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Cotas – Flagrado no erro, Gaspari faz o quê? Ora, sai ofendendo quem acertou! Faz sentido!

Elio Gaspari deve ter escrito o texto mais, como posso dizer?, oco de sua carreira. O curioso é que lhe deu o seguinte título: “Uma ideia para as cotas nas universidades”. Eu o reproduzo abaixo. Se vocês encontrarem “a ideia”, tenham a bondade de alertar os demais leitores. O colunista, como se sabe, é um […]

Por Reinaldo Azevedo Atualizado em 31 jul 2020, 08h06 - Publicado em 19 ago 2012, 06h57

Elio Gaspari deve ter escrito o texto mais, como posso dizer?, oco de sua carreira. O curioso é que lhe deu o seguinte título: “Uma ideia para as cotas nas universidades”. Eu o reproduzo abaixo. Se vocês encontrarem “a ideia”, tenham a bondade de alertar os demais leitores.

O colunista, como se sabe, é um defensor entusiasmado das cotas. Como não consegue debatê-las no mérito porque não dispõe de argumentos razoáveis, então opta pela categorização dos adversários: quem é contra é “demofóbico”. É o truque mais baixo — até me ocorreu adjetivo mais sujo, mas serei moderado — a que pode recorrer um debatedor: acuse aquele que diverge de não ser tão bom e humanista quanto você! Pronto! Por esse critério, até a matemática pode ser chamada de “fascista”, né?

Depois que a aliada de Gaspari na causa, a deputada Eunice Lobão (PSD-MA), mulher do marido Lobão, conseguiu aprovar a lei que reserva 50% das vagas das universidades federais para alunos das escolas públicas, distribuídas segundo a cor da pele dos estudantes, este “amigo do povo” estava calado. Aí decidiu dizer o que segue em vermelho. Eu comento em azul.

Passada uma década de debate, a demofobia mobilizada contra a instituição de cotas nas universidades públicas foi derrotada. Primeiro no Supremo Tribunal Federal, que, por unanimidade, julgou-as constitucionais. Recentemente, pelo Senado, que ampliou a política de cotas com apenas uma voz contra.
Truque: diz que o Senado “ampliou a política de cotas”, mas omite o que se aprovou lá. Entende-se que a única voz que resistiu ao absurdo, o senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP), foi, então, demofóbico. Por óbvio, o senhor Elio Gaspari está a dizer que já temos um Senado Federal com 80 “demofílicos” (amigos do povo). Que bom! O Brasil está salvo! Se, segundo os critérios de Gaspari, Aloysio é um mau senador diante de 80 respeitáveis, isso diz muito de… Gaspari! 

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Enquanto durou o debate, as cotas eram apresentadas como prenúncio do fim do mundo. As pesquisas indicam que os cotistas tiveram desempenhos iguais ou até superiores aos dos demais.
Gaspari pode escrever o que bem entender (Artigos 5º e 220 da Constituição). Ele só não consegue mudar os fatos. As pesquisas a que se refere são capengas. Mas isso ainda é o de menos. As vagas que estavam sendo ocupadas por cotistas, e isto é apenas um fato, estavam concentradas em cursos das chamadas “humanidades”, aqueles movidos a opinião, cuspe e giz. Se Dilma sancionar, como parece que o fará, a lei aprovada pelos “amigos do povo”, 50% das vagas de Medicina da Unifesp (Faculdade Paulista de Medicina), por exemplo, terão de ser ocupadas, obrigatoriamente, por alunos da escola pública — metade delas (25% do total) por estudantes oriundos de famílias cuja renda per capita seja de, no máximo, 1,5 mínimo (e segundo a cor da pele, registre-se sempre). Onde está esse aluno? Como a universidade vai asseverar a verdade da informação? Onde o estudante da escola pública adquiriu os conhecimentos necessários de biologia e química, por exemplo, para acompanhar as aulas? Há as exceções? Há! Mas  a lei manda a regra pra dentro das universidades. E a regra do ensino médio no Brasil foi retratada no resultado recente do Ideb.

