Bolsonaro e os riscos em São Paulo e no Rio (por Helena Chagas)
Mais a perder do que a ganhar

Há alguns meses, Jair Bolsonaro nem sonhava com a perspectiva de participar da campanha eleitoral deste ano — não porque não quisesse magoar aliados que concorressem entre si, mas pelos riscos de contaminá-los com o próprio desgaste e se ver sócio de uma série de derrotas Brasil afora. Deu sorte. O pagamento do auxílio emergencial na pandemia melhorou sua popularidade e agora os candidatos do campo da centro direita o veem como eleitor, requisitando apoio. O que combina com o atual espírito de deslumbramento político do presidente que, encantado consigo mesmo, só pensa na reeleição. Como muda muito de ideia, ninguém se surpreenderá se recuar no anúncio de ficar fora da eleição no primeiro turno. Com todo o bem que faz ao ego de um sujeito ser convidado para subir em palanques, porém, Bolsonaro deveria pensar duas vezes antes de tornar o pleito municipal um pré-vestibular para 2022. Pode ter mais a perder do que a ganhar.
Nas duas principais capitais do país – onde vitórias e derrotas são mais visíveis e têm maior impacto político — há chances razoáveis de derrota do bolsonarismo. Se travar em São Paulo um duelo com o governador e pré-candidato João Doria, por exemplo, o presidente fará justamente o que ele quer. O governador organizou em torno da chapa de reeleição de Bruno Covas uma aliança de dez partidos, incluindo PSDB, MDB e DEM, que vem sendo apontada como um embrião para a eleição presidencial. Covas, por sua vez, é um candidato bastante viável: atual prefeito, tem avaliação boa da atuação na pandemia e também uma história pessoal comovente de quem trabalha ao mesmo tempo em que luta contra um câncer.
Bolsonaro, que ainda não declarou publicamente qualquer apoio mas estaria sendo pressionado a fazê-lo, tem até um nome forte na capital paulistana, o deputado Celso Russomano, do Republicanos – agora partido dos filhos Flavio e Carlos. Mas o deputado, que nos bastidores foi estimulado pelo Planalto a concorrer, sofre da fama de “cavalo paraguaio”, aquele que larga na frente mas não ganha a corrida. Isso ocorreu nos dois últimos pleitos para a prefeitura. Soma-se ainda o fato de Russomano disputar na mesma raia de Covas e da candidata do PSL, Joice Hasselmann – alvo de uma operação de retirada de candidatura que não funcionou esta semana. Medidas e pesadas as chances, é arriscado, para o presidente da República, entrar de cabeça e acabar batido na maior cidade do país, seja pelo adversário Doria ou qualquer outro. Embora dividida, a esquerda poderá surpreender com o candidato do PSOL, Guilherme Boulos, nas últimas pesquisas embolado na segunda colocação com Russomano e Márcio França (PSB), atrás de Covas.
Na segunda maior capital do “Triângulo das Bermudas”, como chamava Ulysses Guimarães, o risco de Bolsonaro sair chamuscado é maior ainda. Seu candidato no Rio não poderia deixar de ser o prefeito Marcelo Crivella, também do Republicanos, que já padecia de baixa popularidade antes mesmo de começar a ser investigado por corrupção, na semana passada. Ninguém sabe o bicho que vai dar por lá, onde o postulante que parecia mais forte, Eduardo Paes (DEM), virou alvo da Lava Jato por acusações de Caixa 2 em eleições passadas. Mas sabe-se que, hoje, são extremamente arriscadas as apostas na reeleição de Crivella, que cobra o apoio presidencial. Talvez por isso, o bolsonarismo tenha lançado de última hora o deputado Luiz Lima pelo PSL, partido pelo qual o presidente se elegeu e com quem havia rompido, mas que agora é alvo de uma reaproximação. Lima tem chances rarefeitas, mas funciona como desculpa para Bolsonaro não declarar apoio ao prefeito.
É por aí que, no entorno presidencial, alguns acham que não vale a pena o desgaste. Raciocinam que, se mantiver distância regulamentar do primeiro turno e seus candidatos vencerem, ainda assim Bolsonaro poderá cantar vitória. Já se mergulhar de cabeça nas campanhas e perder, estará colado às derrotas – nada bom para quem tem ambições em 2022.
Helena Chagas é jornalista