Os lançamentos recentes que mostram a força dos carros híbridos
Em meio ao debate sobre o futuro da eletrificação na indústria automotiva, novidades apontam o modelo como o mais sensato para o momento
Quando países da Europa anunciaram que passariam a comercializar apenas carros elétricos a partir de 2030, muitos analistas decretaram que os motores a combustão estavam com os dias contados. Fabricantes anunciaram planos ambiciosos para eletrificar a frota, enquanto motoristas saudosos do ronco dos motores beberrões criticaram a medida. Agora, passado o choque inicial — e a avalanche de lançamentos a bateria no mercado, principalmente os modelos chineses —, o mercado começa a vislumbrar um modelo intermediário que faz muito sentido: os carros híbridos, que mesclam vantagens dos motores a combustão e dos plugados na tomada.
O recente lançamento duplo da Fiat aponta o caminho pelo qual o mercado brasileiro pode seguir. A empresa apresentou versões híbridas de seus SUVs Pulse e Fastback, cujos motores continuam a combustão, movidos por etanol ou gasolina, mas que ganham gerador elétrico. O sistema recarrega uma pequena bateria auxiliar que ajuda o carro em deslocamentos a baixas rotações e em trechos planos ou descidas. Ele não ajuda o carro a se mover, mas reduz as emissões e ajuda na economia de combustível. As versões que usam o sistema, chamado de Bio Hybrid, ou híbrido leve, custam pouco a mais que as versões a combustão: 2 000 reais, no caso do Pulse, e 3 000, no Fastback. A medida é relevante porque a Fiat é a atual líder de mercado, responsável por 20,9% dos veículos vendidos no país.
Há vários outros exemplos no mercado nacional que mostram a força dos híbridos. O caso da chinesa BYD é exemplar. Com exceção do Dolphin Mini, compacto totalmente elétrico que tem o menor custo de seu portfólio, os modelos mais procurados da montadora são justamente os híbridos, como os SUVs Song Plus e Song Pro e o sedã King. O híbrido mais vendido do país é outro chinês, o Haval H6, da GWM. A japonesa Toyota, maior fabricante de veículos do mundo, nunca apostou na eletrificação, e seus modelos híbridos, como o Corolla e o Corolla Cross, são cobiçados pelos consumidores.
Não se trata de um fenômeno exclusivamente brasileiro. Até montadoras que haviam anunciado, de forma inequívoca, a migração total para frotas totalmente elétricas, passaram a rever o apelo dos híbridos. A sueca Volvo é uma delas. Até 2030, a empresa espera vender 90% de modelos eletrificados, o que inclui unidades com motores a combustão associados a outros, elétricos. A alemã Porsche também repensou sua estratégia e oferecerá uma gama maior de opções de motorização de seus esportivos.
As vantagens desse modelo são claras, sobretudo porque a infraestrutura de carregamento dos veículos elétricos é insuficiente. “A flexibilidade da hibridização une o melhor dos dois mundos, a eficiência dos motores elétricos, com alto torque de partida, e o uso dos combustíveis renováveis dos motores a combustão interna, de baixas emissões”, diz o pesquisador Luiz Augusto Horta Nogueira, professor de sistemas energéticos na Universidade Federal de Itajubá (Unifei).
As companhias brasileiras estão em posição de destaque para assumir a liderança, dada a capacidade de produção de etanol. “Países como o Brasil, a Índia e algumas nações africanas, capazes de explorar a agricultura e os biocombustíveis, têm a vantagem de ser neutros em emissão de CO2 de uma forma mais fácil que outros países, sem a necessidade de abrir mão da eficiência energética”, diz o analista do mercado automotivo Cassio Pagliarini, da Bright Consulting. Nesse processo de transição, os modelos híbridos leves, com sistemas fáceis de instalar e custo reduzido, representam o primeiro passo fundamental. Com o tempo, os híbridos tradicionais e os modelos plug-in, que podem ser conectados a um carregador, tendem a ganhar mais espaço no mercado, à medida que o preço baixar. Hoje, eles ainda estão na faixa dos 200 000 reais, o que limita o apelo em maior escala.
A discussão sobre as vantagens dos híbridos não significa que os elétricos estejam fadados ao fracasso e que a civilização tenha dado definitiva marcha a ré. Não. A Tesla, do faz-tudo Elon Musk (leia na pág. 72), vende modelos muito cobiçados. A inglesa Jaguar está passando por uma renovação completa — e polêmica — atrelada a um futuro totalmente elétrico para a marca. Naturalmente, cada nação se adaptará a suas diferentes realidades. A do Brasil, no momento, parece favorecer os carros híbridos. É caminho sensato.
Publicado em VEJA de 6 de dezembro de 2024, edição nº 2922