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Thomas Traumann é jornalista e consultor de risco político. Foi ministro de Comunicação Social e autor dos livros 'O Pior Emprego do Mundo' (sobre ministros da Fazenda) e 'Biografia do Abismo' (sobre polarização política, em parceria com Felipe Nunes)
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Bolsonaro pode virar Lula?

A estratégia do governo de transformar o presidente em um novo defensor dos pobres depende de uma eficiência inédita

Por Thomas Traumann Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 1 jul 2020, 17h01

Acossado pelo desastre no combate à Covid-19 e as investigações envolvendo Fabrício Queiroz, o governo Bolsonaro entrou no modo “sobrevivência”. O antes eloquente presidente ficou mais quieto, as ameaças de golpe militar cessaram e, de repente, a prioridade do governo se tornou ajudar os mais pobres. Nesta segunda (dia 30/06), Jair Bolsonaro anunciou a prorrogação do auxílio emergencial por mais dois meses a um custo de R$100 bilhões, o dobro do que pretendia a equipe econômica. Não é bondade. É necessidade.

Para o Planalto, quando a pandemia arrefecer e a população puder se manifestar nas ruas é certo o início de uma campanha pelo impeachment. A raiva da sociedade com as mortes e doentes do Covid-19, o terror do desemprego e as explicações pouco convincentes sobre “rachadinhas” tem nome e sobrenome, Jair Bolsonaro.

Como se sai disso? Em coluna três semanas atrás apontei que o plano bolsonarista é colocar dinheiro no bolso dos pobres. Os bolsonaristas acreditam que se tiverem o apoio firme dos mais pobres, as chances de o presidente ser deposto são mínimas.

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Os três primeiros meses de distribuição do auxílio emergencial já indicaram uma mudança no eixo da popularidade presidencial. Pandemia, recessão e Queiroz destroçaram a imagem do capitão junto à classe média do Sudeste. Em compensação, o auxílio o ajudou junto aos mais pobres. “Em 2019, os mais pobres correspondiam a 32% do grupo que considerava o governo ótimo ou bom, de acordo com o Datafolha. Desde então, o presidente manteve a popularidade estável, mas o segmento de baixa renda passou a representar 52% de seus apoiadores”, escreveu Bruno Boghossian, na Folha.

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Analistas tem apontado similaridades entre essa tática e a ressurreição política de Luiz Inácio Lula da Silva, em 2006. No auge da cobertura do escândalo do mensalão, em outubro de 2005, a aprovação do governo Lula chegou a cair 28% contra 29% de ruim/péssimo, segundo o Datafolha (para comparar, Bolsonaro tem 33% de defensores e 43% que o rejeitam). Em dezembro de 2005, o então presidente mantinha os mesmos índices de satisfação, mas pela primeira estava atrás de José Serra numa eventual disputa presidencial. Em fevereiro de 2006, no entanto, a popularidade de Lula saltou para 36%, a rejeição caiu para 23%, Lula se fortaleceu e Serra sequer foi candidato. Os bolsonaristas acham que podem repetir o feito, como se o auxílio emergencial fosse uma nova Bolsa Família.

Há um problema fundamental nessa analogia. O Bolsa Família começou a ser planejado em 2004 e quando iniciou em 2005 já havia cadastrado 5,5 milhões de famílias miseráveis. O programa virou exemplo internacional por ter conceito e método.

O governo Bolsonaro, por sua vez, demonstrava até pouco tempo zero interesse nos mais pobres. Tentou acabar com o BPC (o benefício para idosos miseráveis) e o abono salarial (para quem recebe menos de 2 salários mínimos), por falta de planejamento na contratação de servidores deixou a fila de aposentadorias do INSS acumular para 1,5 milhão de pedidos e, quando a pandemia surgiu tentou limitar o auxílio em R$ 200.

Até maio, o ministro Paulo Guedes tentava impedir a prorrogação do auxílio reproduzindo em uma única frase séculos de estigma de pobres indolentes: “Se falarmos que vai ter mais três meses, mais três meses, mais três meses, aí ninguém trabalha. Ninguém sai de casa e o isolamento vai ser de oito anos porque a vida está boa, está tudo tranquilo”. Agora que a água chegou no nariz, o discurso mudou. Guedes prometeu reformar o Bolsa Família e transformá-la em um novo programa, Renda Brasil, que incluiria além das famílias miseráveis e milhões de trabalhadores informais.

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Mesmo na distribuição do auxílio emergencial, a mais importante medida de combate à miséria na coronacrise, a gerência do governo foi patética. Com uma comunicação falha, interessados formaram filas quilométricas nas agencias da Caixa Econômica Federal, agravando a pandemia. Depois, a CGU descobri mais de 300 mil fraudes na distribuição do benefício, incluindo de servidores públicos. Mesmo agora, com o aprendizado, o governo ainda não avisou os critérios para quem será atendido no novo programa. Só muito otimismo para imaginar que agora o governo vai se tornar eficiente.

Lula governava ainda com a economia em retomada. O país cresceu 2,3% em 2005 e 4,2% em 2006, completando um mandato inteiro de expansão. Bolsonaro, por sua vez, governa sob a pior recessão do século.

Há ainda questões políticas. A oposição em 2005 e 2006 não tentou o impeachment não por ser boazinha, mas por falta de apoio popular. Como as investigações não chegavam diretamente a Lula, temiam entrar num processo e sair fragilizadas. A oposição atual tem o mesmo dilema. Sabe que consegue construir um pedido de impeachment pela inépcia de Bolsonaro na pandemia, mas sem povo na rua não há Congresso que se mexa.

Bolsonaro tem uma base volátil de apoio congressual e sabe que seu futuro é incerto. Já tentou bancar seu mandato na intimidação das redes sociais e no apoio militar. Agora, tenta os mais pobres.

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