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Leniência militar produziu Bolsonaro-Pazuello

General da ativa, Eduardo Pazuello atropelou regras de ética, profissionalismo, hierarquia e disciplina que proíbem o engajamento de militares na política

Por José Casado Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 24 Maio 2021, 12h44 - Publicado em 24 Maio 2021, 09h20

Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, 63 anos, cearense de Igatu, vai tomar uma decisão que, provavelmente, é a mais difícil dos seus 47 anos na carreira militar.

O comandante do Exército terá de decidir o que fazer com o general Eduardo Pazuello, que ontem subiu no palanque e participou de um comício do presidente-candidato Jair Bolsonaro no Rio.

Pazuello, como o seu comandante, tem mais de quatro décadas de serviço na caserna, mas resolveu não seguir o ritual estabelecido no Exército: atropelou todo um conjunto de regras de ética, profissionalismo, hierarquia e disciplina que proíbem o engajamento de militares da ativa na política partidária.

LEIA TAMBÉM: A última transgressão de Pazuello na ativa

O ex-ministro da Saúde assumiu o risco. As sanções possíveis oscilam em gravidade crescente, da advertência ao “licenciamento e exclusão a bem da disciplina”.

Jair Bolsonaro sabe o significado disso. Três décadas atrás, no governo José Sarney, ele foi preso e processado por anarquia. Esteve envolvido num plano atentados na Vila Militar, no Rio — revelado pela repórter Cassia Maria, de Veja.

O vice-presidente Hamilton Mourão também conhece o sentido da quebra da disciplina e da hierarquia. Perdeu o comando Sul no governo Dilma Rousseff por incitar um golpe de Estado para “descarte da incompetência, má gestão e corrupção”. Transferido, amargou uma temporada no “Departamento de Escadas e Corredores” do Quartel-General em Brasília.

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Em 2017, no governo Michel Temer, voltou a pregar um golpe. Acabou conduzido à reserva por seu comandante na época, Eduardo Villas Bôas.

No ano seguinte, o próprio Villas Bôas arriscou uma intervenção na política. Em nome do Exército divulgou mensagem sobre o risco de “impunidade” no Supremo, na véspera do julgamento de um habeas corpus do ex-presidente Lula. “O conteúdo foi discutido minuciosamente por todos nós”, contou em entrevista ao historiador Celso Castro, da Fundação Getulio Vargas.

O general Villas Bôas foi “um dos responsáveis” pela eleição de Bolsonaro, como já disse o presidente-candidato em agradecimento público. Não foi o único entre os chefes de quartéis.

A cúpula das Forças Armadas aceitou que Bolsonaro realizasse um amálgama dos seus interesses com os das instituições militares. Da leniência surgiu a confusão.

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O presidente deu ao governo uma moldura militarista e passou a tratar Exército, Marinha e Aeronáutica como órgãos de governo, quando a Constituição define como instituições do Estado.

Bolsonaro fez comício na porta do QG do Exército com plateia pedindo intervenção armada, entregou a gestão da pandemia a Walter Braga Netto, que passou à reserva um mês antes de assumir a Casa Civil, e ao general Pazuello, no Ministério da Saúde, entre outros militares.

Pazuello se tornou um símbolo da perda do controle governamental na gestão da pandemia, como está sendo demonstrado pela CPI na autópsia da crise, que ainda não terminou.

Não esteve no comício de Bolsonaro por acaso. Imagens de televisão mostram a sua chegada, a travessia pela multidão no Aterro do Flamengo, a apresentação nas barreiras de segurança e a subida ao palanque e o discurso homenagem ao chefe político.

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Virou protagonista daquilo que pode vir a ser uma crise militar.

Se for punido pelo comandante do Exército será referência da manutenção da disciplina, da ordem constitucional e da equidistância entre os quartéis e o governo Bolsonaro – algo que custou a demissão dos chefes do Exército, Marinha e Aeronáutica no mês passado.

Se não for punido, Pazuello terá demonstrado que a hierarquia e a disciplina militar existem, mas só valem para patentes inferiores.

Há, também, a possibilidade regulamentar de ser punido e, na sequência, acabar perdoado pelo chefe político. Nesse caso, estaria, na prática, liberada a anarquia nos quartéis — como temia o general Ernesto Geisel, que precisou demitir seu ministro do Exército, Sylvio Frota, para mandar a tropa de volta aos quartéis.

O primeiro movimento, agora, será de Paulo Sérgio Nogueira de Oliveira, comandante do Exército.

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