2020 foi um ano de ótimos livros para explicar os impasses da política brasileira. Sem fazer uma ordem hierárquica, abaixo estão os doze melhores títulos de política lançados neste ano que cobrem das ameaças à democracia às origens da extrema-direita, da corrupção à reação à pandemia. Boa leitura!
1. A Organização: A Odebrecht e o esquema de corrupção que chocou o mundo (editora Companhia das Letras)
A repórter Malu Gaspar mostra como a relação da política com o capitalismo brasileiro são várias mãos que lavam outras mãos que lavam outras mãos. É possível, portanto, ler o livro como um raio-x da corrupção política dos últimos 50 anos, com especial vigor nos anos Lula e Dilma. Mas isso seria reducionismo. A corrupção é o novelo por onde a jornalista retrata a ascensão e queda de uma das maiores corporações brasileiras. Você pode ler minha crítica completa ao livro aqui.
2. A Máquina do Ódio – Notas de uma repórter sobre Fake News e Violência Digital (editora Companhia das Letras)
A partir da sua experiência como vítima da milícia digital depois de denunciar o disparo ilegal em massa de mensagens via WhatsApp nas eleições de 2018, a repórter Patrícia Campos Mello mostra como o bolsonarismo se sustenta com uma rede organizada e profissional. O livro é uma grande reportagem sobre como a era digital mudou a política para sempre, mas ele ganha estatura justamente por oferecer ao leitor, sem censura, a dimensão da humilhação que Campos Mello sofreu e a sua capacidade de seguir fazendo reportagem. Leia a minha crítica completa aqui.
3. A República das Milícias: Dos Esquadrões da Morte à era Bolsonaro (editora Todavia)
Um dos melhores repórteres brasileiros, Bruno Paes Manso trocou o jornalismo pela academia e juntou rigor da pesquisa com faro de notícia para produzir um raio-x sobre as milícias, dos esquadrões da morte na Baixada Fluminense dos anos 80 às rachadinhas na Assembleia Legislativa no século 21. Paes Manso descreve como o sucateamento da segurança pública, o domínio das favelas pelo tráfico e a corrupção nas polícias permitiram que as milícias se tornassem mais poderosas que as facções. A transformação de paramilitares em políticos ou assessores de políticos nunca foi um acidente.
4. Mataram Marielle: Como o assassinato de Marielle Franco e Anderson Franco escancarou o submundo do crime carioca (editora Intrínseca)
O livro é uma reportagem sobre como a polícia do Rio não chegou e não quis chegar aos mandantes dos assassinos da vereadora e do motorista, mortos em uma emboscada em março de 2018. Veteranos na cobertura diária da guerra do Rio, Chico Otavio e Vera Araújo produziram um documento histórico sobre a milícia e seus interesses na estrutura do poder.
5. O Brasil dobrou a direita: uma radiografia da eleição Bolsonaro em 2018 (editora Zahar)
O cientista político Jairo Nicolau disseca os resultados da última eleição presidencial para explicar como um deputado inexpressivo se tornou o líder do movimento de renovação da política. Ao repartir os dados de gênero, demografia, região, religião e preferência política, Nicolau faz do livro um caleidoscópio, em que cada giro revela uma forma nova para se entender o fenômeno do bolsonarismo.
6. Ponto Final: A Guerra de Bolsonaro contra a Democracia (editora Todavia)
Em um livro escrito no calor da hora, o cientista político Marcos Nobre explica o bolsonarismo por sua característica do confronto. “Bolsonaro precisou do colapso (das instituições) para se eleger. E precisou ainda mais desse mesmo colapso para se manter no poder”, escreve.
7. O tempo dos governantes incidentais (Companhia das Letras)
O cientista político Sérgio Abranches revisita em seu mais novo livro o presidencialismo de coalização, conceito que ele criou nos anos 1980 para definir a relação de trocas entre Executivo e Legislativo. O diagnóstico é o de um naufrágio. Afirma Abranches no livro: “O primeiro desafio da governabilidade no Brasil é encontrar meios institucionais de resistência a esse deslizamento rumo ao autoritarismo. É por meio dele que Bolsonaro pode passar de um governo incidental de mentalidade autoritária a um governo autoritário. Uma vez instalado, o governo autoritário pode, eventualmente, originar um regime autoritário, se encontrar meios para assegurar sua durabilidade”.
8. Samuel Wainer – O homem que estava lá (editora Companhia das Letras)
A repórter Karla Monteiro traz a biografia de Samuel Wainer, o repórter que fez a entrevista na qual Getúlio Vargas prometeu voltar “nos braços do povo”, fundou o jornal Última Hora e se tornou o conselheiro de três presidentes, o próprio Getúlio, Juscelino Kubistchek e João Goulart. Monteiro desmonta mitos que o próprio Wainer semeou (como o de ter nascido no Brasil e não na antiga Rússia), para montar um quebra-cabeça complexo sobre Wainer e a imprensa brasileira. Você pode ler minha crítica completa ao livro aqui.
9. Fascismo à Brasileira: Como o integralismo, maior movimento de extrema-direita da história do país, se formou e o que ele ilumina sobre o bolsonarismo (editora Planeta)
Entre os anos 1920-40, o jornalista Plinio Salgado organizou o maior movimento de extrema-direita fora da Europa. Em seu auge, o movimento dos camisas verdes do sigma chegou a 1 milhão de militantes e por pouco não tomou o poder de Getúlio Vargas. Lido com os olhos de 2020, o livro do repórter Pedro Dória serve de alerta e aprendizado.
10. Fascismo em Camisas Verdes – os integralistas e os neointegralistas (editora FGV)
Os historiadores Leandro Pereira Gonçalves e Odilon Caldeira Neto conduzem no livro uma profunda pesquisa sobre a extrema direita brasileira, de Plínio Salgado até seu ressurgimento com Enéas Carneiro, os movimentos pró-impeachment e a eleição de Bolsonaro.
11. Curto-Circuito: O vírus e a volta do Estado (editora Todavia)
A economista Laura Carvalho, começa o livro com uma ironia: com a pandemia de Covid-19, o velho John Maynard Keynes voltou à moda. Esse é curto-circuito que afeta conjunturalmente o time de Paulo Guedes, mas, na avaliação de Cardoso, chacoalha como políticos e economistas devem pensar o Estado. Ela defende a volta do Estado como indutor do crescimento e fiador de um ambiente de bem-estar social, mas não espere ingenuidade. Carvalho é clara ao notar a possibilidade que a crise econômica gerada pela pandemia do coronavírus seja sucedida por mais austeridade fiscal, como ocorreu depois do crack de 2008.
12. A Bailarina da Morte, A gripe espanhola no Brasil (editora Companhia das Letras)
Autoras do recente clássico ‘Brasil, uma biografia’, as historiadoras Lilia Schwarcz e Heloísa Starling recuperam a tragédia de erros da gripe espanhola, a pandemia do vírus H1N1 que matou 50 milhões no mundo (35 mil no Brasil) e gerou uma crise política inédita no Brasil entre 1918 e 20. Remédios homeopáticos que não funcionavam para a gripe se popularizaram, fake news sobre pessoas enterradas vivas se espalharam ao final, o medo foi substituído pelo carnaval mais catártico que se tem notícia, o carnaval da desforra. Schwarcz e Starling mostram como o Brasil repete a história, sem aprender com ela.