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Crise do clima esvazia Canal do Panamá e países buscam rota alternativa

Pior estiagem do século fez evaporar lagos que abastecem a hidrovia, e comércio global começa a ser seriamente afetado

Por Ernesto Neves Atualizado em 7 Maio 2024, 16h23 - Publicado em 15 jan 2024, 12h11
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  • A situação do Canal do Panamá se agravou nas últimas semanas, quando a seca que afeta toda a América Central fez baixar ainda mais o nível de suas águas.

    Responsável por ligar os oceanos Pacífico e Atlântico, o canal possui 80 quilômetros de extensão e é a via mais crucial para o transporte de carga marítmo do planeta.

    Mas uma seca histórica, provocada pela combinação entre o fenômeno El Niño e as mudanças climáticas, vem afetando seriamente sua capacidade de funcionamento.

    Normalmente, a estação da estiagem teria chegado ao fim em agosto. Mas a precipitação ao longo de 2023 foi a mais baixa desde o início do século.

    Como resultado, na última sexta (12),  a gigante naval Maersk informou aos clientes que navios de carga oriundos de países como Austrália e Nova Zelândia não mais cruzarão a hidrovia.

    Ao invés disso, a Maersk utilizará meios terrestres para transportar suas cargas.

    A decisão da Maersk é mais um desdobramento de uma crise que se arrasta desde o início de 2023, e ganhou contornos mais dramáticos nas últimas semanas.

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    Como resultado, a Autoridade do Canal do Panamá implementou uma série de reduções no tráfego de navios, num esforço para conservar água.

    No Oceano Pacífico, navios esperam para cruzar o Canal do Panamá. As autoridades panamenhas anunciaram restrições ao transporte marítimo devido a seca que afeta as principais fontes de água do canal
    No Oceano Pacífico, navios esperam para cruzar o Canal do Panamá. As autoridades panamenhas anunciaram restrições ao transporte marítimo devido a seca que afeta as principais fontes de água do canal (Getty/Getty Images)

    Em condições normais, entre 34 e 36 navios atravessavam o canal por dia.

    Mas, de acordo com as autoridades do Canal do Panamá, a estiagem exige que se reduzam o número de trânsitos diários de 29 para 25.

    E o trânsito pode cair ainda mais até fevereiro, quando prevê-se que não mais de 18 embarcações possam cruzá-lo diariamente. Isso representa cerca de metade da capacidade total.

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    Houve também redução no peso que os navios podem transportar, já que o canal hoje opera com calado mais baixo que o normal.

    O sistema de funcionamento do Canal é baseado no uso de água doce para fazer os mega navios de carga, alguns com 350 metros de comprimento, flutuarem entre os dois o oceanos.

    Ao entrar na estreita hidrovia, os navios sobem mais de 26 metros acima do nível do mar até o Lago Gatun, artificial, através de uma série de eclusas.

    Do outro lado do canal, o processo é inverso e os navios descem ao nível do mar através de outra série de eclusas antes de deixarem a via aquática.

    Esse sistema de bloqueio depende da água doce do Lago Gatun para funcionar.

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    Cada navio utiliza cerca de 200 milhões de litros de água doce na travessia, e a maior parte dessa água acaba sendo despejada no mar.

    Para complicar ainda mais o cenário, as mesmas fontes também abastecem mais de metade dos 4,3 milhões de habitantes do Panamá.

    Isso vem forçando as autoridades a equilibrar as exigências do transporte marítimo internacional com as necessidades dos habitantes locais.

    As restrições de carga impostas ao Canal do Panamá têm enorme impacto no fluxo de comércio global.

    Ao conectar o Atlântico ao Oceano Pacífico, o canal revolucionou o transporte marítimo global quando foi inaugurado, em 1914.

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    A obra eliminou a necessidade de contornar o perigoso extremo sul da América do Sul, encurtando a viagem em mais de 13.000 quilômetros.

    Não há alternativas viáveis no curto prazo

    Em 2022, mais de 14.000 navios atravessaram o Panamá, transportando combustível, grãos, minerais e mercadorias das fábricas da Ásia para os consumidores em países das Américas.

    Para se ter uma ideia de sua importância, mais de 40% dos bens de consumo comercializados entre a Ásia e a costa leste dos Estados Unidos passam por li.

    Hoje, porém, empresas que necessitam do Canal precisam esperar semanas numa fila para conseguir passar pela hidrovia.

    Quem tem mais urgência e não pode esperar acaba tendo que pagar até 4 milhões de dólares para passar à frente.

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    Outra opção é evitar totalmente a rota, acrescentando dias ou semanas à  jornada.

    Mas cada uma destas escolhas acarreta em sério custo financeiro para os comerciantes.

    Para piorar, a outra opção, o Canal de Suez, no Egito, enfrenta as tensões geopolíticas do Oriente Médio.

    Ataques de terroristas islâmicos Houthis, do Iêmen, à rota do Mar Vermelho, fizeram com que boa parte das empresas cancelassem suas rotas pela região.

    Economistas alertam que é enorme a pressão sobre as cadeias de abastecimento globais, o que pode desembocar em escassez de produtos e mais inflação no curto prazo.

    Países se movimentam

    A crise que afeta o Panamá já provoca a movimentação de nações próximas.

    O México está em vias de concluir um projeto ousado e anunciado há décadas, o chamado Corredor Interoceânico. 

    Trata-se da modernização de 300 quilômetros de ferrovias que atravessam o sul mexicano, ligando o Pacífico ao Atlântico.

    O governo do presidente Andrés Manuel López Obrador anunciou ainda que planeja lançar mais duas linhas ferroviárias ainda em 2023. 

    Na Colômbia, o presidente Gustavo Petro afirmou que planeja erguer uma ferrovia ligando o porto de Buenaventura, no Pacífico, ao Caribe. 

    Há ainda o Corredor Bioceânico de Capricórnio, uma rodovia que atravessa Bolívia, Brasil, Argentina, Paraguai e Chile. Esse corredor já está parcialmente construído.

    Navio de carga atravessa as eclusas em Miraflores, no Canal do Panamá. País impôs limites à travessia diária em 2023
    Navio de carga atravessa as eclusas em Miraflores, no Canal do Panamá. País impôs limites à travessia diária em 2023 (Getty/Getty Images)
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