A expansão da política de cotas poderia abrir um debate: qual a distância razoável entre a nota do aluno beneficiado e a daquele que perderá a vaga que ganharia pelo seu desempenho no vestibular. É bom que se diga: na sua essência, as cotas dão a um estudante que tirou nota mais baixa o lugar que iria para outro, que teve nota melhor. Alguma diferença tem que haver, senão a política seria inócua.
Huuuummm… Gaspari acusa os outros de “demofóbicos” porque se considera um “demofílico”, um amigo do povo. “O Amigo do Povo” era justamente o nome do jornalzinho de um tarado cortador de cabeças da Revolução Francesa, Marat. Era capaz de dizer as maiores barbaridades em nome do que entendia ser a justiça. Um dia foi vítima dos próprios métodos — e a vingança chegou pelas mãos de uma mocinha… Vejam com que sem-cerimônia escreve Gaspari: “É bom que se diga: na sua essência, as cotas dão a um estudante que tirou nota mais baixa o lugar que iria para outro, que teve nota melhor. Alguma diferença tem que haver, senão a política seria inócua.” Entenderam? O estudante que teve “nota melhor” se torna, então, o responsável pela parte prática da suposta justiça social. A exemplo de Marat, ele não gosta de detalhes: teria de explicar, por exemplo, por que o branco pobre que teve uma nota melhor há de ser preterido pelo negro ou mestiço pobres que tiveram nota pior. A resposta é uma só: “porque é branco, não porque é pobre, já que pobres todos são”. O racismo sai da pele e vai para a veia!

Há poucas pesquisas acerca desse tema. De uma maneira geral, acredita-se que a maior distância entre a nota do não cotista barrado e a do cotista beneficiado chega a ser 1,5 ponto ou 2 pontos. Pode acontecer que um estudante tirou oito e perdeu a vaga para outro que tirou seis.
Lamento! Isso é chute! Quero saber quais são as fontes. Registro, desde sempre, que, ainda que a diferença fosse de 0,1, haveria aí uma injustiça estúpida. Gaspari deve saber que entre Zero e 0,1 existem infinitos números, não é mesmo? Esse negócio de “de uma maneira geral, acredita-se” não é nem jornalismo de opinião. É só enrolação.

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Quem acha que as cotas não devem existir pode permanecer nessa posição, mesmo sabendo que elas vieram para ficar.
Huuummm… Gaspari venceu!  Ao vencedor, os 38% de quase alfabetizados das universidades brasileiras e os 4% de quase analfabetos! Parabéns! Agora, um tanto preocupado, ele vai nos convidar a remediar o leite derramado. Prestem atenção!

Quem é a favor, pode se perguntar qual é a diferença razoável. Já houve caso em que ela foi de 3,4 pontos. É razoável que alguém que tirou 7,5 perca a vaga para quem tirou 4,1?
Uai! Responda aí, valente! Que tipo de opinião é essa que tenta se revelar por interrogações! Eu acho injusto! Quando alguém que tirou 7,1 perde par alguém que tirou 7, eu vejo injustiça. Curioso o percurso argumentativo deste senhor. “Demofóbico” é todo aquele que não aceita a cota. Entendi. Logo, quem aceita é “demofílico”. Mas parece que a demofilia de Gaspari tem número: até 2!!! Acima disso, ele aceita, então, ser um demofóbico também. Ou, na sua sede de categorização, passa a chamar quem discorda dele de “demagogo”. O homem que, ao pensar segundo o “andar de baixo e o andar de cima”, fundiu a luta de classes com a construção civil, quer agora dar um critério aritmético para a injustiça que faz justiça.

Partindo-se da premissa segundo a qual o objetivo das cotas é colocar nas universidades da Viúva alunos de escolas públicas, afrodescendentes e índios, dispensa-se o renascimento da demofobia, disfarçada na defesa de uma diferença que, ao final, barre aqueles a quem se pretende beneficiar. Com números na mesa, esse debate poderá evitar que uma política que busca a justiça social produza injustiças absurdas.
Flagrado com calças curtas, incapaz de defender a lei absurda aprovada no Senado, também não quer dar o braço a torcer. Daí esse texto nem-nem. Segundo se entende, ele acha que é preciso estabelecer, sim, uma diferença aceitável. Mas qual? Ele também não sabe. Como sempre, Marat está aí apenas para mandar cortar a cabeça daqueles que discordam dele. Ocorre que, às vezes, como é o caso, discordar de quê?

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Que vexame!

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