A última fornada de pesquisas traz dados relativamente desencontrados a respeito do governo Bolsonaro, mas os diversos institutos mostram, de forma inequívoca, o país dividido diante da principal dúvida em relação ao futuro: o impeachment do presidente da República, apoiado por 45% dos entrevistados, contra 48%, segundo o Datafolha. Com esse placar, não há hoje chances para um processo de afastamento de Jair Bolsonaro. Mas as pesquisas apontam também um quadro que parece extremamente volátil, o que talvez explique suas divergências em relação à popularidade presidencial neste momento. As águas da opinião pública estão se movimentando com rapidez, ao sabor da pandemia do coronavírus e das crises criadas dentro do Planalto. Em vinte dias, a situação poderá estar bem diferente.
Os levantamentos dos institutos Atlas e Jota/Quaest apontam queda consistente na aprovação de Bolsonaro – algo como 8 p.p. a mais na desaprovação, pelo primeiro, e uma queda de 11 p.p no índice de bom e ótimo no segundo. O Datafolha, embora reflita desaprovação clara em relação à condução das políticas contra a Covid-19, traz intacto um núcleo de 33% dos entrevistados que continuam apoiando o governo.
A curiosidade, contudo, vem na composição desse bloco de um terço do eleitorado que considera Bolsonaro bom ou ótimo. Aos poucos, parece estar havendo uma substituição de apoiadores com maior nível de renda e mais alto grau de escolaridade por outros situados na faixa que recebe até dois salários mínimos e tem instrução primária. Traduzindo, no grosso modo: os ricos estariam abandonando Bolsonaro e os pobres se aproximando dele. Um movimento aparentemente provocado pelas medidas de auxílio emergencial na crise da pandemia, como o pagamento de R$ 600 a desempregados e autônomos, e que teria significado porque essa faixa da população tem maior peso do que as demais, chegando a mais de 70% do eleitorado.
Dificilmente, porém, seria essa uma tendência duradoura, a ponto de garantir a popularidade de Bolsonaro. Em primeiro lugar, porque os programas de ajuda federal aos mais pobres têm deixado muito a desejar em termos de eficiência e efetividade. As longas filas nas portas de agências da Caixa Econômica e as trapalhadas nos anúncios do Ministério da Cidadania vem deixando claro que falta a esse governo capacidade para executar políticas sociais. Em segundo, porque, lamentavelmente, a situação tende a piorar muito, tanto em relação à tragédia da pandemia, com suas mortes e hospitais em colapso, quanto nas previsões de desemprego e recessão nos próximos meses. E sabe-se que não há recursos para a continuidade desses programas – ou, ao menos, não há intenção da equipe econômica de Paulo Guedes de dar recursos para isso quando seus três meses de vigência se esgotarem.
A falta de empatia do presidente da República em relação às vítimas da pandemia é algo que só Freud poderia explicar. Mas está diariamente nos meios de comunicação, e evidentemente não ajuda nada na preservação de sua imagem – mesmo junto àqueles que são favoráveis à flexibilização do isolamento social. Insensibilidade jamais será bem recebida pelo grande público. Quando ficar claro o quanto está sendo nociva sua influência na questão das medidas de proteção – ele baixou um decreto ampliando os serviços considerados essenciais no dia em que houve recorde de vítimas – , sobretudo se houver mais mortes relacionadas a essa flexibilização, a responsabilização, para ricos e para pobres, terá nome e endereço certo: Jair Bolsonaro, Palácio da Alvorada, sem número, Brasilia, DF.
Helena Chagas é jornalista