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“A esquerda está muito fundamentalista”, diz vice-presidente do PT

Em entrevista a VEJA, o deputado Washing­ton Quaquá (RJ) contraria a Executiva do partido, defende a aliança com o Centrão e critica pautas 'exageradas'

Por Marcela Mattos Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 10h10 - Publicado em 1 set 2023, 06h00
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  • O senhor foi criticado pelo PT por ter chancelado a absolvição de dois deputados bolsonaristas no Conselho de Ética. Por que votou assim? Defendi que nenhuma representação fosse admitida. O plenário da Casa não é um picadeiro de circo para o deputado fazer palhaçada, como o Nikolas Ferreira (PL-MG) fez ao vestir uma peruca loira, mas isso não é motivo para cassar o mandato. A esquerda está muito dogmática, fundamentalista.

    Esse posicionamento resultou num movimento para que o senhor fosse retirado da Executiva do PT. Tenho 52 anos de idade, entrei no PT aos 14 anos, cresci na favela, e aí vem alguém de classe média, que nunca fez nada por ninguém, que fica o dia inteiro numa rede social: “Ah, mas a militância…” Que militância? Tenho o direito de discordar. O PT é, até que se prove o contrário, um partido democrático. Tem gente que joga para a plateia dentro do PT, uma plateia de classe média, lacerdista, udenista e de esquerda. O Brizola chamava isso de “UDN de macacão”. Temos hoje uma UDN de sunguinha, aquele militante da Praia de Ipanema.

    O senhor também gerou controvérsia ao aparecer numa foto ao lado do ex-ministro Eduardo Pazuello. O Pazuello tem a cabeça de militar, pode ser até que pague alguma coisa pelos erros do governo Bolsonaro, mas não é um fascista que estava lá para matar. Vamos com calma. Ele é uma pessoa agradável, gosta de samba, é um malandro carioca. Eu, inclusive, o convidei para entrar em uma frente parlamentar para tratar da logística com Cuba. Ele entende de logística. Tenho zero problemas em ter amigos de direita.

    A presidente do PT, Gleisi Hoff­mann, já lhe deu alguns puxões de orelha? Nós temos divergências, muitas públicas, o que é natural, mas acho que a gente, para sustentar o governo Lula, tem de ter uma base ampla no Congresso, em especial fazendo uma aliança com o Lira e com o Centrão, que nos entregam a maioria para fazer as políticas que queremos. É pragmatismo político. A visão da Gleisi é estreita em relação a alianças, às relações políticas. E eu já disse isso para o Lula e para ela.

    Qual avaliação o senhor faz do PT? Vou fazer uma pesquisa para provar que a nossa base social não é a classe média de Zona Sul. O povo que gosta do PT e do Lula é o mais pobre deste país, é um povo mais conservador, inclusive nos costumes. Por exemplo: querem igualar a questão do preconceito ao LGBTQIA+ ao racismo. Isso não tem cabimento. O racismo não é um problema de comportamento, é uma chaga estrutural. Você não pode querer comparar uma pessoa que muda de sexo com a história de toda uma população negra que sofreu tantas agruras. Existem exageros na pauta comportamental que isolam a esquerda das pessoas.

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    O PT não tem de prestar contas a esse eleitorado de esquerda? Mas será que o travesti de esquerda, que está na favela passando fome, tem a mesma pauta das meninas de classe média da Zona Sul? A esquerda está assumindo o discurso da Zona Sul. Eu não ouço mais um movimento de mulheres para falar de creche para as crianças. Todo dia eu vejo gente pedindo creche, porque a mãe precisa trabalhar. É o básico.

    Que outra postura da esquerda incomoda o senhor? Precisamos tirar da mão do Ibama e do Ministério Público a decisão sobre os grandes investimentos do país. Por exemplo, no caso da foz do Amazonas, não tem cabimento o que a ministra Marina Silva está fazendo. Talvez seja uma das maiores jazidas de petróleo do mundo, que pode levar o Brasil a outro patamar, melhorando sobremaneira a vida do povo, e a ministra fica atrapalhando o desenvolvimento do país. Ninguém aguenta um país desse jeito.

    O que o senhor contará no livro sobre a esquerda que pretende lançar? Vou escrever sobre esses exageros que estão sendo cometidos. Eu faço política, não fundamentalismo religioso. Sou de um tempo em que essas pautas eram importantes, mas nunca foram prioritárias para o PT. A esquerda inverteu as prioridades. Não é à toa que o velho eleitor do PT tem abandonado o partido nas periferias, vem se afastando de nós por conta de uma pauta comportamental que virou prioridade e não deveria ser.

    Publicado em VEJA de 1º de setembro de 2023, edição nº 2857

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