The Sphere: a magia por trás da monumental arena em Las Vegas
Com a altura de um prédio de cinquenta andares e capacidade para 20 000 pessoas, ela abre as portas na cidade de todas as ilusões
Irônico até o último fio de cabelo ralo, Frank Sinatra (1915-1998) foi direto ao ponto, ácido: “Las Vegas é o único lugar onde o dinheiro realmente fala. Ele diz adeus”. Ali onde os dólares soçobram, em meio ao Deserto de Mojave, no estado americano de Nevada, tudo pode ser comprado, até as coisas mais horrendas. Vale um casamento temático com o clone de Elvis Presley, que conduz a noiva ao altar. Vale uma interminável noite de apostas nos cassinos mais luxuosos e chamativos do planeta. A vocação para a extravagância fez com que a cidade fosse comumente escolhida também para acolher as atrações de entretenimento mais chamativas do planeta.
Chegou a hora, portanto, de celebrar a Sphere. Instalada ao lado do hotel Venetian — uma espécie de réplica de Veneza —, a imensa arena tem a altura de um prédio com cinquenta andares. Começou a chamar atenção quando a gigantesca estrutura metálica, trabalhada desde 2018, ficou em pé. Depois de ser recoberta com telas de LED, em uma área equivalente a três campos de futebol, brilhou, brilhou e ofuscou os concorrentes.
A grande bola é como um camaleão, capaz de mudar de pele a um comando de algoritmo de computador. Assumiu a forma de um olho humano, depois a de uma bola de basquete, e não parou mais. Lá dentro, o espetáculo luminoso não para. Promovida pela empresa Madison Square Garden (MSG), dona do mais conhecido recinto esportivo de Nova York, a empreitada custou 2,3 bilhões de dólares. Foi pensada para chamar a atenção de quem a vê de frente e também para explodir nas telas dos cinemas e TV (e, claro, ficar bonitona nos Stories, nos Reels etc.) “É diferente de tudo o que já se viu”, disse Lucas Watson, presidente da brincadeira. “O formato esférico não é apenas um elemento de assinatura do design, mas oferece uma nova experiência às pessoas.” Ou, como carimbou o arquiteto Louis Sullivan (1856-1924), “a forma segue a função”.
A inauguração atraiu 18 000 pessoas — com ingressos a 400 dólares, em média — para assistir ao show da banda U2. Entre projeções de imagens, com bandeiras e formas caleidoscópicas, o público foi transportado à contemplação do horizonte de Las Vegas, como se o vocalista Bono estivesse cantando ao ar livre na cidade do pecado. “A estrutura redonda possibilita um efeito tridimensional a quem está assistindo”, diz Romero Tori, professor da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo (USP). Com uma vantagem: o tamanho do treco, como um IMAX potencializado, dispensa os aborrecidos e desconfortáveis óculos de realidade virtual, que prometem passeios oníricos. Na Sphere dá-se esse mergulho sem a necessidade de apetrechos. “Quando o corpo não sente nenhum equipamento acoplado a si, a experiência se torna mais real”, afirma Tori.
A magia da Sphere combina com uma das mais fortes tendências no mundo das artes — as chamadas exposições imersivas, feitas de vídeos e fotos, luzes e movimentos. Há quem vire a cara para a novidade, dada a artificialidade, mas ganharam popularidade inédita. Não dá para ir até o Louvre, olho no olho da Mona Lisa? Ela vai até você. Convém ressaltar que o recurso tecnológico ultrapassou os muros do entretenimento. “Essa tecnologia permite realizar até uma aula exploratória sobre Marte”, diz Marcelo Zuffo, coordenador do Centro Inova da USP, que acompanhou a construção da esfera de Las Vegas desde o início e já garantiu ingresso para sua próxima atração. Será a exibição do filme Postcard from Earth (Cartão-Postal da Terra), do diretor Darren Aronofsky, criado para o ambiente. Em Vegas, o céu é o limite.
Publicado em VEJA de 20 de outubro de 2023, edição nº 2864