um legado arquitetônico, projetado por Paulo Lúcio de Brito. Talvez o principal exemplo seja o lobby aberto a qualquer um que passeasse pela rua, com lojas, café e bar. “É especial chamar o público para dentro e transformar a área em um espaço de convivência”, diz Gabriela Otto, professora de gestão e estratégias do turismo de luxo da ESPM. Com o fim do Maksoud, a hotelaria brasileira perde parte de seu charme. O glamour de outros tempos, afinal, não volta mais.
Publicado em VEJA de 15 de dezembro de 2021, edição nº 2768