É proibido proibir o que a lei eleitoral permite, mas Caetano foi vetado
Paula Lavigne e advogados contam como cumpriram todas as exigências da legislação para o evento de arrecadação em favor de Manuela e Boulos
A produtora Paula Lavigne e o cantor Caetano Veloso são hoje prova viva de que, mesmo com os avanços na legislação eleitoral brasileira nos últimos anos, ainda há atrasos e erros na leitura das normas que regulamentam atos de campanhas políticas durante as eleições.
Os candidatos Manuela D’Ávila (PCdoB) e Guilherme Boulos (PSOL), que disputam respectivamente as prefeituras de Porto Alegre e de São Paulo, anunciaram recentemente um show fechado de Caetano para arrecadação de recursos financeiros – tipo de evento que é permitido pela legislação eleitoral.
No entanto, a Justiça entendeu de outra forma. Acreditou ser algo semelhante a um showmício aberto ao público, que é proibido no período eleitoral, e impediu a realização do evento. Acontece que trata-se de um ato de arrecadação de campanha, como almoços e jantares, e seguia a orientação da legislação eleitoral de ser fechado, com a divulgação de data e hora.
À coluna, Paula Lavigne afirmou estar confiante no recurso feito à Justiça. “Fomos atrás de juristas. Caetano está longe de querer fazer uma coisa fora da lei. Antes dessa proposta, consultamos advogados e todo mundo diz que isso é legal. Realmente, a gente não está entendendo o que está acontecendo. Só por que é música? Não é showmício, não é ‘livemício’. Não tem abuso econômico”, ponderou.
Na avaliação dela, gera estranheza a decisão pela proibição do evento. “Não tem justificativa. Nós estamos [organizando] um evento fechado para arrecadação, que você tem que comprar o ingresso. Não é de graça”, afirmou Lavigne.
A produtora está acompanhada de diversos juristas e especialistas da área eleitoral, entre eles Maria Claudia Buchianeri Pinheiro, Marilda Silveira, Ana Carolina Clève e o ex-ministro do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Henrique Neves. Um dos pontos demonstrados é que não se trata, no caso de Caetano, de evento de entretenimento gratuito, num ato de promoção de candidatura.
“E por que a lei faz isso [em relação a eventos públicos]? Porque ela entende que quando se oferece gratuitamente ao eleitor uma diversão, uma arte, isso acaba se convertendo em um fator de arregimentação artificial de público. A pessoa vai não porque gostaria de ouvir o candidato, mas pelo show e apresentação, o que quebra a autenticidade do ato de comparecimento do eleitor”, afirma Maria Claudia Buchianeri Pinheiro.
Com as recentes mudanças no financiamento de campanhas eleitorais, que restringiu o acesso às doações, ficou regulamentado que os candidatos podem produzir eventos fechados para a arrecadação de valores para as suas candidaturas. Em parecer sobre o caso de Caetano, Henrique Neves afirmou que “a realização de evento de arrecadação não é primordialmente destinada a obtenção do voto daqueles que efetuam doação eleitoral para financiar a campanha”.
“Seria redundante tentar convencer quem já apoia a candidatura. A finalidade do evento é arrecadar doações eleitorais para quem já é o candidato da preferência do participante. A sua realização, além de admitida pela legislação, é fiscalizada pela Justiça Eleitoral, a quem […] deve ser comunicada com antecedência”, escreveu Henrique Neves.
Perguntada se a decisão que está impedindo o evento gera frustração, Paula Lavigne afirma que sim. Para ela, há uma má vontade da Justiça. “Não justifica. Acaba atrapalhando. Bem ou mal, já estamos duas semanas nessa. Podíamos estar vendendo ingresso. Poderia estar arrecadando para eles [Manuela e Boulos], e acaba atrasando”.
O evento fechado de Caetano estava previsto para ocorrer no dia 7 de novembro em plataforma digital, e com a cobrança de R$ 60 por acesso. O ingresso iria direto para o financiamento das campanhas de Manuela D’Ávila e de Guilherme Boulos.
A esperança de Lavigne e Caetano, agora, é que o recurso seja analisado a tempo da arrecadação dos apoios. Para evitar injustiças, seria bom que a decisão fosse tomada de forma célere, o que nem sempre acontece no Brasil. É proibido proibir o que a lei permite.