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Ver Pelé em campo é ser feliz

Augusto Nunes Pode ser que haja alguma lógica em toda loucura ─ menos no Brasil. Porque é uma loucura sem vestígios de lógica o tratamento áspero dispensado por tantos habitantes do País do Futebol ao maior jogador de todos os tempos, penso no meio da revisita a Pelé Eterno, o admirável documentário de Aníbal Massaini […]

Por Augusto Nunes Atualizado em 31 jul 2020, 13h51 - Publicado em 23 out 2010, 16h28

(Foto: John Pratt/Keystone/Getty Images)

Augusto Nunes

Pode ser que haja alguma lógica em toda loucura ─ menos no Brasil. Porque é uma loucura sem vestígios de lógica o tratamento áspero dispensado por tantos habitantes do País do Futebol ao maior jogador de todos os tempos, penso no meio da revisita a Pelé Eterno, o admirável documentário de Aníbal Massaini lançado em 2004. E aproveito o dia do aniversário do gênio para retomar um tema que costuma provocar saudáveis divergências entre os craques do timaço de comentaristas.

Espantosamente, a nação ainda confunde Edson Arantes do Nascimento com Pelé, e atribui equívocos eventualmente cometidos por sua camuflagem humana à entidade de tal modo misteriosa que a nenhum mortal será dado compreendê-la. Espantosamente, existem brasileiros incapazes de enxergar os abismos siderais que separam o mineiro agora setentão de um deus atemporal.

Em qualquer país, as filas de espectadores ansiosos pelas imagens de Pelé Eterno se teriam estendido por centenas de quilômetros, provocariam assombrosos engarrafamentos humanos ─ e ai de quem traísse algum indício de contrariedade, porque o mais dissimulado sinal de insatisfação haveria de configurar uma afronta intolerável aos milhões de súditos mobilizados para a reverência coletiva ao monarca do Reino do Futebol. Mas o Brasil não é um país qualquer.

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Se o protagonista do filme deslumbrante fosse Maradona, por exemplo, as salas de cinema da Argentina estariam com lotação esgotada até 2050, pais em êxtase esperariam dias inteiros na fila carregando bebês de colo, avós presuntivos estariam disputando a socos e pontapés o ingresso para o neto que nem nasceu. Mas isto é o Brasil, insista-se. O país que transforma um Lula em campeão de popularidade não soube comover-se como exibia a esplêndida viagem pelas proezas do gênio que alcançou a perfeição absoluta.

Pelé foi acusado de demagogo por ter pedido atenção para as crianças na noite do milêsimo gol. Lula, um gigolô de adultos infantilizados pela esmola institucional, faz mil comícios por mês explorando impunemente a inconsciência das multidões estacionadas na primeira infância. O gênio irretocável é cobrado por miudezas. O gênio de araque reincide acintosamente em crimes graves e é tratado como inimputável. O Rei era ridicularizado quando cometia erros em inglês. O ignorante promovido a monarca assassina o português sob os aplausos dos áulicos.

Pelé Eterno mostra quase 400 gols e dezenas de jogadas inverossíveis do artista irrepetível, do Rei sem herdeiros. Graças ao documentário, os que não viram a lenda em campo enfim tiveram de acreditar que existiu mesmo alguém com o arranque de Garrincha e a ginga de Muhammad Ali, capaz de levitar e mover-se no espaço como Nureyev, sobrevoar o palco da exibição como Michael Jordan, dissimular os movimentos seguintes como um Marlon Brando e manter todo o tempo o gramado inteiro sob a estreita vigilância de quem alcança, com olhar de fera, o milagre dos 360 graus.

Graças às imagens resgatadas por Aníbal Massaini, os que viram Pelé em ação puderam ter certeza de que aquilo tudo acontecera, embora parecesse sempre um sonho. O Atleta do Século tinha mesmo equilíbrio de ginasta, rapidez de velocista, força de decatleta, resistência de maratonista, coragem de brigador de rua. Com pouco mais de 1,70m, chegava mesmo a altitudes inatingíveis para os pobres gigantes adversários que tentavam impedir a cabeçada letal. Aquele jovem nascido destro aprendera mesmo a fazer aquilo tudo também com a perna esquerda, e com tão soberba destreza que depois de certo tempo ninguém mais soube qual fora a escolha original da natureza.

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Que Maradona, que nada. Como comparar qualquer outro ao craque que ganhou a primeira Copa do Mundo aos 17 anos ─ e nos 17 seguintes seria titular absoluto da Seleção Brasileira? E faria 1.281 gols, e provaria com os que por muito pouco não fez que no futebol pode haver a imperfeição mais que perfeita? Que apressaria o imediato cessar-fogo entre exércitos que preferiam perder a guerra civil a perder uma apresentação do Rei, e que adiavam o ataque inadiável para vê-lo atacando, solitário e invencível, a grande área inimiga?

Pelé está completando 70 anos em outubro. Em homenagem ao mágico incomparável, o documentário deveria ser reapresentado em todas as cidades, todos os lugarejos. E todo brasileiro deveria ser obrigado por lei a arquivar momentaneamente inquietações de todos os gêneros para viver duas horas de deslumbramento na sala escura. Porque ver Pelé em campo ─ isto sim ─ é ser feliz.

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