Os seis sapos que Moro engoliu (ou ainda está engolindo) no governo
Anunciado como superministro no início do governo Bolsonaro, ex-juiz da Lava Jato acumula constrangimentos em série com a adoção de medidas que não aprova
Sergio Moro largou a toga e um tratamento de estrela no Judiciário brasileiro para tentar voo mais alto: chegar ao Supremo Tribunal Federal (seria como ‘ganhar na loteria’, disse ele) após uma passagem marcante como ministro da Justiça e Segurança Pública do governo Jair Bolsonaro.
Chegou com status de superministro – ao lado de Paulo Guedes (Economia) -, aumentou a musculatura da pasta, com a anexação do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), encheu o ministério de integrantes e ex-integrantes da Lava Jato e lançou um pacote ambicioso para a segurança pública.
Mas o caminho tem sido acidentado. Em pouco mais de quatro meses de governo, ele já acumula ao menos seis ‘sapos’ – expressão popular para coisas que temos que aceitar meio a contragosto -, sendo o último nesta quinta-feira: a tentativa de deputados de retirar o Coaf de suas mãos.
Relembre outros momentos que não agradaram ao ex-todo poderoso da luta contra a corrupção:
Decretos sobre armas
Na verdade, foram dois sapos em um. Em janeiro, Moro assinou junto com Bolsonaro um decreto flexibilizando as regras para compra e posse de armas no país, mesmo sem concordar com a medida. Na cerimônia de assinatura, ele não falou com a imprensa. Mais tarde disse à GloboNews que “na proposição de uma política pública, sempre há discussão intensa” e que “as pessoas muitas vezes divergem e há mudanças de posição”. Nesta semana, mais do mesmo: um novo decreto facilitou o acesso a armas a várias categorias profissionais, como políticos, caminhoneiros e repórteres. E a resposta constrangida de Moro foi parecida: ‘Não tem a ver com a segurança pública. Foi uma decisão tomada pelo presidente em atendimento ao resultado das eleições”, afirmou.
Ilona Szabó
Em fevereiro, Moro nomeou Ilona Szabó, cientista política e diretora do Instituto Igarapé, ONG especializada em estudos sobre segurança pública, como suplente do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária. A nomeação causou um alvoroço nas redes sociais bolsonaristas, que criticaram a decisão por considerar a socióloga uma “desarmamentista” e defensora de políticas de direitos humanos. Após ser pressionado pelo próprio Bolsonaro, Moro desistiu da nomeação e pediu desculpas a Ilona. Em nota, disse que “diante da repercussão negativa em alguns segmentos, optou-se por revogar a nomeação, o que foi previamente comunicado à nomeada e a quem o ministério respeitosamente apresenta escusas”.
‘Sabão’ de Maia
Outro momento constrangedor para Moro foi a reprimenda pública que recebeu de Rodrigo Maia (DEM-RJ), aliado estratégico para os interesses do governo Bolsonaro, ao cobrar do presidente da Câmara maior agilidade à tramitação de seus projetos sobre segurança pública. Maia ficou irritado com a cobrança, chamou o ministro de inconveniente em conversas com aliados e atacou: “ O funcionário do presidente Bolsonaro? Ele conversa com o presidente Bolsonaro e, se o presidente Bolsonaro quiser, ele conversa comigo”, disse. E emendou, sobre os projetos do ex-juiz: “Ele está copiando o projeto direto do ministro Alexandre de Moraes. É um copia e cola. Não tem nenhuma novidade, poucas novidades no projeto dele”, disse.
Quem fica com os índios?
Na reforma administrativa que está em discussão no Congresso, Moro pode acumular três sapos. Um deles envolve a Funai (Fundação Nacional do Índio) – o ministro não quer o órgão em sua pasta, mas a comissão mista que discute a questão aprovou exatamente isso. A intenção do presidente Bolsonaro e de Moro era colocar a Funai na pasta de Damares Alves (Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos). Em abril, o ministro descartou a volta da questão indígena para sua pasta e disse que atualmente índio não é uma questão de polícia. “Essa é uma decisão do governo federal, está no Congresso. No fundo, foi uma decisão tomada, acho uma decisão correta”, disse.
Divisão do ministério
Outro sapo veio de onde Moro menos esperava: Major Olímpio, líder do PSL no Senado e um dos aliados de primeira hora do governo Bolsonaro, afirmou que vai defender, na mesma reforma administrativa que discute o Coaf e a Funai, que o Ministério da Justiça e Segurança Pública volte a ser apenas o Ministério da Justiça e que a segurança pública ganhe uma pasta independente. “Eu (…) defendo que é importante ter um ministério só para abarcar a estrutura policial. Já conversei com o ministro Moro em outras oportunidades. Ele tem uma visão diferente”, afirmou Olímpio ao jornal O Globo. Segundo o jornal, os partidos do chamado Centrão esperam a posição do PSL sobre o assunto.
Coaf
Essa promete ser a derrota mais dura do ministro Moro. A comissão mista da reforma administrativa do Congresso aprovou nessa quinta-feira 9 a volta do Coaf ao Ministério da Economia, de onde tinha sido tirado por Bolsonaro logo ao assumir o governo – inclusive para agradar a Moro, que acha fundamental que a estrutura, que monitora movimentações financeiras suspeitas, fique sob sua alçada. O ex-juiz chegou a se empenhar pessoalmente em diálogos com parlamentares para garantir que o Coaf ficasse no Ministério da Justiça, mas a derrota na comissão mostrou que as conversas não foram suficientes. O texto ainda vai passar pelos plenários da Câmara e do Senado. Parlamentares investigados, principalmente do Centrão, trabalham para tirar o órgão das mãos de Moro, o que deve dificultar a pretensão do ministro. Como consolo, Paulo Guedes, ministro da Economia, prometeu manter a diretoria do Coaf nomeada pelo ex-magistrado.