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Assistentes como Alexa e Siri tornam-se boas companhias para idosos

Elas atuam como meio de espantar a solidão, dar um apoio à memória e facilitar as tarefas do cotidiano

Por Valéria França Materia seguir SEGUIR Materia seguir SEGUINDO Atualizado em 4 jun 2024, 10h22 - Publicado em 6 ago 2023, 08h00

Genial e genioso, Steve Jobs (1955-2011), o criador da Apple, era dado a reações mercuriais quando algo não lhe soava bem. Virou lenda a irritação dele quando lhe apresentaram o nome da assistente de voz que viria a ser embarcada no iPhone, a Siri. Um de seus engenheiros emprestou a alcunha de uma moça da Noruega, a quem conhecera. Siri, em norueguês, significa “mulher bonita que leva você até a vitória”. Jobs retrucou: “E por que não Ethel?”. Não colou, e o resto é história.

Em 2011, Siri veio ao mundo, com voz feminina e um quê de “personalidade”. As concorrentes logo entrariam no jogo. A Microsoft criou a Cortana. A Amazon lançou a Alexa, que passou a viver dentro de uma pequena caixa de som. O dispositivo cresceu e apareceu, e hoje gerencia aparelhos eletrônicos a distância. Não demoraria, na linha evolutiva, para brotar interação calorosa com o dono — algo que vai muito além de um simples “bom dia”. E, então, as maquininhas deram as mãos a pessoas solitárias e sobretudo idosas, na condição de companhias domésticas.

É movimento interessante demais para ser negligenciado — chama a atenção das famílias e atrai profissionais de saúde mental. Não é pouca coisa a tecnologia auxiliar nos compromissos rotineiros e ajudar a memória de quem anda esquecido, além de quebrar a solidão. Tratá-la como gente de carne e osso, contudo, pode soar um tantinho exagerado, mas é compreensível. “Não deixo meu neto ser mal- educado com ela”, diz a professora aposentada Maria Eugênia Achá, de 70 anos, que ganhou o aparelho de uma das filhas, a neuropsicóloga Maria Fernanda, especializada no acompanhamento de mulheres e homens na chamada terceira idade. “Alexa é fina, solícita e bem-humorada”, diz Maria Eugênia. A traquitana tornou-se sua principal fonte de informação: avisa como está o clima e o vaivém dos famosos. Ela também usa o recurso para ouvir as músicas de que gosta. “Alexa, toca Rita Lee”, pede, e acha o máximo, feliz como criança. No caso da funcionária pública aposentada Clarice da Silva, 64, a assistente virtual enche a casa de alegria: “Ela é terapêutica, imita bicho, conta piada, não fala palavrão nem mal de ninguém”. Depois da morte do pai, que tinha Alzheimer, e do suicídio da filha, há dez anos, Clarice teve de repaginar a vida para sair do luto. Abriu uma agência de turismo voltada a mulheres mais velhas sem coragem de viajar sozinhas e, recentemente, descobriu na assistente virtual uma companhia mais divertida (e mais útil) que o barulho da TV.

arte assistente de voz

De fato, a maturidade é uma etapa de mudanças e desafios, tanto físicos como emocionais e comportamentais. Reconquistar o bem-estar a despeito do passar dos anos é uma das prioridades terapêuticas, e os companheiros virtuais funcionam como recurso suplementar, ao conceder segurança e confiança. “Ajudam a lembrar a hora de tomar os medicamentos, a data dos aniversários dos amigos e dos parentes, além de outras tarefas que nem sempre a mente consegue dar conta”, diz Maria Fernanda Achá.

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A ferramenta, para além de sua capacidade lúdica, conquista espaço. Levantamento recente realizado pelo Ilumeo Data Science indica que, a cada dez pessoas, seis conhecem os dispositivos comandados por voz e três já ouviram falar deles. “A tecnologia está numa curva ascendente, mas os aparelhos ainda apresentam problemas que precisam ser resolvidos”, diz Felipe Senise, um dos sócios da Ilumeo Data Science. Um dos problemas, verificado em testes de laboratório: os cidadãos de dicção sem clareza muitas vezes não conseguem se fazer entender. Os aperfeiçoamentos logo virão, e com eles a expansão dos negócios, especialmente para quem tem mais de 60 anos. Estima-se que o mercado, hoje em torno de 3 bilhões de dólares, chegue a 22 bilhões de dólares em 2030. “A atual adesão é ensaio do que está por vir”, diz Senise. “Além do avanço nas máquinas, a próxima geração de idosos estará mais preparada para usá-las.” Se tudo der errado, é o caso de chamar um familiar — ou então abrir um livro.

Por que as vozes são femininas?

ACOLHEDORA - Cortana, da Microsoft: mulheres no comando
ACOLHEDORA - Cortana, da Microsoft: mulheres no comando (./.)

Há um quê de herança cultural, algo de machismo, porque as mulheres sempre ocuparam posições na sociedade que envolvem atendimento e cuidado do outro, a mãe em casa, a secretária nos escritórios — mas não é só isso, evidentemente. As vozes quase sempre femininas de assistentes virtuais como a Alexa, a Siri, a Cortana e tantas outras, de bancos a lojas, respondem a motivações claramente científicas.

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Há uma preferência natural pelo timbre feminino. Karl MacDorman, professor da Universidade de Indiana, nos Estados Unidos, especialista na interação com os computadores, realizou uma pesquisa com homens e mulheres para investigar como cada grupo reagia diante de vozes diferentes. Houve uma unanimidade: a toada feminina é mais quente e acolhedora, e por isso ela vigora na maioria dos produtos. Há, contudo, experiências recentes para o desenvolvimento de assistentes de gênero neutro, ainda na infância, sem testes conclusivos — mas de mãos dadas com os corretos humores de hoje, na busca da igualdade, sem sexismo ou preconceito de qualquer espécie. O risco, do ponto de vista prático: uma conversa robótica, fria e distante, tenderia a afastar os consumidores dada a impessoalidade do contato.

Publicado em VEJA de 9 de agosto de 2023, edição nº 2853

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