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Como uma comunidade na Escócia quer recuperar florestas e animais

Defensores do meio ambiente no país britânico se dedicam a criar tradições relacionadas ao uso da terra para as gerações do futuro

Por Jennifer Ann Thomas Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO 26 jan 2022, 14h54

Enquanto no Brasil o desmatamento avança ano a ano, há países que investem para restaurar o que foi devastado ao longo de séculos. No início de 2022, o governo escocês anunciou o investimento de 12.5 milhões de libras (o equivalente a cerca de 17 milhões de dólares, ou quase 100 milhões de reais) em projetos que ajudem a combater a crise climática e a perda de biodiversidade com ações de restauração.

A primeira edição do fundo foi anunciada em julho de 2021 e a iniciativa faz parte de um investimento total de 500 milhões de libras. De acordo com a ministra escocesa da Biodiversidade, Lorna Slater, “o ambiente da Escócia já está fortemente degradado e a vida selvagem está em declínio aqui, assim como em todo o mundo”. 

A cerca de 200 quilômetros de Edimburgo, capital da Escócia, moradores da Comunidade Florestal de Kilfinan percebem no dia a dia os impactos da degradação – e eles se dedicam a reverter este cenário para que as novas gerações possam ter um futuro diferente.

Em novembro de 2021, a Escócia ficou em evidência por causa da COP26, a conferência do clima das Nações Unidas. Na quarta-feira da primeira semana do evento, um grupo de indígenas visitou a área da floresta de Kilfinan. Dinamam Tuxá, coordenador-executivo da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib) e liderança do povo Tuxá, fez parte do grupo que foi ao local. 

Durante a explicação sobre o território, um dos integrantes da comunidade, o inglês Mark Bamford, afirmou que há a intenção de garantir proteção ambiental a uma área costeira próxima de Kilfinan. Tuxá perguntou como era a relação com os outros moradores do entorno. A resposta foi que, assim como em todos os lugares do mundo, algumas pessoas são céticas e não acreditam em mudanças do clima, então não dão a devida importância a esse tipo de medida. “Esses aí não comem peixe, então”, disparou Tuxá.

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A comunidade de Kilfinan comprou uma área de cerca de 500 hectares para investir no reflorestamento e recuperar a biodiversidade perdida. O entorno é marcado por plantações de pinus, que têm valor comercial, mas empobrecem o solo e são vazias em termos de biodiversidade. Por isso, os moradores da comunidade querem plantar árvores nativas, como carvalhos, para restabelecer os ciclos da floresta original. 

Apesar das diferenças entre a realidade brasileira e a escocesa, Tuxá enxergou similaridades. “A estrutura é diferente, mas o pensamento é igual. Onde tem comunidade tradicional, o objetivo é conservar e preservar a floresta e a cultura. A luta é a mesma, só é praticada de forma diferente”, afirmou. 

Enquanto no Brasil os povos originários lutam para demarcar seus territórios, proteger as florestas em pé e colocar um fim à violência contra indígenas, os moradores de Kilfinan trabalham para construir as bases daquela que será a comunidade tradicional do futuro. Segundo Bamford, uma das ações no local é com as crianças que fazem visitas escolares. “É importante que os jovens cresçam sabendo que a floresta é deles. Agora falamos que a floresta é da comunidade. Na próxima geração, será a floresta deles”, disse. 

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Na Escócia, mais de 50% das áreas rurais do país são propriedades particulares. Pouco mais de 2% do território do país é de terras comunitárias. A concentração nas mãos de poucas pessoas é reflexo de um movimento conhecido como Highland Clearances, que aconteceu no final do século 18 e no início do século 19. Nesse período, os inquilinos das Highlands — as terras altas — e de ilhas escocesas foram despejados dos territórios controlados por algumas famílias, os clãs, porque seria mais vantajoso ocupar a terra para a criação de ovelhas. 

Os escoceses expulsos migraram para lugares como Estados Unidos, Canadá, Austrália e Nova Zelândia. Agora, há uma agenda de reforma agrária que tenta reverter o processo consolidado ao longo de séculos. De acordo com o diretor de políticas públicas da Community Land Scotland, Calum MacLeod, as mudanças são benéficas para o meio ambiente e para a população. “Nos highlands, por exemplo, a população deixou a região há décadas e é preciso ter jovens por lá. Quando a comunidade é dona do território, ela consegue controlar o que acontece nele”, disse. 

Na floresta da comunidade de Kilfinan, assim como em outras no país, uma das principais questões é a falta de predadores de topo de cadeia, como lobos e linces, que foram extintos, e de outros animais com funções importantes para a manutenção do ecossistema, como texugos. Por outro lado, os veados, animais herbívoros, são um problema para a regeneração de florestas. Com uma população estimada em mais de 1 milhão de indivíduos apenas na Escócia, eles não têm um predador natural e se alimentam da vegetação rasteira, o que impede o crescimento das árvores.

De acordo com o levantamento do Biodiversity Intactness Index (BII), que avalia a biodiversidade de nações e territórios, os países do Reino Unido estão entre os piores 12% do mundo. Do total de 240 locais avaliados, a Escócia ocupa a 28ª posição do ranking, com 56% da sua biodiversidade preservada. 

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Mesmo em meio a desafios estruturais deixados como herança do período de ocupação do solo na Escócia, comunidades e governo estão dedicados a recuperar o que foi devastado. Com mais biodiversidade nas florestas, a sociedade terá benefícios com os serviços ecossistêmicos e com a mitigação dos efeitos da mudança do clima. Por lá, o esforço é de reverter o prejuízo causado pela devastação ambiental. Por aqui, há tempo para proteger e valorizar a floresta em pé, com toda a riqueza natural que vive dentro dela.

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