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Por Coluna
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Dois Brasis (José Paulo Cavalcanti Filho)

Seu José, inocente

Por José Paulo Cavalcanti Filho
Atualizado em 30 jul 2020, 18h51 - Publicado em 26 jun 2020, 12h00

Seu José veio, do interior, para conhecer o verde mar de Boa Viagem. Vestiu um calção velho e foi provar o gosto daquela água com a qual sonhou toda vida. Mas, assim que deu o primeiro mergulho, encostou uma patrulha. “Não sabe que é proibido?, vagabundo. E o Covid?”. Seu José, inocente, “Estou só tomando um banho salgado”. “E ainda tem a coragem de nos insultar, dizendo Abaixo a Polícia?”. “Desculpe, doutor, mas eu nunca disse Abaixo a Polícia”. “Acabou de dizer”. E o pobre homem acabou preso. Por desacato.

Dia seguinte, saiu sua foto nos jornais. Com algemas. No meio dos tiras. Afinal solto, uma semana depois, bateu pé à procura de trabalho. Só que, nos lugares onde andou, as pessoas tinham visto aquela imagem. E ninguém se mostrou disposto a contratar um criminoso. Quando findou seu pouco dinheiro imaginou que, na prisão, ao menos teria onde comer. E dormir. Voltou à mesma praia e encontrou os guardas que o prenderam. Virou-se para o sargento e gritou, bem forte, “Abaixo a Polícia”. Certo de que iria em cana. Sem saber que havia já passado essa tara coronaviriana de prender. Pegava mal, nas vésperas de uma eleição. Razão pela qual restou, a Seu José, apenas cumprir sua penitência. Longe das penitenciárias.

Essa crônica é adaptação de um conto de Anatole France, Crainquebille. E serve para explicitar que somos dois brasis. Um por dentro do outro. Aparentemente iguais. Embora, no fundo, bem diferentes. Há os que usam armas para assaltar e os que se armam para evitar assaltos. Os que estão atrás das grades para não sair. E os que, com medo, se trancam em apartamentos que mais parecem gaiolas. Os que sabem ter culpa e os que não sabem que são inocentes. Os que não comem com receio de lipídios e colesteróis, para manter os corpos em forma. Dentro dos apartamentos. Os mesmos que, nessa pandemia, de vez em quando batem panelas – acostumadas a camarões, bifes e batatas. Enquanto as de tantos estão vazias. São esses que se espremem nos ônibus, nos metrôs, nas ruas populares cheias de gente. Com riscos de serem infectados. E morrer, nas filas dos hospitais públicos. Em resumo, há os que contam os dias para voltar a suas rotinas de ir às compras, frequentar bons restaurantes, viajar; enquanto outros, como Seu José, vivem aspirações bem mais modestas de apenas ter um teto, um prato de comida, um cartão do Bolsa-Família.

José Paulo Cavalcanti Filho – jp@jpc.com.br

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