O avanço em marcha lenta dos veículos autônomos
Antes considerados o futuro da mobilidade, eles já rodam em algumas cidades, mas vão demorar para se tornar a regra ao redor do mundo

Há alguns anos, a popularização dos carros autônomos era dada como iminente. Algumas das maiores empresas do mundo, tanto do setor de tecnologia quanto do mercado automotivo, tinham criado divisões específicas para testar seus modelos sem motoristas. Esse otimismo se mostrou exagerado. Os carros autônomos operam em algumas cidades do mundo, mas numa escala muito menor do que a originalmente prevista. General Motors, Uber e Apple decidiram abandonar seus projetos, afirmando que seria preciso muito tempo e dinheiro para escalar o negócio. Outras empresas se mantiveram na corrida. É o caso da americana Waymo, da Alphabet, dona da Google, e da chinesa Baidu, que já têm modelos circulando pelas ruas. A Tesla, de Elon Musk, e a Zoox, da Amazon, também estão no páreo. Ou seja, os veículos sem motoristas são uma realidade, mas sua popularização anda em ritmo lento.

O avanço da tecnologia foi freado em decorrência de uma série de incidentes. Em 2024, por exemplo, a Waymo recolheu 600 carros para manutenção depois que um deles atingiu um poste. Em um vídeo que viralizou nas redes sociais, um passageiro ficou preso no carro enquanto o veículo dava voltas em um estacionamento, sem conseguir parar. A Administração Nacional de Segurança Rodoviária dos Estados Unidos investigou 22 acidentes menores envolvendo modelos da Waymo, mas a empresa não foi considerada culpada. De fato, os dados de acidentes indicam que, em certa medida, andar em um táxi-robô é mais perigoso do que em um carro conduzido por seres humanos (veja no quadro). Por outro lado, a maior parte dos incidentes é de menor gravidade e causada principalmente por motoristas impacientes que entram no caminho dos autônomos. Atropelamentos de pedestres são raros. Os poucos que aconteceram desde a entrada em cena dessa frota chamaram atenção, mas indicam ser ocasionais.
Na crença de que será uma questão de tempo caírem por terra as barreiras que emperram o avanço da tecnologia, empresas se mantêm no negócio para largar na frente quando ocorrer o grande salto. Nos Estados Unidos, a Waymo lidera a corrida e já atua em Phoenix, São Francisco, Los Angeles e Austin. Em breve, espera lançar o serviço em outras cidades do Texas, além de Miami, na Flórida, e Atlanta, na Geórgia. Outro mercado relevante é a China. Há dezenove diferentes fabricantes atuando em dezesseis cidades. A Baidu é a mais reputada, com mais de 500 veículos rodando pelas ruas de Wuhan. A Alemanha também tem investido no setor e conta hoje com uma legislação robusta, além da participação de montadoras como a Mercedes.
Algumas das tecnologias dos veículos autônomos já são usadas em veículos comuns, em menor escala. Modelos da americana Tesla e da chinesa GWM, por exemplo, têm sistemas avançados de condução autônoma, mas exigem a presença — e a atenção constante — do motorista. Em um teste acompanhado pela reportagem de VEJA na cidade de Xangai, um veículo da GWM acelerou em ruas e estradas em uma rota pré-programada. O motorista podia mexer no celular enquanto o veículo desviava de obstáculos e fazia os retornos necessários.

O ponto é que a segurança precisa ser infalível quando não há ninguém atrás do volante. Por isso, o processo de introdução do serviço em novas cidades e países é lento. Além das liberações legais, há um longo período de testes, em que os carros são conduzidos pelas ruas por motoristas de carne e osso à exaustão, e correções no aprendizado da máquina são feitas manualmente. O serviço funciona bem em locais com trânsito mais controlado, em velocidades menores e condições climáticas ideais, sem neve, por exemplo. Até funcionariam no Brasil, mas o tráfego caótico tornaria o progresso ainda mais lento. O próximo passo é avançar a tecnologia também no transporte de cargas. Scania e Volkswagen têm projetos do tipo, mas as altas velocidades das rodovias exigem cuidado ainda maior, já que acidentes nesse ambiente podem ser devastadores. O futuro sem motorista vai acontecer, mas será em ritmo de marcha lenta.
Publicado em VEJA de 23 de maio de 2025, edição nº 2945