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Ministro Ayres Britto vota a favor do reconhecimento da união civil entre pessoas do mesmo sexo

Julgamento do STF que dá aos homossexuais os mesmo direitos dos heterossexuais deve ser encerrado nesta quinta-feira

Por Mirella D'Elia
4 Maio 2011, 19h34

O Supremo Tribunal Federal (STF) deu o primeiro passo, nesta quarta-feira, para reconhecer a união estável de casais do mesmo sexo. O ministro Carlos Ayres Britto votou a favor da tese. Ele é relator de duas ações discutidas no tribunal – uma proposta pelo governo do Rio de Janeiro, para beneficiar servidores do estado, e outra, pela Procuradoria-Geral da República (PGR), de alcance nacional – para que casais homossexuais tenham os mesmos direitos civis que casais heterossexuais, como pensão por morte ou separação, herança e declaração compartilhada do Imposto de Renda (IR).

O julgamento foi suspenso após o voto do relator e será concluído nesta quinta-feira, com os votos dos outros nove ministros – ex-advogado-geral da União, José Antonio Dias Toffoli se declarou impedido. De Britto, dono de perfil notoriamente progressista, o posicionamento já era esperado. Porém, mais do que isso, a tendência, comenta-se nos bastidores, é que haja uma decisão unânime a favor da equiparação entre a união de homossexuais e a de heterossexuais. Nada mais justo.

A Constituição de 1988 e o Código Civil reconhecem, como entidade familiar, a união estável entre homem e mulher. Nada falam de casais do mesmo sexo. A mesma Constituição, porém, tem um escopo mais amplo. Diz que, em um estado democrático de direito, existem princípios fundamentais que devem ser assegurados, como a dignidade da pessoa humana, o direito à liberdade e à igualdade. Também veda qualquer tipo de preconceito. Foi com base nesses fundamentos, apesar da lacuna constitucional quanto à união homoafetiva, que Britto desfiou seu voto em plenário, nesta quarta.

Disse ele, ao concluir sua fala, que o artigo 1.723 do Código Civil, em foco, deve ser interpretado conforme a Constituição, de forma a excluir qualquer vedação ao reconhecimento da união homoafetiva como entidade familiar. “A Constituição Federal opera com intencional silêncio. Mas a ausência de lei não é ausência do direito, porque o direito é maior que a lei. O sexo das pessoas, salvo expressa disposição constitucional em contrário, não se expressa como fator de desigualação jurídica”, afirmou. “Entre interpretar o silêncio como vedação ou autorização, a segunda interpretação é a mais correta.”

Foi com base nesses mesmos fundamentos que juízes e desembargadores já asseguram, há pelo menos 25 anos, diversos benefícios a casais do mesmo sexo em quase todos os cantos do país, nas mais diversas instâncias judiciais. Para falar com mais precisão: 1.026, segundo levantamento feito pelo escritório da advogada e desembargadora aposentada Maria Berenice Dias, especializada em direito homoafetivo. Isso sem contar os processos que ainda estão correndo.

Leia também: Em levantamento inédito, mais de 60.000 brasileiros afirmam ter cônjuge do mesmo sexo

Ora, o que os integrantes do STF farão – se confirmarem o que disse o relator – nada mais será do que consolidar jurisprudência sobre a questão. Falta a batida do martelo da Suprema Corte para sanar dúvidas e pôr fim à insegurança jurídica. Segundo levantamento da Associação Brasileira de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), a indefinição faz com que, atualmente, os casais do mesmo sexo deixem de ter assegurados pelo menos 78 direitos, como garantias sobre herança ou divórcio e declaração compartilhada do Imposto de Renda (IR).

Silêncio eloquente – Durante o julgamento, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, defendeu o reconhecimento da união estável de casais do mesmo sexo. Alinhado a Britto, ressaltou, já na etapa inicial da sessão o que tachou de silêncio eloquente da Constituição. “Não há vedação textual à união de pessoas do mesmo sexo. Esta ausência de referência não significa, de qualquer modo, o silêncio eloquente da Constituição Federal, não implica necessariamente que a Constituição Federal não assegure o seu reconhecimento. A união entre pessoas do mesmo sexo como entidade familiar é implicitamente reconhecida pela Constituição Federal e equiparada, por analogia, à união entre homem e mulher.”

O chefe do Ministério Público argumentou, também, que o estado deve reconhecer os direitos de casais homossexuais para que eles possam viver a plenitude de sua orientação sexual. “A premissa da iniciativa é a ideia de que os homossexuais devem ser tratados com o mesmo respeito e a mesma consideração que os demais cidadãos. A recusa estatal às suas uniões implica privá-los de direitos importantíssimos, como também importa menosprezo à sua própria identidade e dignidade.”

Afetos – Segundo o advogado Luis Roberto Barroso, que atua em nome do governo do Rio no caso, se, de fato, o entendimento do Supremo for favorável à união homoafetiva, qualquer cartório do país será obrigado a reconhecer e registrar a união estável de casais do mesmo sexo. Isto porque a decisão terá efeito vinculante – deve ser seguida não só por todos os tribunais do país, como, também, pela administração pública. “A união homoafetiva estável se fundamenta nos mesmos elementos da união heterossexual: afetividade e projeto de vida em comum. Se a situação é a mesma, o regime jurídico deve ser o mesmo. Do contrário, é preconceito. E isso a Constituição Federal não tolera”, disse ao site de VEJA.

Mais cedo, durante sua fala no julgamento, o constitucionalista dissera: “O que vale na vida são os seus afetos”, acrescentando que o artigo 226 da Constituição – que trata da união estável – deve ser interpretado de forma a não excluir os homossexuais.

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O advogado-geral da União, Luis Inácio Adams, pediu que o STF reconheça a união homoafetiva. “O primeiro movimento de combate à não-discriminação é a partir do estado. Temos visto violentas manifestações de agressão às relações homoafetivas. Elas só serão passíveis de combate e rejeição se o estado for o primeiro a rejeitar sua discriminação para que haja uma sociedade pluralista. O estado tem obrigação de dar exemplo.”

Os chamados amicus curiae, ou seja, aqueles que, juridicamente, são definidos como os amigos da corte por alegarem ser parte interessada em um julgamento, também falaram – sete a favor dos homossexuais e dois contra, entre eles a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).

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