No dia em que se convenceu em definitivo que o coronavírus passou como uma retroescavadeira sobre a política do ministro Paulo Guedes, o governo foi de uma precisão espantosa ao anunciar o que está por vir, e o presidente Jair Bolsonaro outra vez terrivelmente irresponsável no combate que trava com a realidade.
Está por vir, este ano, um crescimento do PIB estimado em 0,02%, capaz de provocar saudade do pibinho de 1.1% de 2019, que, por sua vez, deu saudade do PIB de 1,3% legado a Bolsonaro pelo ex-presidente Michel Temer. Por que um crescimento de 0,02% e não de 0,03% ou de 0,01%? Pergunte ao Guedes.
Melhor, não. O ex-Posto Ipiranga havia perdido parte do seu brilho desde que assumira o cargo. O coronavírus encarregou-se de apagá-lo. São coisas que acontecem. A culpa não é dele. Guedes tinha o sonho de passar à História como o autor da proeza de ter reformado o Estado como nenhum dos seus antecessores o fizera.
Bolsonaro atrapalhou parte do seu sonho. O vírus, o que restava. Nem pensar que pedirá demissão de novo. Pediu três vezes. Há controvérsia a respeito: dizem que foram quatro. Mas essa não é a hora de pedir de novo. Soaria a deserção com medo do tsunami que se avizinha. O mar recuou. Vem onda gigante.
Só não vê quem não quer ou é cego. Economia não é uma ciência, embora os economistas se comportem como se fossem cientistas. Há previsões para todos os gostos sobre o tamanho do PIB ao final do ano e uma única certeza: ele afundará. 2020 será mais um ano perdido, e tudo indica que o próximo também.
À parte sua admirável ignorância quando se trata de economia e da maioria dos assuntos, deve ser por isso que Bolsonaro insiste em continuar brigando com moinhos de vento. Parecia ter dado um passo adiante ao admitir que a situação é grave. Deu outro atrás ao desmerecer o coronavírus, rebaixando-o à condição de gripezinha.
O ex-presidente chinês Mao Tse-Tung ensinou que se deve dar dois passos a frente para, se fosse o caso, dar um atrás. Bolsonaro aprendeu a marchar, ora para a direita, ora à esquerda, ao gosto do comandante. E a considerar cumprida a ordem sem que tivera tempo de executá-la. Soldado de chumbo, cabeça de papel.
No momento em que o país mais precisa de um presidente pulso forte, inspirado e condutor seguro dos que governa, é justamente quando não tem. E por tudo que Bolsonaro já demonstrou, não terá até o final do seu mandato. Donald Trump criou um personagem, mas sabe se afastar dele quando necessário
Bolsonaro, não. Ele se apresenta do jeito que é, que sempre foi. A reeleição de Trump subiu no telhado e, de lá, poderá cair ou descer em novembro. A reeleição de Bolsonaro daqui a dois anos começou a escalar a parede da casa. Tomara que tudo isso passe logo – coronavírus e Bolsonaro. Os dois são mortais.
Na próxima eleição presidencial, antes de digitar na urna o número do seu candidato, passe álcool gel nas mãos. E vote melhor.