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O Brasil não ouve o Brasil

Difícil é travar o tão necessário debate racional frente a tantos oportunistas. No caso de Marielle, deveriam envergonhar os interlocutores.

Por Mary Zaidan
Atualizado em 18 mar 2018, 13h14 - Publicado em 18 mar 2018, 10h00

Sempre que se vê diante de crises agudas – e esse tem sido um cenário recorrente -, o status quo reage com indignação e contundência. E arremata seus discursos com a lengalenga de defesa da democracia e da estabilidade institucional, enquanto ambas cambaleiam.

E aí não há meio termo. São tempos em que o preço da paz é a negociação com o crime. Em que o Estado ou é bandido ou é refém da bandidagem.

Algo sabido, agora escancarado ao mundo com a execução brutal da vereadora Marielle Franco e do motorista Anderson Gomes.

Enquanto milhares ocupavam as ruas do centro do Rio e de várias cidades do país, Ágatha, a viúva de Anderson, dava um depoimento simbólico: “a revolta existe, mas a dor é maior. Estamos imersos nisso que está acontecendo. Estamos nos acostumando. Como dizem, é mais um. São várias pessoas nessa mesma situação no Rio de Janeiro”.

É mais um.

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Com sete assassinatos por hora, índice de 2016, computado pelo Atlas Brasileiro da Violência, o Brasil lidera o ranking mundial de homicídios. No Rio, só em janeiro deste ano foram registrados 688 tiroteios, quase um por hora, 146 mortos à bala, 158 feridos, duas dezenas deles, policiais.

Diante desses números, difícil falar em ordem institucional ou mesmo em democracia.

Mais difícil ainda é travar o tão necessário debate racional frente a tantos oportunistas. No caso de Marielle, tão despudorados que deveriam envergonhar os interlocutores. Nas redes sociais, as discussões entre os extremos sobre o crime causam náusea e alimentam desesperanças de que a violência contra ela possa, como torcem as pessoas de bem, induzir mudanças de fundo de que o país tanto necessita.

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Rápido no gatilho, o PSOL, partido de Marielle, pediu à Suprema Corte a suspensão da intervenção federal na segurança do Rio, corroborando a tentativa da esquerda de jogar a morte da vereadora no colo do presidente Michel Temer.

Autoridades públicas repetem mesmices. No dia seguinte à barbárie, não faltaram brados de repúdio, de Temer aos ministros do STF, dos parlamentares ao Ministério Público. Foram criadas comissões de acompanhamento do caso na Câmara e no MPF, falou-se até de federalização das investigações. Tudo parecido ao que se disse na execução, também icônica, da implacável juíza Patrícia Acioli, há sete anos, em Niterói.

Tudo que nada é.

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Nada que políticos, ministros, juízes ou promotores dizem dialoga com um país que rejeita seus dirigentes, não confia na Justiça e teme a polícia.

Esse é o alerta embutido nos gritos dos que foram às ruas por Marielle. Seria melhor ouvi-lo.

Mary Zaidan é jornalista. E-mail: zaidanmary@gmail.com Twitter: @maryzaidan 

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